Socialistas
e Capitalistas foram ao espaço...
Por
Alessandra Leles Rocha
Que triste! Em meio ao caos,
alguns brasileiros resolveram abusar da verborragia e reafirmar a sua ignorância.
Ainda que não tenham frequentado adequadamente a escola e construído um lastro razoável
de conhecimento, alguma coisa esses indivíduos aprenderam. Por isso, a opção
por se enveredarem pela estupidez absurda, me parece estar mais relacionada a
algum interesse particular de sobrevivência grupal.
Vejamos, então, recapitulando as
aulas de história, o que é necessário saber para estancar e desconstruir as
bobagens. A tal doutrina econômica e política que preconiza uma organização socioeconômica
baseada na propriedade coletiva dos meios de produção, denominada Comunismo,
nunca foi de fato empregada por nenhuma nação no mundo; exceto, dentro da dinâmica
cotidiana de tribos indígenas, as quais não se debruçaram sobre esses
conhecimentos para se organizarem. Lá, nessas tribos, o modo de convivência e coexistência
nesses moldes era algo genuíno e instintivo de sua própria cultura.
Mas, eis que dessa doutrina
emergiu uma outra, o Socialismo, a qual preconizava, além da coletivização dos
meios de produção e distribuição, a supressão da propriedade privada e das
classes sociais. Cujos expoentes de sua
formulação foram os teóricos Karl Marx, nascido na Prússia, e Friedrich Engels,
nascido na Alemanha. Juntos, eles formularam o chamado Socialismo Científico ou
Marxismo, que se difundiu por vários países do mundo.
Acontece que, ao final da Segunda
Guerra Mundial, ainda sob os escombros morais e humanos que aguardavam pelo
processo de reconstrução e reorganização do planeta, no campo geopolítico de duas
nações iniciou-se um movimento de neocolonialismo, a chamada Guerra Fria. De modo
que essa conjuntura configurou uma bipolaridade no mundo, ou seja, Socialistas
e Capitalistas, liderados respectivamente pela União das Repúblicas Socialistas
Soviéticas (URSS) e os Estados Unidos da América (EUA).
O que significou uma defesa
fragorosa dos possíveis benefícios de se aliarem a um lado em contrapartida aos
imensos prejuízos de se aliarem ao outro. E nenhuma das grandes potências fez
por menos a sua campanha de expansão imperialista. Apostaram as fichas na
corrida espacial, no desenvolvimento científico e tecnológico, nas ameaças atômicas,
enfim... e dentro dessa perspectiva foram arrebanhando seu contingente de apoio
rumo à supremacia do mundo.
E por aqui, na Terra Brasilis, não preciso nem dizer de
que lado o país ficou. O medo de que “comunistas
comessem nossas criancinhas”, o mais célebre e absurdo mito antissocialista,
fez com que a população rapidamente se rendesse aos apelos do “American way of life” exibido nas telas
dos cinemas, criações de Hollywood. Todos queriam TV, geladeira, máquina de
lavar, comida solúvel, aspirador de pó, e tantas outras novidades apresentadas
nos filmes e nas revistas vindas dos EUA, como a Life Magazine; mas, rejeitavam completamente a ideia de ter sua propriedade
privada confiscada pelo governo, racionamento de alimentos, uso de vestimentas
iguais para todos, como acontecia na URSS e na China.
Ok. Embora não tenha sido uma escolha
espontânea; mas, muito bem induzida e formulada pelos norte-americanos, desde
os anos 50, o Brasil manteve seu inconsciente coletivo administrado pelas
sombras da chamada Guerra Fria. No entanto, o tempo passou! Muita água correu
debaixo dessa ponte. Mas, nós permanecemos olhando pelo retrovisor da história,
padecendo de um saudosismo incurável.
Em 1986, pelos esforços do,
então, presidente da URSS, Mikhail Gorbachev, deu-se início à Perestroika, uma política de
reconstrução e abertura econômica, e à Glasnost,
uma política de democratização e liberdade nos meios de informação. O que influenciou
diretamente na fragmentação da URSS, em vários países autônomos e soberanos,
que apesar de conflitos graves de ordem religiosa na região, não impediram o
fluxo de aproximação dos socialistas com o restante do mundo.
Algo que também foi possível
perceber na China, com a abertura econômica introduzida pelo partido Comunista
Chinês, que está no poder há 70 anos, junto ao capital estrangeiro. Com uma
ampla visão de futuro, os chineses entenderam a necessidade de serem
competitivos e aproveitaram as oportunidades oriundas do supercrescimento dos “Tigres
Asiáticos” (Hong Kong. Singapura, Coreia do Sul e Taiwan), seus vizinhos geográficos,
para implementarem inúmeras privatizações e seu plano de desenvolvimento econômico
a partir da fundação das Zonas Econômicas Especiais (ZEE’s) – Agricultura,
Indústrias de Base, Industrias Bélicas, Tecnologia e Ciências - na faixa litorânea
do leste.
De modo que a Guerra Fria esfriou
como tinha que ser. Afinal, lideranças com tanta sede de poder não poderiam mesmo,
se dar ao luxo de ficarem presas a saudosismos tacanhos. Sem contar que o mundo,
tanto na perspectiva capitalista quanto socialista, descobriu-se igual. Seres humanos
padecendo das mesmas mazelas, das mesmas desigualdades, dos mesmos infortúnios.
As divisões sociais nunca deixaram de existir. O topo da cadeia social continua
crendo com toda a força de que tem direitos suficientes para permitir a
exploração da base.
Socialistas e Capitalistas foram ao
espaço. Viram a Lua. Descobriram que a Terra era azul. Mas, não como fazê-la um
lugar melhor para todos. De perto continuaram a apoiar violências,
desumanidades, guerras. Jogando segundo seus interesses mais imediatos. Mas,
felizmente, folgamos em saber, que criancinhas jamais foram servidas na ceia de
ninguém, nem de nenhum “socialista”.
Brincadeiras à parte, falando bem
sério, muito cuidado com esse comportamento “manada”,
que segue inadvertida e irrefletidamente aos outros. Na vida devemos sempre ser
o pior entre os melhores; mas, jamais o melhor entre os piores. A primeira
impressão pode não ser decisiva; mas, pode exercer uma influência imensa na continuidade
das relações humanas. E o que falamos tem sim, um peso gigantesco na nossa inserção
social. Já dizia José Saramago, “a
palavra deixou de ter conteúdo e de ter qualquer coisa dentro, é pronunciada
com uma leviandade total”.
Se tudo isso acontece é porque um
mal maior que a verborragia tomou de assalto as almas humanas; a inconsciência.
Sem constrangimento. Sem amor próprio. Sem dignidade. Sem vergonha. É sinal de
que o intelecto e a cognição se esfacelaram pela falta de uso. De tanto
abdicarem do pensamento, da reflexão, da argumentação, as pessoas se
confortaram na outorga do seu maior privilégio a terceiros, ou seja, o
raciocínio. E por consequência abdicaram, também, das emoções, dos sentimentos.
De modo que isso, talvez, explique como a desumanidade, a crueldade, a perversidade
e a ignorância venham circulando tão altivas entre nós.
Não é procurando “bodes expiatórios” nos baús da ignorância
histórica que vamos resolver alguma coisa. O mundo com seus erros e acertos é
fruto de sua gente. Entendo que seja difícil admitir o abismo que nos distancia
da perfeição; mas, não admitir só amplia a distância. “O maior pecado contra a mente humana é acreditar em coisas sem evidências.
A ciência é somente o suprassumo do bom senso – isto é, rigidamente precisa em
sua observação e inimiga da lógica falaciosa” (Aldous Huxley). Assim, não
se esqueça, “podemos tirar o nariz de
palhaço e construir algo real com nossas escolhas” (Lya Luft).