E
a Cúpula do Clima, hein?!
Por
Alessandra Leles Rocha
Sei que este é só o 4º mês de
2021; mas, arrisco sim, a pensar que a palavra deste ano para o Brasil será
CAOS. Observando com bastante atenção o fluxo do cotidiano, ela parece
preencher, com perfeição, os requisitos para descrever os descaminhos do país.
Está clara a possibilidade de o caos ser o princípio norteador de um
planejamento, na medida em que ele garanta os resultados para os objetivos
delineados.
Às vésperas da Cúpula do Clima, a
ser realizada nos EUA, o Brasil está tão desconectado da realidade ambiental do
mundo contemporâneo, que sua presença faria mais sentido se estivesse
desembarcando na Europa, nos áureos tempos do Colonialismo, quando os modelos
de exploração dos recursos naturais faziam as grandes Metrópoles estremecerem
de felicidade.
Infelizmente, o que o Brasil diz
não se escreve. Todos já deveriam, pelo menos, saber disso. Porque são décadas
de acordos e tratados relacionados as questões socioambientais que não são
cumpridos. Não passam de promessas estatísticas vãs, em relação a redução das
áreas de desflorestamento, das queimadas, da mineração ilegal em terras
indígenas, etc.etc.etc.
Lançar sobre os documentos
milhares de metas é muito fácil. Mas, quando se olha para o arcabouço de
legislações, normatizações e planos de manejo sustentável, os quais deveriam
ser desenvolvidos especificamente para as demandas de cada um dos biomas
nacionais, a realidade é outra. O próprio sistema institucional de gestão do meio
ambiente e dos recursos naturais renováveis e não renováveis foi desestruturado
e desconfigurado, a partir de 2019, incluindo uma redução drástica de recursos
financeiros para o setor.
Portanto, não precisa ser nenhum
gênio do ambientalismo para constatar que as metas e promessas que o Brasil
discursa não podem ser alcançadas, diante da insuficiência logística e
fragilidade jurídica em que operam os responsáveis. Tudo não passa de uma falsa
aparência de engajamento com as questões ambientais, com vistas a conseguir
fundos internacionais.
Afinal, há uma corrente no país,
que defende fragorosamente a exploração dos recursos naturais como solução para
alavancar a economia nacional, em detrimento de todos os estudos e apontamentos
das ciências relacionadas ao Meio Ambiente em todo o mundo. De modo que as
pressões de ordem econômica tentam suplantar, de todas as maneiras, as demandas
socioambientais.
E não é dizer que os impactos
negativos disso já não estejam sendo sentidos, porque estão. As áreas de
mineração ilegais, por exemplo, têm feito milhares de vítimas do mercúrio
despejado nos rios da Bacia Amazônica. O desmatamento e as queimadas têm
afetado o regime pluviométrico em todo o país e, por consequência, as
expectativas do agronegócio nacional, o qual resiste como elemento de destaque
para a balança comercial favorável.
Sem contar que o uso e a ocupação
dos biomas têm promovido não só o deslocamento de espécies animais para os
centros urbanos, como, também, favorecido a ampla disseminação de doenças
infectocontagiosas, tais como a Malária, a Doença de Chagas, a Febre Amarela e
a Leishmaniose Visceral e Tegumentar, entre a população urbanizada. Muitas
dessas doenças são transmitidas pelos chamados “arbovírus”, ou seja, vírus
transmitidos por hospedeiros vertebrados a partir da picada de vetores
artrópodes (mosquitos, moscas, carrapatos, pulgas, triatomíneos).
Torna-se visível, então, como
essa visão arcaica de exploração ambiental reflete de maneira significativa na
dinâmica da saúde nacional. Seja pelo favorecimento ao adoecimento involuntário
da população; sobretudo, as parcelas mais vulneráveis, que não dispõem de
conhecimento suficiente para compreender os efeitos do desequilíbrio ambiental
e para saber como se protegerem deles, mitigando seus efeitos, quando possível.
Seja pela ampliação indiscriminada das demandas pelos serviços de saúde, não
somente de atenção básica; mas, também, de média e alta complexidade,
dependendo do grau de acometimento das doenças. Seja pela junção dos impactos
dessas patologias com a própria fragilidade e carência de infraestrutura de
saneamento básico no país, que tanto expande a vulnerabilização social.
Carl Edward Sagan, um grande
divulgador científico e ativista norte-americano, faleceu em 1996; mas, ele já
lançava a seguinte pergunta: “A nossa
geração tem que escolher o que ela valoriza mais: lucros de curto prazo ou
habitabilidade de longo prazo no nosso lar planetário? ”. Bem, em nome do
TER o Brasil omite e inivisibiliza ao SER; isso significa que não há pretensões
concretas do país em operar as ações ambientais no caminho do desenvolvimento
sustentável.
E nem se trata, de uma
compreensão restrita a gestão dos biomas. Basta olhar para as cidades e centros
urbanos para perceber o quão distantes suas gestões estão da inclusão, da
segurança e da sustentabilidade, propriamente ditas. A insalubridade ambiental
está materializada por resíduos descartados por todos os lados, pelo
desperdício de alimentos, pela presença maciça de insetos e roedores ... Não há
padrões de consumo e produção sustentáveis. Não há controle na emissão de gases
tóxicos e poluentes, na formação das ilhas de calor, na eliminação e/ou restrição
das áreas arborizadas, ...
Sendo assim, se nada for feito na
contramão dessa desordem institucionalizada, a qual cada vez encontra mais
caminhos para sustentar a sua “legitimidade legalizada”, o caos nos fará
vítimas indefesas nas tramas das suas teias. Não nos esqueçamos do que bem
escreveu o antropólogo francês Gustave Le Bon, em 1911, “a humanidade só saiu da barbárie mental primitiva quando se evadiu
do caos das suas velhas lendas e não temeu mais o poder dos taumaturgos, dos
oráculos e dos feiticeiros. Os ocultistas de todos os séculos não descobriram
nenhuma verdade ignorada, ao passo que os métodos científicos fizeram surgir do
nada um mundo de maravilhas. Abandonemos às imaginações mórbidas essa legião de
larvas, de espíritos, de fantasmas e de filhos da noite – e que, no futuro, uma
luz suficiente os dissipe para sempre”. Porque atentar contra a natureza é
atentar contra si mesmo. Simples assim.