quinta-feira, 15 de abril de 2021

E a Cúpula do Clima, hein?!


E a Cúpula do Clima, hein?!

 

 

Por Alessandra Leles Rocha

 

 

Sei que este é só o 4º mês de 2021; mas, arrisco sim, a pensar que a palavra deste ano para o Brasil será CAOS. Observando com bastante atenção o fluxo do cotidiano, ela parece preencher, com perfeição, os requisitos para descrever os descaminhos do país. Está clara a possibilidade de o caos ser o princípio norteador de um planejamento, na medida em que ele garanta os resultados para os objetivos delineados.

Às vésperas da Cúpula do Clima, a ser realizada nos EUA, o Brasil está tão desconectado da realidade ambiental do mundo contemporâneo, que sua presença faria mais sentido se estivesse desembarcando na Europa, nos áureos tempos do Colonialismo, quando os modelos de exploração dos recursos naturais faziam as grandes Metrópoles estremecerem de felicidade.  

Infelizmente, o que o Brasil diz não se escreve. Todos já deveriam, pelo menos, saber disso. Porque são décadas de acordos e tratados relacionados as questões socioambientais que não são cumpridos. Não passam de promessas estatísticas vãs, em relação a redução das áreas de desflorestamento, das queimadas, da mineração ilegal em terras indígenas, etc.etc.etc.

Lançar sobre os documentos milhares de metas é muito fácil. Mas, quando se olha para o arcabouço de legislações, normatizações e planos de manejo sustentável, os quais deveriam ser desenvolvidos especificamente para as demandas de cada um dos biomas nacionais, a realidade é outra. O próprio sistema institucional de gestão do meio ambiente e dos recursos naturais renováveis e não renováveis foi desestruturado e desconfigurado, a partir de 2019, incluindo uma redução drástica de recursos financeiros para o setor.

Portanto, não precisa ser nenhum gênio do ambientalismo para constatar que as metas e promessas que o Brasil discursa não podem ser alcançadas, diante da insuficiência logística e fragilidade jurídica em que operam os responsáveis. Tudo não passa de uma falsa aparência de engajamento com as questões ambientais, com vistas a conseguir fundos internacionais.

Afinal, há uma corrente no país, que defende fragorosamente a exploração dos recursos naturais como solução para alavancar a economia nacional, em detrimento de todos os estudos e apontamentos das ciências relacionadas ao Meio Ambiente em todo o mundo. De modo que as pressões de ordem econômica tentam suplantar, de todas as maneiras, as demandas socioambientais.

E não é dizer que os impactos negativos disso já não estejam sendo sentidos, porque estão. As áreas de mineração ilegais, por exemplo, têm feito milhares de vítimas do mercúrio despejado nos rios da Bacia Amazônica. O desmatamento e as queimadas têm afetado o regime pluviométrico em todo o país e, por consequência, as expectativas do agronegócio nacional, o qual resiste como elemento de destaque para a balança comercial favorável.

Sem contar que o uso e a ocupação dos biomas têm promovido não só o deslocamento de espécies animais para os centros urbanos, como, também, favorecido a ampla disseminação de doenças infectocontagiosas, tais como a Malária, a Doença de Chagas, a Febre Amarela e a Leishmaniose Visceral e Tegumentar, entre a população urbanizada. Muitas dessas doenças são transmitidas pelos chamados “arbovírus”, ou seja, vírus transmitidos por hospedeiros vertebrados a partir da picada de vetores artrópodes (mosquitos, moscas, carrapatos, pulgas, triatomíneos). 

Torna-se visível, então, como essa visão arcaica de exploração ambiental reflete de maneira significativa na dinâmica da saúde nacional. Seja pelo favorecimento ao adoecimento involuntário da população; sobretudo, as parcelas mais vulneráveis, que não dispõem de conhecimento suficiente para compreender os efeitos do desequilíbrio ambiental e para saber como se protegerem deles, mitigando seus efeitos, quando possível. Seja pela ampliação indiscriminada das demandas pelos serviços de saúde, não somente de atenção básica; mas, também, de média e alta complexidade, dependendo do grau de acometimento das doenças. Seja pela junção dos impactos dessas patologias com a própria fragilidade e carência de infraestrutura de saneamento básico no país, que tanto expande a vulnerabilização social.

Carl Edward Sagan, um grande divulgador científico e ativista norte-americano, faleceu em 1996; mas, ele já lançava a seguinte pergunta: “A nossa geração tem que escolher o que ela valoriza mais: lucros de curto prazo ou habitabilidade de longo prazo no nosso lar planetário? ”. Bem, em nome do TER o Brasil omite e inivisibiliza ao SER; isso significa que não há pretensões concretas do país em operar as ações ambientais no caminho do desenvolvimento sustentável.

E nem se trata, de uma compreensão restrita a gestão dos biomas. Basta olhar para as cidades e centros urbanos para perceber o quão distantes suas gestões estão da inclusão, da segurança e da sustentabilidade, propriamente ditas. A insalubridade ambiental está materializada por resíduos descartados por todos os lados, pelo desperdício de alimentos, pela presença maciça de insetos e roedores ... Não há padrões de consumo e produção sustentáveis. Não há controle na emissão de gases tóxicos e poluentes, na formação das ilhas de calor, na eliminação e/ou restrição das áreas arborizadas, ...

Sendo assim, se nada for feito na contramão dessa desordem institucionalizada, a qual cada vez encontra mais caminhos para sustentar a sua “legitimidade legalizada”, o caos nos fará vítimas indefesas nas tramas das suas teias. Não nos esqueçamos do que bem escreveu o antropólogo francês Gustave Le Bon, em 1911, “a humanidade só saiu da barbárie mental primitiva quando se evadiu do caos das suas velhas lendas e não temeu mais o poder dos taumaturgos, dos oráculos e dos feiticeiros. Os ocultistas de todos os séculos não descobriram nenhuma verdade ignorada, ao passo que os métodos científicos fizeram surgir do nada um mundo de maravilhas. Abandonemos às imaginações mórbidas essa legião de larvas, de espíritos, de fantasmas e de filhos da noite – e que, no futuro, uma luz suficiente os dissipe para sempre”. Porque atentar contra a natureza é atentar contra si mesmo. Simples assim.