Qual
o preço da aposta?
Por
Alessandra Leles Rocha
Em um primeiro momento ninguém
sabia lidar com o Sars-COV-2. Era o inesperado batendo à porta. Mas, à medida
em que o tempo foi passando, entre erros e acertos, o caminho foi se abrindo e
confirmando respostas importantes. Depois de muita dor e sofrimento, os bons
exemplos começaram a emergir e ganhar efeito multiplicador pelo mundo. Afinal,
a Pandemia não é só minha, nem sua, ela é do planeta!
Pena, que nem todas as pessoas
pensam assim. A vida, a saúde, o bem-estar da população deveria ser prioridade
em quaisquer circunstâncias; mas, especialmente, durante uma pandemia. Mas, não
foi. Pelo menos, centrando foco no Brasil, não foi assim que as coisas se
procederam. A cegueira, como aquela pensada por José Saramago 1, não permitiu que a luz dos bons
exemplos alcançasse a Terra Brasilis.
E usando de artifícios torpes e
deprimentes desviaram o foco das práticas seguras e consagradas até o momento,
deixando a população à mercê da própria sorte. Fizeram uma “roleta-russa” da
vida de mais de 212 milhões de habitantes, porque a resposta a infecção por
esse vírus é uma incógnita em cada organismo. Pode não causar nada. Pode causar
efeitos leves. Pode causar efeitos moderados. Pode causar efeitos graves ou gravíssimos.
Pode matar. Pode sequelar. Quando e com quem se confirmam esses prognósticos, são
perguntas sem resposta.
Mesmo assim, fazem pouco. Há um ano que um planejamento estratégico é
aguardado. No qual, deveriam estar, também, as diretrizes do plano de
vacinação. Mas... A expectativa de que a Pandemia desaparecesse do mapa do
mesmo jeito que apareceu foi a grande aposta. E o país perdeu por excesso de
confiança. Confiou sem olhar para o mundo. Sem olhar para a Ciência. Sem olhar
para os fatos em plena ebulição diante de seus olhos.
Quase 280 mil mortos, pelos dados
divulgados hoje. Mas, diante da realidade processual da COVID-19 no país,
certamente, esse número está subestimado. Já se sabe que muitas pessoas não tiveram
acesso aos serviços de saúde e vieram a óbito em suas casas. Muitas certidões
foram emitidas sem a comprovação técnica da doença, dada a baixa testagem
populacional, ocasionando um viés diagnóstico. Enfim, questões que o tempo e a
história se ocuparão de organizar de alguma maneira.
Pior do que isso, é perceber como
toda a Pandemia tem sido subestimada no Brasil. E essa é a razão pela qual o
país não consegue exibir nenhum indicador de melhora. No entanto, essa
incapacidade resolutiva não causa impactos negativos somente dentro dos seus limites
territoriais; mas, já sinaliza uma ameaça global, conforme preocupação da
própria Organização Mundial da Saúde (OMS), em face da ausência de diretrizes responsáveis
em relação à Pandemia.
Ora, a presença de um vírus e
suas variantes altamente transmissíveis circulando pelo mundo pede uma união de
esforços coletivos simultâneos para debelar a guerra biológica instituída. Não basta
cada nação agir por conta própria, fundamentada apenas por suas crenças e
valores. A gravidade e a urgência da
situação exigem um alinhamento científico para os melhores aproveitamentos dos
recursos imunobiológicos e tecnológicos disponíveis.
E passado um ano, o Brasil ainda
insiste em se manter na contramão do óbvio. Aliás, obstaculizando de todas as
maneiras os esforços dialógicos e diplomáticos; bem como, ostentando a sua mais
plena animosidade contra os discursos empenhados pelos mais qualificados corpos
científicos mundiais. Além de não seguir as recomendações preventivas,
pactuadas como consenso ao redor do planeta, o Brasil ridiculariza, minimiza,
debocha, desqualifica todas elas, como se estivesse em posição de total
superioridade para fazê-lo.
De modo que no quadro comparativo
da história que se escreve todos os dias, o Brasil só faz repetir a incongruência
entre discursos e ações. Destoando cada vez mais daqueles que não se furtaram a
acompanhar o fluxo das práticas de prevenção, descobertas a duras penas, nesse
momento tão crítico da saga humana sobre o planeta. O que resulta no
aprofundamento de uma postura marginal ao contrário de protagonista.
Uma escolha estranha? Sim. Mas,
bem mais do que isso. Digamos, perigosa. Porque a saúde é um dos pontos de
esteio de qualquer sociedade. Pessoas insalubres, doentes, não produzem, não
consomem, não trabalham, não movem as engrenagens do desenvolvimento e, nem
tampouco, do progresso. De modo que as expectativas em relação a prosperidade e
a riqueza, simplesmente, minguam.
É hora de parar de dobrar a
aposta. O Brasil já perdeu demais nesse jogo de extremo azar. A impaciência não
vem só da população que assiste de perto ao morticínio, a desassistência instituída.
Vem de longe. Vem de quem o país precisa. E eles não se contentam com
palavrórios ou promessas vãs. Quem se senta nas grandes mesas de negociação
quer narrativas sérias, responsáveis, consistentes. Por isso, cada minuto a
mais de desatenção pode ser decisivo, pode quebrar a banca de maneira
definitiva.