sábado, 6 de março de 2021

LOCKDOWN...


LOCKDOWN...

 

 

Por Alessandra Leles Rocha

 

 

Para quem ainda não entendeu, os vírus são “parasitas” intracelulares obrigatórios. O que significa que essas partículas infectantes, medindo cerca de 1µm (micrómetro) ou 0,001 milímetro, visíveis apenas com o auxílio de avançados microscópios eletrônicos, dependem de células vivas para se reproduzir e sobreviver no ambiente.

E, embora sua estrutura seja relativamente simples, em linhas gerais um invólucro proteico que protege o ácido desoxirribonucleico (DNA) ou ácido ribonucleico (RNA) dependendo do tipo, que são as informações sobre quem é o vírus.

No entanto, são as proteínas presentes na sua cápsula que lhes conferem as estratégias de adesão, fixação e transporte desse respectivo ácido nucleico para o interior da célula de um ser vivo. Está nas mãos delas, então, a capacidade de mutação para garantir a existência de variantes cada vez mais capazes de resistir e se adaptar aos desafios impostos por seus hospedeiros.

Dito isso, não é difícil perceber que os vírus fazem parte do mundo em que vivemos. Aqui, ali ou acolá há milhares deles à espreita para infectar animais ou plantas. E se serão bem-sucedidos, vai depender muito da capacidade preventiva exercida pela humanidade. O que não é tarefa simples, dada a sua invisibilidade. Vírus não reconhecem limites, fronteiras, ou nenhuma outra noção geográfica. São os seres vivos que os transportam de um lado para outro sem se dar conta, sem perceber a dimensão dos riscos.

Por isso a ausência de um discurso coeso e uníssono nessa Pandemia, contribuiu significativamente para a situação caótica que vive o Brasil. Essa não é uma conjuntura em que caibam ações distintas ocorrendo simultaneamente. Vetores na mesma direção, mas em sentidos opostos se anulam. E é exatamente isso o que está acontecendo com as inúmeras e atabalhoadas medidas de restrição e isolamento que vêm sendo propostas desde o ano passado.

Essa é uma realidade de “tudo ou nada” para o que se entende como “LOCKDOWN”, segundo tem mostrado a experiência de vários países, especialmente os do Reino Unido. Quaisquer prerrogativas que são concedidas para a ampla e irrestrita circulação viral, significam abrir precedentes para que o vírus promova suas mutações e se adapte cada vez mais de maneira eficiente. Observe que ele não está de brincadeira pelo número de variantes já encontradas em 1 ano de Pandemia.

O ponto de reflexão nessa história toda é que nem mesmo se houvessem vacinas em dose suficiente para imunizar toda a população brasileira, o problema não estaria resolvido. Primeiro, porque o objetivo desses imunobiológicos produzidos tem sido evitar o colapso das unidades de saúde, especialmente Unidades de Tratamento Intensivo (UTIs), com pacientes em estado crítico e potencialmente fatal. Portanto, o objetivo das vacinas disponíveis não é impedir a contaminação pelo vírus; mas, atenuar os efeitos dessa infecção.

Segundo, porque as variantes virais circulantes já demonstram capacidade tanto de reinfecção quanto de coinfecção; então, os cientistas já estudam a possibilidade de que a imunização perca em parte a sua eficiência nesses casos, dependendo das características dos vírus em questão.

Aliás, é bom não perder de vista que o Sars-COV-2 trabalha em uma velocidade muito mais intensa do que podem os pesquisadores ao redor do mundo. Muitas perguntas não foram ainda plenamente elucidadas, enquanto outras surgem a cada hora. Todo novo vírus que aparece no planeta é como um quebra-cabeças de milhões de peças misturado em uma caixa com outros quebra-cabeças. Até encontrar a peça que se encaixa perfeitamente... é uma corrida contra o tempo.

Só que as pessoas querem se apegar ao retorno de uma vida, de uma normalidade, que não existe mais. De modo que para aplacar essa angustia, deveriam perguntar aos remanescentes dos países arrasados durante a Segunda Guerra Mundial o que foi renascer das cinzas, reconstruir material e subjetivamente uma nação, para terem a dimensão exata do que isso significa.

A Pandemia é uma guerra sem armas físicas – bombas, granadas, metralhadoras, fuzis; mas, de um inimigo biológico altamente estratégico e implacável para fazer estragos humanos tão poderosos quanto. E toda vez que isso acontece a população não permanece a mesma.

Em um país em guerra o cotidiano para, a economia se submete aos tempos de desafio. Produção e consumo se voltam para o estritamente necessário. Enfim... Mudam as prioridades. As demandas. Os projetos. O jeito de pensar. De fazer. De resolver. O pós-guerra é sempre um tempo de recomeçar. A partir de um novo traçado. De uma nova perspectiva. De novas expectativas.

A insistência em se apegar em decisões “abrasileiradas” para atender a cada senhor que reivindica seus interesses só nos tem feito aprofundar num abismo ainda maior. Quanto mais os coveiros cavam sepulturas ininterruptamente... mais a economia cai em queda livre rumo a encontrar o fundo do poço. Porque a tomada de decisões permanece enovelada por equívocos e contradições.

E não bastasse tudo isso ser a representação de perdas humanas, o que deveria ser humanitariamente inadmissível; suas entrelinhas apontam para o declínio da população economicamente ativa brasileira. Sim, porque as recentes variantes encontradas no país indicaram uma tendência de equilíbrio entre os óbitos acima e abaixo de 60 anos. Isso quer dizer que estamos sim, perdendo as forças para reconstruir, para recomeçar no Pós-Pandemia.

O país que se gaba de ter 212 milhões de técnicos de futebol espalhados por cada esquina do seu território, agora faz o mesmo em relação à Ciência. Nunca existiram tantos “médicos”, “epidemiologistas”, “imunologistas” e afins se manifestando com argumentos de botequim, ferindo sem quaisquer cerimônias o art. 47, do Decreto-Lei n. º 3.688, de 1941. Como se a vida humana pudesse sobreviver aos excessos dos “achismos” e casuísmos. São mais de 260 mil mortos no Brasil; 116 milhões no mundo. E as cifras só fazem crescer.

Mas, apesar da cara blasé de uns e outros, ainda há esperança, porque o mundo aprendeu com o Titanic que se limitar a prestar atenção só a ponta do iceberg pode ser fatal. Afinal, “fluindo na direção da morte, a vida do homem arrastaria consigo, inevitavelmente, todas as coisas humanas para a ruína e a destruição, se não fosse a faculdade humana de interrompê-las e iniciar algo novo, faculdade inerente à ação como perene advertência de que os homens, embora devam morrer, não nascem para morrer, mas para começar” (Hannah Arendt – A condição humana).