sexta-feira, 22 de janeiro de 2021

E adianta ter pressa?


E adianta ter pressa?

 

 

Por Alessandra Leles Rocha

 

 

Ninguém discorda de que a Pandemia, dada a gravidade e letalidade, emergiu uma corrida desenfreada pelo desenvolvimento de um imunobiológico seguro e eficaz; bem como, outras medicações que pudessem contribuir para a redução dos impactos negativos da doença. Quanto as medicações não houve sucesso nas tentativas testadas. Mas, em relação à vacina, a humanidade logrou êxito. Em quase um ano, mais de um tipo delas atendeu as expectativas da ciência mundial. De modo que, em parte a pressa cumpriu seu papel.

No entanto, a história não termina por aí. A descoberta em si não satisfaz plenamente as demandas emergenciais da atual conjuntura social. Depois das análises de praxe em relação ao processo cientifico de desenvolvimento imunobiológico iniciam-se as etapas de produção em larga escala das doses. Isso porque os investimentos são pautados numa análise de riscos; visto que, não se pode garantir de antemão que as pesquisas alcancem os objetivos propostos. Desse modo, não há como produzir grandes quantidades antecipadamente.

Segundo a Organização das Nações Unidas (ONU), oficialmente existem 193 países no mundo, totalizando cerca de 7bilhões e 800 mil pessoas. Tendo em vista que cada uma delas tem autonomia para planejar suas ações de prevenção e combate as doenças, o processo durante a Pandemia não transcorre dentro de uma linearidade e uniformidade coletiva. Bem como, há de se considerar as discrepâncias socioeconômicas que constituem as desigualdades no mundo e se refletem, também, no campo da saúde pública. Assim, alguns saíram à frente nas tratativas dos acordos comerciais com os produtores das vacinas enquanto outros ficaram para trás.

Acontece que a produção em larga escala não é atingida rapidamente. É um processo contínuo que pode levar meses até poder alcançar a totalidade dos pedidos. O que significa que a heterogeneidade da imunização mundial será uma questão importante a se ter em mente. Enquanto alguns terão imunizado suas populações outros estarão em curso disso; portanto, o vírus permanecerá circulante e transitando entre fronteiras como tem feito até aqui. O que exige uma vigilância e resguardo das medidas de prevenção básicas – isolamento social, higiene periódica das mãos com água e sabão e/ou álcool em gel e uso de máscaras – por um tempo maior ainda não determinado.

Isso evidencia como a pressa em ter de volta à normalidade do cotidiano é relativa. O processo científico é marcado pela ação temporal. Não basta que esse ou aquele queira que seja assim ou assado, segundo suas próprias vontades. Nem todas as etapas podem ser suprimidas sob pena dos resultados não representarem a realidade. E no campo da produção, os rígidos controles de segurança não podem passar despercebidos ou serem, simplesmente, suprimidos sob pena das consequências aos usuários daquele produto.

Até aqui, então, foi dado um primeiro passo; mas, a estrada a ser percorrida ainda é longa. Por isso a pressa por uma resolução plena da Pandemia é inútil. Esse sopro de esperança trazido pelas vacinas faz todo o sentido porque ele vem envolto pela certeza da mitigação dos efeitos mais graves potencializados pelo vírus Sars-Cov-2. Só de reduzir eventualmente o grau de letalidade já é um alento, diante dos mais de 2 milhões de vítimas fatais ao redor do planeta.

Uma canção que eu adoro diz: “Enquanto todo mundo espera a cura do mal / e a loucura finge que isso tudo é normal / eu finjo ter paciência ...” 1; mas, eu discordo desse “fingir”. Porque é preciso mesmo dar a mão à palmatória e admitir que não é hora de pressa; mas, de paciência. O que absolutamente não significa sermos passivos, inativos, indiferentes diante das nossas responsabilidades coletivas; mas, exercitar continuamente uma consciência que vê e compreende a realidade em que estamos vivendo. De modo que ela passe a balizar o nosso foco a partir das possibilidades e das perspectivas que temos nas mãos. Assim, a luz desse equilíbrio físico e mental é que se descortinam, com mais fundamento, as melhores ações. Sem paciência não há esperança.