O
mundo não é cor de rosa
Por
Alessandra Leles Rocha
Só mesmo com muita persistência para
continuar prosseguindo por caminhos tão tortuosos e cercados de espinhos, como
têm feito mulheres ao longo da história humana sobre a Terra. Misoginia e
Sexismo não são pautas recentes; sempre estiveram presentes na sociedade. Justificados
por uma razão ou outra foram conseguindo se firmar no contexto social e garantir
mecanismos para a vigilância e o controle feminino.
E temos ouvido tantas histórias,
tantos relatos da violência e da opressão contra as mulheres. Para cada avanço
do tempo um obstáculo. Pequenos golpes dados em doses homeopáticas a fim de que
sua existência e sua dignidade não alcancem a inteireza que lhes é de direito. Suas
escolhas quase sempre não são genuínas; na medida em que, são marcadas pela
escassez de oportunidades que o mundo controlado pelos homens lhes impõe.
O mundo não é cor de rosa. O ideário
do papel feminino na sociedade, que se arrasta pelos séculos, é o ponto de
partida para entendermos a profundidade que esconde as agruras vividas pelas
mulheres. Antes de pensarmos na divisão por gênero, eles e elas, a sociedade
vem se constituindo pela fragmentação econômica, no modelo piramidal de classes,
ou seja, os mais ricos no topo e os mais pobres na base. Apesar de a base
sustentar o topo, esse é quem controla todos os processos, discursos e
comportamentos. Isso inclui o “mundo cor de rosa”.
Sendo assim, esse ideário no qual
a mulher se ocuparia somente das atribuições relativas ao seu núcleo familiar –
filhos e marido, beirando à perfeição, jamais traduziu a realidade de todas as
mulheres. Esse era o pensamento do topo, cujo controle estava nas mãos do
patriarcado, sustentado pelas filosofias e religiões que atribuíam a esse
conjunto de mulheres um papel secundário, quase decorativo, à sociedade. Esse pensamento
retira delas a identidade natural e lhes devolve uma identidade fundamentada na
dependência do outro, na qual o homem se torna o provedor financeiro, afetivo,
emocional e intelectual.
Quanto ao restante feminino da pirâmide
a realidade sempre foi outra. Embora no seu contexto existisse a influência do
patriarcado, as mulheres da base piramidal antes de tudo eram componentes
fundamentais de uma classe trabalhadora emergente. Amas de leite. Empregadas domésticas.
Passadeiras. Lavadeiras. Cozinheiras. Babás. Tutoras. Enfim, ocupando todos os
trabalhos domésticos pelos quais o topo da pirâmide pagava para não ter que
realizar. No entanto, em razão da inferiorização desse trabalho, os salários
dessas mulheres sempre foram muitas vezes menores do que aqueles pagos aos
homens por funções, também, consideradas inferiores – mensageiros, condutores
de charretes, ferreiros etc.
Portanto, o papel feminino da mulher
na sociedade sempre foi definido pela própria sociedade. Na medida com que a
organização social vai se transformando e estabelecendo novas demandas, os
espaços para inserção delas vão se abrindo. Foi assim durante as Grandes
Guerras Mundiais. Foi assim durante as Crises Econômicas que impuseram grandes
contingentes de desempregados. Foi assim diante da necessidade de profissionais
em novas áreas do conhecimento. Enfim...
O que não significa,
necessariamente, uma ruptura com a vigilância e o controle sobre elas; afinal
de contas, o patriarcado ainda persiste. Talvez, o modo da ação patriarcal é que
tenha passado por transformações, constituindo na realidade contemporânea em uma
mescla entre episódios de violência brutal inominável e discursos
depreciativos, desqualificantes, preconceituosos e vulgares.
A pergunta que não quer calar é
simples, por quê? Não seria mais fácil estabelecer a igualdade e a equidade de gênero
na sociedade? Mas a resposta é a escravidão que sempre existiu. Que está
impregnada na matriz social e revela bem mais do que uma questão racial ou econômica.
O subjugar feminino aos interesses e conveniências patriarcais, também, é um
mecanismo secular de escravidão. Portanto, as pessoas em geral não têm pudor em
exercer a inferiorização, o menosprezo, a indignidade a qualquer um de seus
pares.
É aí que mora o perigo, pois
abriga o silêncio. Enquanto uns silenciam pela comodidade ou por se julgarem
acima e distantes de quaisquer riscos, outros pensam que o silêncio é o abrigo
mais seguro e confortável para sobreviver às hostilidades e crueldades do mundo.
Entretanto, as estatísticas só
fazem provar que não. Ninguém sabe quem
vai ser a bola da vez, mas sabe que essa bola existe. E só por isso já se faz necessário
recobrar a consciência e refletir. Como dizia a estilista francesa Coco Chanel,
“não importa o lugar de onde você vem. O que
importa é quem você é! E quem é você? Você sabe?”.
Isso significa que pensar sobre
quem somos o que e porque queremos isso ou aquilo, é rechaçar quaisquer
tentativas de escravidão. As correntes físicas e morais se rompem quando temos
a dimensão exata de que há sempre mais de uma resposta para uma mesma pergunta.
Por que, então, abdicar do direito de respondê-la e outorgá-lo aos outros? Por que
abrir mão de ser para apenas existir? Medo. Insegurança. ... A verdadeira zona
de conforto é onde nos colocamos, onde permitimos recostar a nossa paz mais
sublime e profunda. Sendo assim, não se esqueça, ainda que o mundo não seja cor
de rosa, ele pode sim, ser mais colorido, mais interessante, ou simplesmente, do
jeito que você sempre quis e imaginou.
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