Palavras...
Por
Alessandra Leles Rocha
Infelizmente
vivemos tempos em que o bom senso anda esquecido e as regras de ouro da boa
educação também. São tempos de uma verborragia incontrolável e de um
desrespeito ao ser humano sem precedentes. Assim, o constrangimento1 anda solto, como se tudo fosse
permitido ou não passasse de mero mal entendido.
No entanto, certas
coisas e valores não mudaram com o passar do tempo, como querem muitos fazer parecer.
Caso contrário, não precisaríamos nos preocupar, por exemplo, com as repercussões
sociais do Bullying ou do Cyberbullying, principalmente nas escolas e no
ambiente de trabalho. Afinal, poderíamos colocar essas questões no rol do “desconforto”
ou “brincadeira de mau gosto”. Mas, não o fazemos porque não há nada de simples
ou trivial nesses comportamentos.
Cada um sente,
percebe e reage as emoções e aos sentimentos de maneira muito particular. Cada
um tem a sua própria história que determina os níveis de sensibilidade com os
quais irá lidar com as situações da vida. E o mundo, na maioria das vezes, é
hostil e perverso não oportunizando a construção de um emocional capaz de
responder equilibradamente às situações. Por isso, é tão fácil ferir, ofender e
agredir o outro. Ninguém conhece em profundidade o fardo de experiências que ele
carrega.
Mas, há situações
em que não se trata de “pegar pesado” com as emoções alheias. Simplesmente, aquilo que se faz ou se verbaliza ao outro é de profunda deselegância ou
inapropriado. Nesses casos, graus de intimidade relacional são insuficientes
para absolver alguém de uma má conduta. É o caso de pensar antes de agir. O viver
em sociedade clama essas regras de convivência para que haja uma coexistência pacífica
e harmônica.
Vejamos, por
exemplo, o caso das relações entre a Guerra e o Humor. Desde a Segunda Guerra
Mundial que muitos grupos sociais passaram a reproduzir o seu discurso por meio
de charges e caricaturas em jornais e revistas, as quais menosprezavam e
humilhavam aqueles considerados minorias 2.
Mais recentemente, em 2015, o mundo viu novamente esse movimento por meio dos
atentados contra o jornal francês Charlie Hebdo, por conta de charges que fizeram
emergir protestos da comunidade muçulmana em todo o planeta 3.
Isso acontece
porque na essência de quaisquer palavras ou atitudes existem intenções. Nada é
gratuito ou involuntário. Há sempre um propósito, ainda que inconsciente,
imerso naquele comportamento. E como o discurso é o que medeia às relações
sociais, permitindo a inserção humana neste ou naquele lugar social; é
fundamental entender que a língua vai além de um conjunto de signos e de
regras, ela é atravessada por aspectos da ordem do físico, do sociocultural e
do psicológico.
Segundo Eni P. Orlandi (2001) 4,
“Problematizar as maneiras de ler, levar
o sujeito falante ou o leitor a se colocarem questões sobre o que produzem e o
que ouvem nas diferentes manifestações da linguagem. Perceber que não podemos
não estar sujeitos à linguagem, a seus equívocos, sua opacidade. Saber que não
há neutralidade nem mesmo no uso mais aparentemente cotidiano dos signos. A
entrada no simbólico é irremediável e permanente: estamos comprometidos com os
sentidos e o político. Não temos como não interpretar. Isso, que é contribuição
da análise do discurso, nos coloca em estado de reflexão [...]”.
É fundamental,
portanto, fazer da comunicação uma
experiência de vida, na medida em que se ampliam as possibilidades de ser e de
agir discursivamente no mundo; mas, com a consciência da responsabilidade que
isso representa. Embora, a pós-modernidade nos acene que podemos “realizar sem limites”, de acordo com a
própria vontade, isso não é de fato uma verdade.
Dizem os chineses
que “a palavra é prata, o silêncio é ouro”. Não brinque com as palavras. Não se
perca em discursos vãos. Não construa abismos. Não fomente o ódio. Não contribua
com a ignorância. Não se faça lembrar pelas palavras mal ditas. Use as palavras
como ferramenta de edificação de um mundo melhor; afinal, é para isso que elas
servem!
1 Constrangimento - sm. 1. Ato de
constranger. 2. Situação de quem foi
violentado. 3. Pudor que sente quem
foi desrespeitado ou exposto a algo indesejável. 4. Acanhamento. (FERREIRA, A. B. de H. Mini Aurélio: o dicionário da Língua Portuguesa. 8.ed. Curitiba:
Positivo, 2010. 960p.)
2 Leia a
respeito das relações entre a Guerra e o Humor em http://www.historia.ufpr.br/monografias/2003/vinicius_liebel.pdf
4 ORLANDI, E. P. Análise de Discurso: princípios e procedimentos. Campinas,
SP: Pontes, 2001.