domingo, 24 de junho de 2012

Crônica da Semana!!!


Por um céu mais estrelado

Por Alessandra Leles Rocha

Não sei quando, nem onde, nem por que; mas, considero uma pena a humanidade ter abdicado ao longo de séculos e séculos de sua condição fundamental, a singularidade, para se entregar a uma ditadura velada de aceitação social que impõe todos os tipos de “torturas” para agregar e estabelecer convivências. Sim! Temos sido arbitrariamente convidados a nos anular, enquanto indivíduos, em nome do que nem ao menos conseguimos compreender ou determinar.
Por dentro e por fora, há pressões de todas as ordens para que as diferenças, por mínimas e naturais que sejam, desapareçam como em um passe de magica. Arautos da massificação ecoam pelos quatro cantos do mundo desde o que se deve pensar até como se deve viver. Padrões. Tendências. Modismos. Não importa a nomenclatura quando o que está em jogo é a vida no seu sentido mais pleno e genuíno.
Esse silencioso alienar além de danoso é extremamente perigoso. Massificar a sociedade é torna-la cativa a uma determinada face da verdade, sem abertura de parâmetros para a discussão. E, talvez, seja por isso que temos caminhado em passos tão adiantados rumo as mais diversas manifestações de intolerância. As pessoas tem se postado como se a diversidade fosse o estopim para acirrar a rivalidade e o ódio.
Entretanto é preciso observar bem esse pudor exacerbado quanto às manifestações virtuosas do ser humano; mas, nenhum quanto ao seu pior. Aplausos à corrupção, a violência, ao preconceito (de todos os tipos),... uma terrível apologia de que a sobrevivência contemporânea depende desse grau de “sabedoria” e “esperteza”; enquanto, o cultivo das virtudes perdeu-se no “desuso” e na “ineficácia”. Acima do abandono aos parâmetros sociais como certo ou errado, bem ou mal, a humanidade se distancia também da sua analise reflexiva quanto aos seus próprios pensamentos e atitudes frente à coletividade, se esquecem de que o todo é atingido direta ou indiretamente pelos respingos desse modus operandi deturpado.
Chega a ser interessante como alguns segmentos defendem opiniões que ferem diretamente a condição humana e só consideram possível uma revisão em seus paradigmas e posições ideológicas, quando se tornam diretamente envolvidos. Então, paira no ar a pergunta: será mesmo preciso experimentar as dores do mundo para saber a sua real extensão? Mais de sete bilhões de habitantes no planeta, milhões deles em condição absoluta de abandono, enfermidades e miséria. Milhões de pessoas preferem fechar seus olhos para essa realidade, afirmando-se distante da sua possibilidade de auxilio. Muitas dessas mesmas pessoas são as que condenam o controle de natalidade no mundo, mas apoiam a intensificação das estratégias de combate à violência e criminalidade nos centros urbanos, por exemplo. As intempéries climáticas tem desequilibrado consistentemente a produção agrícola pelo planeta e milhões de pessoas têm sido afetadas quanto à distribuição de alimentos. Muitas dessas mesmas pessoas são as que clamam a carestia, mas desperdiçam toneladas de alimento em boa qualidade, por exemplo. E por aí vai... são contradições em cima de contradições pisoteadas pelo admirável gado humano que parece ter involuido a sua condição racional.  O quadro dantesco da vida contemporânea parece não nos impactar além de mera superficialidade; entre ais! e uis! (alguns ohs! de vez em quando), o ser humano repete em mantra “É a vida!”. O rolo compressor da massificação compactou os absurdos em trivial cotidiano e, em alguns casos, subverteu a logica e transformou virtudes em defeitos gravíssimos.
O que diria Voltaire1? Ele que escrevera “Posso não concordar com nenhuma das palavras que você disser, mas defenderei até a morte o direito de você dizê-las.” 2; hoje, teria que aceitar o silêncio mórbido dessa “pseudo liberdade” de expressão... O que diria Rousseau 3? Ele que escrevera sobre a origem da desigualdade entre os homens e contribuiu para a criação da Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão; hoje, teria que aceitar a perpetuação da escravidão ideologica e comportamental da sociedade... Cada vez mais individualistas; cada vez mais desprotegidos de si mesmos. Ainda que pense estar agindo sob a batuta da propria escolha (o que não é verdadeiramente um fato), o ser humano tem acreditado que não precisa se preocupar com o semelhante, como se o confrontar das perguntas e das respostas coletivas não tivessem nenhum peso sobre os rumos de sua propria existência. Quando acreditamos que nossos atos e omissões não tem repercussão, que a raça humana não vive a dar exemplos uns aos outros, que cada um cuide de si, que o diálogo não é mais necessário... as pessoas deixam de existir e o mundo entra na mais plena estagnação até sucumbir. Então, como disse Chaplin, “Não devemos ter medo dos confrontos... até os planetas se chocam e do caos nascem às estrelas” 4.


1 http://pt.wikipedia.org/wiki/Voltaire
2 http://pensador.uol.com.br/frase/MTIyMA/
3 http://pt.wikipedia.org/wiki/Jean-Jacques_Rousseau
4 http://pensador.uol.com.br/nao_devemos_ter_medo_dos_confrontos/