Dia
Internacional dos Direitos Humanos
Por Alessandra
Leles Rocha
Há tempos venho me questionando sobre
quais os motivos que levam os Direitos Humanos a causarem tamanho desconforto e
mal-estar entre muita gente, por aí. Até que, de repente, entendi que falar
sobre tais direitos é um ato que expõe a dimensão do nosso fracasso
civilizatório.
Sim, porque apesar de todas as
tentativas de domesticação e civilização, o Homo sapiens permanece o
bárbaro, o primitivo, de sempre. Com especial atenção para a contemporaneidade,
quando ele encontrou um discurso de legitimação para o seu individualismo, o
seu egoísmo, o seu narcisismo e a sua ânsia por liberdade sem limites.
Razão pela qual estamos diante de
uma luta explícita entre a indignidade e os Direitos Humanos. Enquanto ela
promove um verdadeiro tsunami de desumanização na sociedade, eles tentam, a
duras penas, permanecer o farol de segurança e acolhimento da população;
sobretudo, das camadas mais frágeis e vulneráveis, em tempos caóticos.
E isso acontece porque existe uma
construção discursiva histórica que obstaculiza a compreensão de que os
Direitos humanos significam um direito meu, um direito seu, um direito nosso.
Ora, essa ideia desconstrói a possibilidade de se justificar as desigualdades
no mundo! Em síntese, ela representa um abalo nas regalias, privilégios e
poderes, das classes historicamente dominantes.
Afinal de contas, a Declaração
Universal dos Direitos Humanos (DUDH), publicada em 10 de dezembro de 1948, em
seus 30 artigos não estabeleceu hierarquias de raça, credo, gênero,
escolaridade, status, ... Falou-se estritamente sobre e para os seres humanos.
Os indivíduos foram, portanto, igualados na sua condição existencial, porque é
isso o que realmente importa. Cada vida que chega a esse mundo tem as mesmas
demandas fundamentais para sobreviver, de modo que está nesse contexto o real
ponto de análise.
Embora, a DUDH não nasceu para
ter força de lei, pelo menos, ela sempre buscou exercer o papel fundamental de
delinear um roteiro para que haja uma conscientização social sobre a
necessidade da manutenção da dignidade humana. Abordando os direitos e
liberdades individuais, sociais, políticos, jurídicos e nacionais dos
indivíduos, ela estabelece uma consciência em torno das responsabilidades e
compromissos com a coletividade humana.
O que me parece ser um ponto
nevrálgico para que diversos espectros dentro da sociedade manifestem tamanho
desprezo ou ódio em relação aos Direitos Humanos. Considerando o grau de importância e desimportância
social atribuído a certas parcelas da população, a dignidade, em seus mais
diferentes aspectos, se torna uma questão não acessível a todos. Como se ela
pudesse ser apropriada por uns em detrimento de outros. Daí ao longo da história
nos depararmos com situações de exploração, de trabalho análogo à escravidão,
de desumanização.
Algo difícil de compreender e
aceitar, na medida que subtrai do ser humano qualquer sinal de empatia, de
alteridade, de respeito, que deveriam ser intrínsecos à sua natureza. Mas,
infelizmente, tal comportamento está disseminado por todo o planeta, de uma
maneira trivializada, banalizada, naturalizada. Trazendo a impressão de que muitos
indivíduos estão, de fato, perdendo a capacidade de reconhecer a sua humanidade
no outro. O que torna as expressões da desumanização contemporânea cada vez
mais aterrorizantes e brutais. Basta se debruçar sobre as notícias estampadas pelos
veículos de comunicação e de informação, para se ter a dimensão a respeito.
Como escreveu Carlos Drummond de Andrade, “Os direitos do homem são muitos, e raro o direito de gozar deles. Nem todo homem tem direito a conhecer seus direitos”. Esse é o contexto da reflexão a ser desenvolvida por cada indivíduo. Na análise crítica do seu papel individual sobre o coletivo, no sentido de aceitar, de concordar e, até mesmo, referendar, todo tipo de absurdos cometidos contra os seus semelhantes. Afinal, “A injustiça em qualquer lugar é uma ameaça à justiça em todo lugar” (Martin Luther King Jr.).