sexta-feira, 29 de novembro de 2024

CONSUMO...


CONSUMO...

 

Por Alessandra Leles Rocha

 

Hoje é um dia bastante oportuno para a reflexão a respeito do consumo consciente. Quando incorporamos estratégias consumistas, largamente utilizadas em outros países, esquecemos de observar certos detalhes fundamentais. A começar pelas diferenças socioeconômicas que marcam as realidades.

Sim, o primeiro ponto de análise aborda as desigualdades. A estimulação do consumismo em países afetados por esses abismos socioeconômicos, não só expõe os cidadãos a uma corrida frenética pela constante aquisição de bens, produtos e serviços, como estabelece fronteiras subjetivas para o pertencimento social. O Ter se transforma, portanto, em palavra de ordem.

Milhares de pessoas começam a ultrapassar os seus limites orçamentários, físicos e mentais para atingir as metas que os possibilitem acompanhar a avalanche de novidades trazidas pelo mercado. Seus propósitos de vida acabam condicionados pelo consumo, o que fomenta uma crise inevitável de fastio ou de insatisfação, na medida em que é um caminho sem fim, sem limites. O que significa algo extremamente viciante ao mesmo tempo em que exaustivo, extenuante, sob diferentes aspectos.    

Contudo, não para por aí. O comportamento consumista afeta diretamente o espaço geográfico do planeta e o equilíbrio socioambiental. Um bom exemplo para compreender essa questão está em matérias, tais como “Lixões persistem e coleta seletiva ainda não é universal: IBGE revela como o Brasil lida com resíduos” 1 , “’Lixo do mundo’: o gigantesco cemitério de roupa usada no deserto do Atacama” 2, e “Os segredos revelados pelas ilhas de lixo formadas nos oceanos” 3.

Queiram ou não aceitar, o consumo excessivo e desinteligente é flagrantemente incompatível com o bem-estar do planeta e da população.  Veja, a maioria dos produtos possui um tempo de decomposição superior à expectativa de vida dos seres vivos. De modo que as áreas de descarte e aterro consomem espaços geográficos importantes para a dinâmica cotidiana, incluindo áreas de vegetação nativa que auxiliam no ciclo hidrológico. Sem contar, a diversidade de contaminantes que passa a penetrar no solo e nos cursos d’água, durante o processo metamórfico dos resíduos. Portanto, alguns lugares se tornam impossibilitados de permitir um reaproveitamento espacial pela população.

Muitos se esquecem ou não se dão conta, também, de que a produção industrial por si só, já resulta no consumo de recursos naturais, especialmente, a água. Cada produto consumido é fruto de processos os quais, nem sempre, são planejados de maneira sustentável e de menor potencial degradante. Além disso, a própria engenhosidade produtiva resulta em novos resíduos e efluentes a serem descartados na atmosfera, no solo e nas fontes hídricas, sem que se respeite eventuais medidas de controle e mitigação.

Daí a necessidade de se REPENSAR o consumo, analisando criticamente as nossas prioridades, inclusive, pelo nosso ponto de vista cidadão, que extrapola o individualismo para exercitar um olhar mais coletivo. Essa consciência RESPONSÁVEL não significa abolir o consumo, por completo. Temos necessidades e precisamos supri-las. No entanto, isso pode ser feito de uma maneira inteligente.

Podemos, por exemplo, RECUSAR os excessos. Se por um lado, as promoções do tipo “leve 3 pague 2” parecem economicamente atraentes e viáveis, por outro, elas nos levam a consumir um volume de produtos desnecessário. O que muitas vezes, acaba ocasionando em perdas do prazo de validade e mais resíduos para descarte. Uma lista de compras bem planejada, pensada, permite REDUZIR não só os gastos, como, também, as falsas demandas.

Por isso, na hora de elaborá-la, vale um olhar atento sobre o que se pode REUTILIZAR, RECICLAR e RESTAURAR. São muitas as publicações e reportagens disponíveis, a respeito dessas estratégias sustentáveis. Termos como upcycling 4 e downcycling 5 já são uma realidade na consolidação da chamada moda ecológica ou eco-friendly. Afinal, o objetivo é fazer com que a população estabeleça uma consciência sobre o seu papel na minimização do impacto ambiental tanto na produção quanto no consumo.

E esses comportamentos, não dizem respeito somente à moda. Eles cabem em qualquer segmento da vida cotidiana. Utensílios domésticos. Decoração. Mobiliário. Material escolar. Cozinha. ... Basta um bocado de atenção ao ambiente em que se está inserido e uma boa pitada de criatividade, para colocar em movimento essas práxis.

Assim, pensando sobre todas essas questões, é impossível não lembrar das palavras da poetisa Cecília Meireles: “É preciso amar as pessoas e usar as coisas e não, amar as coisas e usar as pessoas”. Sim, porque é nesse sentido que o consumismo tem conduzido milhões de seres humanos. A uma hipervalorização da monetização e da mercantilização das coisas e das pessoas, como se tudo pudesse ser despojado de ética e de moral, para atender aos desejos insaciáveis da sociedade de consumo.   



4 É o termo dado para a transformação de um produto que iria ser descartado, em um novo produto pronto para o uso.

5 É uma solução prática e importante para reaproveitar e reutilizar matéria-prima que não poderia ser reciclada de outra forma, acabando num aterro ou incinerada.