quinta-feira, 12 de setembro de 2024

Quando o silêncio grita ...

Quando o silêncio grita ...

 

Por Alessandra Leles Rocha

 

Os céus do Brasil cobertos por uma densa fumaça de queimadas. Biomas ardendo em chamas. Animais silvestres morrendo sedentos e queimados. Cidades ameaçadas pelo fogo. Grandes extensões agrícolas destruídas pelos incêndios. Rebanhos cercados pelas labaredas. ... Esse é o cenário nacional em 2024.

Que os eventos extremos do clima estão aí, a ciência não se cansou de avisar! Que a baixa umidade e a escassez hídrica para certas regiões brasileiras, nesse período anual, também, não é novidade para ninguém!

De modo que a incidência de focos de incêndio, de forma muito pontual e esporádica, poderia realmente acontecer. Mas, não é esse o caso. O país foi tomado pelo fogo, de forma simultânea e avassaladora, ou seja, criminosa.

É certo que toda a população vem sendo afetada, em diferentes formas. Mas, chama bastante atenção o fato de que o agronegócio, profundamente atingido por essa crise, não tenha se manifestado publicamente a respeito.

Bem, mesmo sabendo que muitos de seus integrantes são opositores ferrenhos às práxis sustentáveis da Economia Verde, a gravidade da situação impõe uma conduta mais pragmática e realista. Aliás, porque o silêncio, nessas horas, diz tanto quanto as palavras em si. O silêncio não fala, ele grita.

Por trás de toda ação há sempre uma intenção. No caso desses incêndios criminosos há sim, uma dose de tensionamento sobre a economia, desequilibrando a oferta e a procura de alimentos, impulsionando uma possível elevação inflacionária.

Mas, não fica nisso. Há, também, uma franca tentativa de desmoralização do protagonismo brasileiro em relação à defesa das pautas ambientais e de sustentabilidade, no cenário global. Afinal, há quem não queira que seus meios de produção estejam associados às preocupações de inclusão social, consumo consciente e preservação ambiental.

Lamentavelmente, as elites brasileiras do século XXI, em significativa parcela, pensam exatamente como seus antepassados do século XVI. Não enxergam um palmo a frente do nariz! Não se permitem acompanhar os avanços e as discussões científicas, quando essas não coadunam exatamente com o seu pensamento e/ou interesse. Mantendo-se arraigados às velhas práxis produtivas, totalmente desalinhadas às demandas contemporâneas.

Não importa se estão certos. Não importa o grau de limitação do seu conhecimento. Não importa a força da realidade a luz dos seus olhos. Não importa. ...

Essas pessoas estão presas à uma teia histórica de princípios e convicções retrógrados; já desconstruídos e reconstruídos pelo desenvolvimento científico. Mas, elas precisam manter o peso da sua opinião, a autoridade do seu poder, a força da sua supremacia.  

Acontece que dentro desse cenário todos perdem! Enganam-se ao pensar que estão arranhando e desqualificando isoladamente a imagem do governo.

Cada segmento social é responsável pela imagem que produz a partir das suas escolhas, das suas condutas, das suas decisões, dos seus discursos.

Governos vêm e vão. O país fica. A sociedade fica. Os problemas ficam. De modo que, no campo da diplomacia ou do comércio exterior, é esse entendimento que prevalece.

Olhando para os interesses do agro brasileiro, ardendo em chamas, posso imaginar como os concorrentes estrangeiros estão, no mínimo, satisfeitos. Perdas aqui. Lucros gigantescos aos que puderem suprir o Brasil.

Pagaremos caro, por isso? Sim. Mas, os grandes produtores também terão muito que pagar, considerando as dívidas de empréstimos com o governo, para uma safra que, de repente, virou fuligem, diante do fogaréu. Números que irão impactar diretamente no Produto Interno Bruto (PIB) em que suas produções figuram.

Já dizia a Fábula da Ratoeira, de Esopo, “Na próxima vez que você ouvir dizer que alguém está diante de um problema e acreditar que o problema não lhe diz respeito, lembre-se que quando há uma ratoeira na casa, toda fazenda corre risco. O problema de um é problema de todos”.