Por Alessandra
Leles Rocha
Não demorou muito para que a
Direita e seus matizes, especialmente, os mais radicais e extremistas, se
colocassem a transformar uma das maiores tragédias ambientais ocorridas no
Brasil em palco de disputa politiqueira.
De certo modo, tal comportamento
não causa espanto. Já era de se esperar que eles fossem usar de todos os
recursos de sua pseudorretórica para impedir que suas ações no campo
socioambiental viessem a ser questionadas, nesse momento de crise.
Sim, desde representantes
político-partidários até apoiadores e simpatizantes dessa linha ideológica têm
sido partícipes do negacionismo científico, do qual faz parte as discussões
socioambientais. Sendo, muitos deles, apoiadores diretos do desmonte das legislações,
dos protocolos e das instituições de apoio e fiscalização socioambientais. Quem
não se lembra, por exemplo, de como foram encontrados os Yanomamis, em janeiro
de 2023?
No ideário que conduz essas
pessoas, a prioridade será sempre o poder. Poder político. Poder capital. Poder
institucional. Poder social. Poder religioso. Poder cultural. Como se o poder
pudesse existir dissociado da estrutura socioambiental. Como se as pessoas, de
fato, não tivessem a mínima importância; bem como, o espaço geográfico. Como se
fosse possível se apropriar do país à revelia das estruturas do Estado Democrático
de Direito.
A expressão manifesta na fatídica
reunião de 22 de abril de 2020 já dizia: “Temos que passar a boiada”. É exatamente
essa a práxis dessa gente, ou seja, não respeitar quaisquer elementos éticos,
morais ou jurisdicionais, apenas seguir os próprios impulsos e vontades. O que significa
conduzir suas ações no sentido de fortalecer e consolidar todas as vertentes do
seu poder.
Enquanto o país está assombrado
pela perplexidade, diante da emergência climática que acomete o estado do Rio
Grande do Sul, no Congresso Federal, em Brasília, aguardam, ou estão em curso,
diversas pautas que vão exatamente na contramão das inciativas preservacionistas
e de segurança socioambiental 1.
Inclusive, a mais recente
informação, é de que a “Câmara aprova retirada da silvicultura do rol de
atividades poluidoras. Por 309 votos favoráveis a 131 contra, bancada do
agronegócio conseguiu passar texto que contraria ambientalistas e que vai à
sanção de Lula” 2.
Esse é um sinal claro de que o
Brasil pode colocar o coração ao largo, porque vai experimentar dissabores
socioambientais ainda piores! A configuração político-partidária, atual, do
Congresso Nacional, não está nem aí para os avisos, os alertas, os estudos científicos
sobre Meio Ambiente e Mudanças Climáticas. Esses cidadãos estão totalmente
absortos pelos seus interesses e poderes.
A grande verdade é que “a boiada
está passando” no Congresso; mas, certamente, também está nas Assembleias
Legislativas e no Executivo dos estados. Uma vez eleitas democraticamente pelo
povo, essas pessoas acreditam piamente que têm nãos mãos o poder de decidir e
fazer. Que não precisam da opinião de quem quer que seja. Fazendo lembrar um tempo da história em que
pessoas se consideravam absolutas em seu poder.
Lamento, mas a vida não figura mais
como artigo de importância, na contemporaneidade. Lamentam, choram, os que
nutrem apreço e afeição por aqueles que se vão. O restante passa indiferente,
na sua frieza calculista.
É nessas horas que me lembro das seguintes
palavras de Luis Fernando Veríssimo, “É de esquerda ser a favor do aborto e
contra a pena de morte, enquanto direitistas defendem o direito do feto à vida,
porque é sagrada, e o direito do Estado de matá-lo se ele der errado”.
Mas, como se vê, a crueldade e a
perversidade dos direitistas, agora, ampliaram suas fronteiras, quando permitem
que a população seja entregue à própria sorte, quando trabalham arduamente em
favor de projetos que intensificam as emergências climáticas em curso.
Aí podem morrer não nascidos, bebês
de colo, crianças, jovens, adultos e idosos, na medida em que parte dos
representantes do povo simplesmente abdicou do seu compromisso constitucional
de atuar em favor de garantir e proteger a vida. Aliás, alguns deles nem se
encontram, no país, para se solidarizar com as vítimas no Rio Grande do Sul. Estão
no EUA, em viagem difamatória do seu país, custeada com dinheiro público 3.
Diante desse breve exposto, talvez,
seja bom refletir, começando pelo seguinte ponto de partida: “O que nos leva
a escolher uma vida morna? A resposta está estampada na distância e na frieza
dos sorrisos, na frouxidão dos abraços, na indiferença dos bom dia, quase que
sussurrados” (Luis Fernando Veríssimo).
Sim, porque a vida está esfriando
rapidamente. A desumanização é flagrante, na medida em os individualismos narcísicos
se exacerbam. De modo que é fundamental rever nossos conceitos, nossos valores,
nossos princípios, nossas paixões e simpatias. Do mais simples ao mais complexo
ato, nada é desimportante. Pois, como dizia Mahatma Gandhi, “A vida é um
todo indivisível”.
1
O Projeto de Lei (PL) 364/2019, que trata da eliminação a proteção de
todos os campos nativos e outras formações não florestais. O PL 3334/2023,
que trata da viabilização da redução da reserva legal na Amazônia. O PL
2374/2020, que trata da anistia para desmatadores. O PL 1282 /2019 e
o PL 2168/2021, que trata das obras de irrigação em áreas de preservação
permanente. O PL 686/2022, que trata da supressão do controle sobre a
vegetação secundária em área de uso alternativo do solo. O PL 2159/2021,
que trata da Lei Geral do Licenciamento Ambiental. O PL 4994/2023, que
trata da BR319. O PL 10273/2018, que trata do esvaziamento da Taxa de
Controle e Fiscalização Ambiental e do poder do Ibama. O PL 6049/2023,
que altera as regras do Fundo Amazônia. O PL 2633/2020 e PL 510/2021,
que flexibilizam as normas sobre regularização fundiária. O PL 3915/2021,
que altera o marco temporal para regularização fundiária de terras da União. O PL
2550/2021, que amplia o uso da Certidão de Reconhecimento de Ocupação
(CRO). O PL 5822/2019 e 2623/2022, que admitem exploração mineral
em Unidades de Conservação (UCs). O PL 2001/2019, PL 717/2021 e PL
5028/2023, que buscam inviabilizar a criação de UCs. O PL 3087/2022,
que reduz o Parque Nacional Montanhas do Tumucumaque. A Proposta de Emenda
Constitucional (PEC) 59/2023, que delega ao Congresso competência para demarcação
de terras indígenas. A PEC 48/2023, que acrescenta o marco temporal no
art. 231 da Constituição. O PL 6050/2023, que flexibiliza o
desenvolvimento de atividades econômicas nas terras indígenas. O PL
4546/2021, que institui política de infraestrutura hídrica desconectada da
Política Nacional de Recursos Hídricos. A PEC 03/2022, que retira a
propriedade exclusiva da União sobre os Terrenos da Marinha. O PL 254/2023,
que atribui à Marinha o licenciamento ambiental de empreendimentos náuticos. O PL
355/2020, que altera o Código de Mineração. O PL 3587/2023, que cria
o Banco Nacional Forense de Perfis Auríferos. (Fonte: https://congressoemfoco.uol.com.br/area/congresso-nacional/ambientalistas-denunciam-pacote-da-destruicao-com-28-propostas-no-congresso-veja-a-lista/
)