quinta-feira, 9 de maio de 2024

Até quando???


Até quando???

 

Por Alessandra Leles Rocha

 

Não demorou muito para que a Direita e seus matizes, especialmente, os mais radicais e extremistas, se colocassem a transformar uma das maiores tragédias ambientais ocorridas no Brasil em palco de disputa politiqueira.

De certo modo, tal comportamento não causa espanto. Já era de se esperar que eles fossem usar de todos os recursos de sua pseudorretórica para impedir que suas ações no campo socioambiental viessem a ser questionadas, nesse momento de crise.

Sim, desde representantes político-partidários até apoiadores e simpatizantes dessa linha ideológica têm sido partícipes do negacionismo científico, do qual faz parte as discussões socioambientais. Sendo, muitos deles, apoiadores diretos do desmonte das legislações, dos protocolos e das instituições de apoio e fiscalização socioambientais. Quem não se lembra, por exemplo, de como foram encontrados os Yanomamis, em janeiro de 2023?  

No ideário que conduz essas pessoas, a prioridade será sempre o poder. Poder político. Poder capital. Poder institucional. Poder social. Poder religioso. Poder cultural. Como se o poder pudesse existir dissociado da estrutura socioambiental. Como se as pessoas, de fato, não tivessem a mínima importância; bem como, o espaço geográfico. Como se fosse possível se apropriar do país à revelia das estruturas do Estado Democrático de Direito.

A expressão manifesta na fatídica reunião de 22 de abril de 2020 já dizia: “Temos que passar a boiada”. É exatamente essa a práxis dessa gente, ou seja, não respeitar quaisquer elementos éticos, morais ou jurisdicionais, apenas seguir os próprios impulsos e vontades. O que significa conduzir suas ações no sentido de fortalecer e consolidar todas as vertentes do seu poder.

Enquanto o país está assombrado pela perplexidade, diante da emergência climática que acomete o estado do Rio Grande do Sul, no Congresso Federal, em Brasília, aguardam, ou estão em curso, diversas pautas que vão exatamente na contramão das inciativas preservacionistas e de segurança socioambiental 1.

Inclusive, a mais recente informação, é de que a “Câmara aprova retirada da silvicultura do rol de atividades poluidoras. Por 309 votos favoráveis a 131 contra, bancada do agronegócio conseguiu passar texto que contraria ambientalistas e que vai à sanção de Lula” 2.

Esse é um sinal claro de que o Brasil pode colocar o coração ao largo, porque vai experimentar dissabores socioambientais ainda piores! A configuração político-partidária, atual, do Congresso Nacional, não está nem aí para os avisos, os alertas, os estudos científicos sobre Meio Ambiente e Mudanças Climáticas. Esses cidadãos estão totalmente absortos pelos seus interesses e poderes.

A grande verdade é que “a boiada está passando” no Congresso; mas, certamente, também está nas Assembleias Legislativas e no Executivo dos estados. Uma vez eleitas democraticamente pelo povo, essas pessoas acreditam piamente que têm nãos mãos o poder de decidir e fazer. Que não precisam da opinião de quem quer que seja.  Fazendo lembrar um tempo da história em que pessoas se consideravam absolutas em seu poder.

Lamento, mas a vida não figura mais como artigo de importância, na contemporaneidade. Lamentam, choram, os que nutrem apreço e afeição por aqueles que se vão. O restante passa indiferente, na sua frieza calculista.

É nessas horas que me lembro das seguintes palavras de Luis Fernando Veríssimo, “É de esquerda ser a favor do aborto e contra a pena de morte, enquanto direitistas defendem o direito do feto à vida, porque é sagrada, e o direito do Estado de matá-lo se ele der errado”.

Mas, como se vê, a crueldade e a perversidade dos direitistas, agora, ampliaram suas fronteiras, quando permitem que a população seja entregue à própria sorte, quando trabalham arduamente em favor de projetos que intensificam as emergências climáticas em curso.

Aí podem morrer não nascidos, bebês de colo, crianças, jovens, adultos e idosos, na medida em que parte dos representantes do povo simplesmente abdicou do seu compromisso constitucional de atuar em favor de garantir e proteger a vida. Aliás, alguns deles nem se encontram, no país, para se solidarizar com as vítimas no Rio Grande do Sul. Estão no EUA, em viagem difamatória do seu país, custeada com dinheiro público 3.

Diante desse breve exposto, talvez, seja bom refletir, começando pelo seguinte ponto de partida: “O que nos leva a escolher uma vida morna? A resposta está estampada na distância e na frieza dos sorrisos, na frouxidão dos abraços, na indiferença dos bom dia, quase que sussurrados” (Luis Fernando Veríssimo).

Sim, porque a vida está esfriando rapidamente. A desumanização é flagrante, na medida em os individualismos narcísicos se exacerbam. De modo que é fundamental rever nossos conceitos, nossos valores, nossos princípios, nossas paixões e simpatias. Do mais simples ao mais complexo ato, nada é desimportante. Pois, como dizia Mahatma Gandhi, “A vida é um todo indivisível”.



1 O Projeto de Lei (PL) 364/2019, que trata da eliminação a proteção de todos os campos nativos e outras formações não florestais. O PL 3334/2023, que trata da viabilização da redução da reserva legal na Amazônia. O PL 2374/2020, que trata da anistia para desmatadores. O PL 1282 /2019 e o PL 2168/2021, que trata das obras de irrigação em áreas de preservação permanente. O PL 686/2022, que trata da supressão do controle sobre a vegetação secundária em área de uso alternativo do solo. O PL 2159/2021, que trata da Lei Geral do Licenciamento Ambiental. O PL 4994/2023, que trata da BR319. O PL 10273/2018, que trata do esvaziamento da Taxa de Controle e Fiscalização Ambiental e do poder do Ibama. O PL 6049/2023, que altera as regras do Fundo Amazônia. O PL 2633/2020 e PL 510/2021, que flexibilizam as normas sobre regularização fundiária. O PL 3915/2021, que altera o marco temporal para regularização fundiária de terras da União. O PL 2550/2021, que amplia o uso da Certidão de Reconhecimento de Ocupação (CRO). O PL 5822/2019 e 2623/2022, que admitem exploração mineral em Unidades de Conservação (UCs). O PL 2001/2019, PL 717/2021 e PL 5028/2023, que buscam inviabilizar a criação de UCs. O PL 3087/2022, que reduz o Parque Nacional Montanhas do Tumucumaque. A Proposta de Emenda Constitucional (PEC) 59/2023, que delega ao Congresso competência para demarcação de terras indígenas. A PEC 48/2023, que acrescenta o marco temporal no art. 231 da Constituição. O PL 6050/2023, que flexibiliza o desenvolvimento de atividades econômicas nas terras indígenas. O PL 4546/2021, que institui política de infraestrutura hídrica desconectada da Política Nacional de Recursos Hídricos. A PEC 03/2022, que retira a propriedade exclusiva da União sobre os Terrenos da Marinha. O PL 254/2023, que atribui à Marinha o licenciamento ambiental de empreendimentos náuticos. O PL 355/2020, que altera o Código de Mineração. O PL 3587/2023, que cria o Banco Nacional Forense de Perfis Auríferos. (Fonte: https://congressoemfoco.uol.com.br/area/congresso-nacional/ambientalistas-denunciam-pacote-da-destruicao-com-28-propostas-no-congresso-veja-a-lista/ )

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