A nova ordem
socioambiental
Por Alessandra
Leles Rocha
Os eventos extremos do clima não dispõem
de um comportamento linear. Pelo contrário, eles são aleatórios e podem ocorrer
de diferentes maneiras, em diferentes lugares, diversas vezes ao ano. Afinal,
eles são o resultado de consequências somatizadas das ações antrópicas, ao
longo dos séculos.
De modo que as catástrofes que
vêm acontecendo não deixam dúvidas da necessidade urgente de conter tais práxis,
nocivas e deletérias, sob o risco de permanecer enxugando gelo inutilmente, computando
perdas e destruições irreparáveis.
A nova ordem socioambiental chega,
portanto, para desconstruir o desequilíbrio entre o Ser e o Ter. Ou a raça
humana defende a sua sobrevivência no planeta ou sucumbe à destruição com os
bolsos cheios de dinheiro. Sem melindres e constrangimentos, a verdade é que a escolha
posta na mesa de discussão é exatamente essa.
E o ponto de partida dessa
reflexão são os refugiados do clima. A Agência da ONU para Refugiados (ACNUR)
afirma que “As populações deslocadas frequentemente não têm outra opção
senão viver em locais remotos, em campos superlotados ou em assentamentos
informais, com acesso limitado a serviço básicos ou infraestrutura e onde estão
altamente expostas e vulneráveis a riscos climáticos como inundações, secas,
tempestades e ondas de calor. Além disso, a crise climática está perturbando os
meios de subsistência e tornando mais difícil para as pessoas deslocadas se
tornarem autossuficientes. Os impactos climáticos também podem acirrar tensões
e conflitos sobre recursos vitais como água, combustível e terras aráveis,
ameaçando a coexistência pacífica entre populações deslocadas e comunidades
anfitriãs” 1.
Ora, não é difícil entender que o
planeta Terra é por si só limitado, em termos de espaços habitáveis para ocupação
humana. A começar pelo básico que é ⅓ continental
e ⅔ de água. Mas, não para por aí. Somos,
atualmente, pouco mais de 8 bilhões de vidas. Cada uma com seus sonhos, aspirações
e demandas essenciais. De modo que compatibilizar as limitações naturais desse ⅓ de terra
com a população
existente é, então,
um desafio gigantesco. Que não se resume a essa percepção superficial.
Afinal, todo esse malabarismo
socioambiental vem desencadeando consequências gravíssimas, cujo preço está sendo
cobrado através dos eventos extremos do clima. O que significa que o efeito
estufa, a elevação da temperatura global, o derretimento das calotas polares, a
contaminação dos aquíferos, acirram, ainda mais, a disputa pelo uso e ocupação
do solo disponível.
Porque esses tais fenômenos circunstanciais,
citados acima, são sim, promotores de tempestades torrenciais, inundações,
furacões, tufões, secas extremas, incêndios florestais, nevascas súbitas, fora
dos padrões climáticos habituais em cada região do planeta. A lógica ambiental
foi rompida, enquanto o desequilíbrio foi instituído.
Com o impacto negativo direto
sobre o direito à água, à alimentação e à habitação, o adoecimento populacional,
do ponto de vista físico e emocional, tornou-se uma realidade. O que significa
um choque ideológico brutal em relação ao padrão social contemporâneo, pautado
no consumo, na liberdade irrestrita, no interesses individuais, enfim.
Há um nítido estreitamento com o
lado ruim da vida, tão comumente negado e rechaçado discursivamente, por uma
imensa maioria. Mas, ainda que ninguém sequer aceite falar sobre fome,
empobrecimento, adoecimento e deslocamento forçado, isso não muda o curso da
nova ordem socioambiental.
Estamos diante de uma conjuntura
que se impôs inquestionável. Ou nos moldamos a ela ou sucumbiremos rapidamente.
É tudo ou nada. Não há termos para negociação, para flexibilização, para
argumentação. Não foi por falta de avisos trazidos pelas pesquisas científicas,
pelos grandes especialistas no assunto. Aliás, há mais de 50 anos, foi
estabelecido um espaço dialógico para tratar dessa ameaça à sobrevivência global.
Conferência de Estocolmo (1972). Primeira Conferência do Clima (WCC-1, 1979). Conferência
das Nações Unidas sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento (UNCED) (Cúpula da
Terra, Conferência Eco-92 ou Rio-92, 1992). Cúpula Mundial sobre o
Desenvolvimento Sustentável (Rio +10, 2002). Cúpula sobre o Desenvolvimento
Sustentável (Rio +20, 2012). Conferências das partes (COPs), realizadas pela
Convenção Quadro das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas (UNFCCC) 2.
Mas, apesar dos esforços
empregados, desde então, uma flagrante imprevidência, um negacionismo
deliberado, uma resistência capital tendenciosa, por parte dos países;
sobretudo, as grandes economias mundiais, marcou o rumo obstaculizado das
transformações. Acontece que “Você é livre para fazer suas escolhas, mas é
prisioneiro das consequências” (Pablo Neruda).
Uma verdade brilhante e
atemporal! Pois, significa que fazer ou não fazer, em termos ambientais, pode representar
viver ou morrer. Trata-se de uma escolha ética e moral, extremamente, pesada! Que
tende sim, a arrastar uns e outros para o rol da culpa da história da
humanidade, graças ao seu silêncio e/ou sua omissão a respeito da preservação do
seu único lar, ... da sua própria espécie.