terça-feira, 30 de abril de 2024

Trabalho. Emprego. Labuta. Ocupação. Ofício. ... A eterna busca pela garantia da dignidade humana.


Trabalho. Emprego. Labuta. Ocupação. Ofício. ... A eterna busca pela garantia da dignidade humana.

 

Por Alessandra Leles Rocha

 

Na véspera do 1º de maio, a notícia foi de que, no Brasil, o “Desemprego fica em 7,9% nos primeiros três meses” 1.  Enquanto os veículos de comunicação e de informação, tradicionais e alternativos, disputam suas narrativas positivas e negativas a respeito, eu me reservo ao direito de analisar a questão por um outro viés.

Quisera vivêssemos tempos em que a população economicamente ativa desfrutasse de um trabalho que lhe permitisse a dignidade em estado absoluto! Mas, já faz muito tempo, que a transitoriedade pelos caminhos trabalhistas é uma realidade perversa e cruel do mundo contemporâneo.

Ninguém para e pensa que diariamente novos contingentes humanos estão em busca de trabalho pela primeira vez, somando-se às legiões que já percorrem esse caminho há muito mais tempo. O que significa que essa é uma conta cada vez mais difícil de fechar! Afinal, sobram trabalhadores e faltam vagas para absorvê-los.

Além disso, é preciso reconhecer a quantidade de senões que atravessam o cenário do trabalho formal contemporâneo. Não, não falo somente da precarização trabalhista, com todas as suas estratégias capazes de ferir os direitos e a dignidade do indivíduo; mas, também, do etarismo, da misoginia, do racismo, da xenofobia, do assédio moral e sexual, do trabalho análogo à escravidão, enfim.

Esse conjunto de fatores não só afeta a disposição do trabalhador, como contribui para o seu adoecimento físico e mental, dado o nível de pressão a que ele é submetido, diariamente, na sua jornada pela sobrevivência.

No entanto, isso é o que vem padecendo aqueles que conseguem uma oportunidade; mas, e os outros, os 7,9% de desempregados? Pois é, precisamos falar sobre eles.

Como dito no início dessa reflexão, a conta não fecha e tende a ficar ainda mais difícil de fechar, quando a tecnologização contemporânea ocupa os espaços dos trabalhadores humanos.

Em nome do progresso e do desenvolvimento, por exemplo, redes de supermercados já reduziram drasticamente o número de funcionários e trouxeram máquinas de auto service para utilização dos clientes.

Desse modo, milhares de vagas formais, com carteira assinada e direitos trabalhistas previstos, começam a desaparecer diante de nossos olhos, como em um passe de mágica.

Estamos diante de um cenário, que por mais difícil seja de admitir, a própria qualificação profissional é pouco relevante para uma reversão significativa desse fenômeno. A concorrência, a disputa, não acontece mais entre indivíduos, ela acontece entre os indivíduos e as máquinas.  

E adivinha quem vence? Ora, elas estão aptas a cumprir longas jornadas, a executar tudo sem faltas ou atrasos, a não demandar remuneração, a não exigir direitos e/ou benefícios. Sem contar que uma máquina substitui não apenas um funcionário; mas, um grupo considerável deles.

Sem nos darmos conta, milhões de pessoas ao redor do planeta estarão fora do mercado de trabalho à revelia da sua vontade e da sua necessidade humana. Não é à toa que vem se espalhando, como rastilho de pólvora, a ideia do empreendedorismo. Um sopro de esperança em meio ao caos? Talvez, se fosse possível cravar que que qualquer um pode ser um empreendedor.

Ora, temos que considerar que, desde a segunda metade do século XVIII, o inconsciente coletivo da humanidade passou por um processo de reprogramação da atividade laboral, por conta da Revolução Industrial.

O surgimento da figura do proletário, que vende a sua força de trabalho para sobreviver, porque não tem outro meio exceto ela, definiu o entendimento em torno das relações trabalhistas e de produção e consumo, em todo o mundo.

Eis que, de repente, passados pouco mais de dois séculos, o próprio progresso e desenvolvimento científico e tecnológico impingiu à humanidade uma saturação quanto à oferta de oportunidades de trabalho, dentro desse modelo.

Assim, para que legiões de desempregados possam sobreviver, traz-se à tona uma sugestão que se assemelha aos primórdios pré-Revolução Industrial. Vejam, nesse período, o trabalho advinha da força das manufaturas, dos pequenos negócios, da atividade agrícola.

O que significa que o indivíduo empreendia seu tempo e suas habilidades com autonomia, para gerar renda e garantir sua subsistência. O pensamento estava centrado no trabalho em si, não havia o propósito do enriquecimento, da acumulação de capital, como na fase industrial.

E é isso que temos bem diante dos olhos. Com outro cenário, outra roupagem; mas, em suma, a mesma coisa. O empreendedorismo contemporâneo transpira sim, esse ar de tábua de salvação, para que milhões de pessoas não cerrem fileiras no desemprego. De maneira nada sutil, elas estão sendo persuadidas a refazer sua reprogramação da atividade laboral.

Mas, será que é tão simples e fácil voltar às origens, em pleno século XXI? Essa é a pergunta a se fazer. Afinal de contas, somos mais de 8 bilhões de seres humanos, vivendo no planeta Terra.

Para toda essa gente, a ideia de empreender significa o fim das certezas, da segurança. Um verdadeiro salto, sem redes de proteção, tendo em vista que será fundamental aceitar os desafios e assumir sozinho os riscos que podem advir dessa aventura. E isso significa, muito claramente, que para milhões delas a dignidade humana estará ameaçada.

Sim, porque diante da escassez, cada vez mais premente, do trabalho formal, da franca precarização das atividades laborais que ainda restam, ou de um eventual fracasso como empreendedores, como irão sobreviver? Já dizia Nelson Mandela, “Negar ao povo os seus direitos humanos é pôr em causa a sua humanidade. Impor-lhes uma vida miserável de fome e privação é desumanizá-lo”.

Portanto, antes de celebrar o 1º de maio, procure se debruçar sobre a reflexão dessas questões. Como escreveu George Bernard Shaw, “O maior pecado para com os nossos semelhantes, não é odiá-los, mas sim tratá-los com indiferença; é a essência da desumanidade”.