quinta-feira, 7 de março de 2024

Será???


Será???

 

Por Alessandra Leles Rocha

 

Não entendo as razões para tanto desconforto diante das escolhas dos novos presidentes de comissões da Câmara dos Deputados. É de conhecimento geral que a oposição ao governo é maioria, e dentro dela existe um contingente afeito ao ideário ultradireitista, bastante expressivo.  Portanto, surpresa zero!

De modo que quaisquer projeções sobre os rumos dos acontecimentos, em tese, são óbvias. A começar pela ideia de que essa é uma estratégia para obstaculizar diversas pautas do governo. Mas, como alguém já disse, e daí?

Vejam, tudo o que o país tem visto com mais expressão nos últimos anos é a judicialização. Abstendo-se do seu papel constitucional, o Congresso Nacional, seja pela inexperiência ou pela incapacidade técnica dos legisladores eleitos, tem vulnerabilizado as suas atuações a tal ponto que elas se tornam objeto de questionamentos frequentes no Supremo Tribunal Federal (STF).

E isso, por si só, já interrompe o fluxo natural dos trabalhos que poderiam resultar em soluções e melhorias ao país, porque perde-se um tempo enorme aguardando por decisões a respeito de situações flagrantemente inconstitucionais ou sem pé e nem cabeça, que brotam da imaginação criativa de certos parlamentares. Os quais se esperava, minimamente, que conhecessem a Constituição vigente e demais legislações importantes, antes de se lançarem candidatos ao Legislativo Federal.

De modo que a tendência natural seja exatamente essa, a judicialização. Porque muito dessa imaginação criativa, que marca os membros e simpatizantes da ultradireita nacional, é totalmente carente de alguma fundamentação teórica consistente e factível. Haja vista como bradam estridentemente, no parlatório, discursos rasos e ofensivos, porque não dispõem de teses efetivamente robustas e plausíveis.

Isso, quando não apelam para o escárnio infame ou os impropérios de baixíssimo calão, que ferem totalmente o princípio do decoro parlamentar. Aliás, esse é um aspecto interessante, quando o correr da história transpira sinais de tensão na permanência de certos mandatos na Câmara dos Deputados, justamente, por conta de atitudes e comportamentos incompatíveis à atividade parlamentar e os princípios republicanos.

Bem, como é típico da euforia descompensada de certos deputados, não é difícil imaginar, então, que ao conquistar um bônus, como é o caso das Comissões, eles perderão os limites da razão; pois, não há quem desconheça que o poder inebria! Aí é uma atitude impensada daqui, uma palavra enviesada de lá, uma brincadeira de mau gosto acolá, ... e quando se vê, o Conselho de Ética e/ou o Supremo Tribunal Federal (STF) estarão soterrados de denúncias.

Como diria Cazuza, “Saiba que ainda estão rolando os dados / Porque o tempo, o tempo não para” 1. E no Brasil contemporâneo, o que não falta é novidade! Do amanhecer ao anoitecer a história nacional ganha tintas fortes, com a profusão de acontecimentos escandalosos, dentro do cenário político-partidário.  Não se erra ao dizer que o roteirista do Brasil coloca qualquer outro, de Hollywood, no chinelo! Conspirações, intrigas, desafetos, mentiras, traições, ... tem de tudo, no enredo da realidade brasileira!

Esse é o ponto. O tempo não para. Já está provado por A mais B que o poder é incapaz de conter essa avalanche, que desce a montanha à revelia das vontades e quereres de qualquer um. Borboletas batem as asas em diferentes lugares; mas, acabam despindo verdades indigestas, onde menos se espera, minuto a minuto. Assim, silêncios gritam, palavras escapam, fatos são visibilizados.

É por essas e por outras que não acredito que os ultradireitistas e seus aliados e simpatizantes irão prosperar nessa empreitada. Ainda que estimulados pelas convicções retrógradas e conservadoras, oriundas de vieses religiosos, a dinâmica das conjunturas é implacável e incontrolável. Basta ver como uma estrutura de cartas ou dominós reage diante de um mínimo toque. Uma peça que cai derruba o restante.

A contemporaneidade é assim! Um evento que derruba outro, outro, outro, ... Uma personagem que é pega, depois outra, outra, ...  Teimo em acreditar que ninguém imaginava o curso que a história contemporânea brasileira tomaria, nesses últimos meses. Havia tanta certeza pairando no ar. Tudo parecia tão absoluto no seu imobilismo de fachada. Até que o excesso de confiança, de vaidade, de arrogância, de poder, colocou tudo no chão. As verdades vieram à tona!

Portanto, diante dessa breve reflexão, pense nas palavras de Immanuel Kant, quando disse: “Avalia-se a inteligência de um indivíduo pela quantidade de incertezas que ele é capaz de suportar”. Sim, porque “Não importa quão sereno o dia de hoje pode ser, o amanhã é sempre incerto. Não deixe essa realidade assustar você” (Warren Buffett).    



1 O tempo não para (1988) – Agenor De Miranda Araújo Neto / Arnaldo Pires Brandão - https://www.youtube.com/watch?v=_Jcn10Iiuu4