Será???
Por
Alessandra Leles Rocha
Não entendo as razões para tanto desconforto
diante das escolhas dos novos presidentes de comissões da Câmara dos Deputados.
É de conhecimento geral que a oposição ao governo é maioria, e dentro dela
existe um contingente afeito ao ideário ultradireitista, bastante expressivo. Portanto, surpresa zero!
De modo que quaisquer projeções
sobre os rumos dos acontecimentos, em tese, são óbvias. A começar pela ideia de
que essa é uma estratégia para obstaculizar diversas pautas do governo. Mas,
como alguém já disse, e daí?
Vejam, tudo o que o país tem
visto com mais expressão nos últimos anos é a judicialização. Abstendo-se do
seu papel constitucional, o Congresso Nacional, seja pela inexperiência ou pela
incapacidade técnica dos legisladores eleitos, tem vulnerabilizado as suas atuações
a tal ponto que elas se tornam objeto de questionamentos frequentes no Supremo
Tribunal Federal (STF).
E isso, por si só, já interrompe
o fluxo natural dos trabalhos que poderiam resultar em soluções e melhorias ao
país, porque perde-se um tempo enorme aguardando por decisões a respeito de
situações flagrantemente inconstitucionais ou sem pé e nem cabeça, que brotam
da imaginação criativa de certos parlamentares. Os quais se esperava,
minimamente, que conhecessem a Constituição vigente e demais legislações importantes,
antes de se lançarem candidatos ao Legislativo Federal.
De modo que a tendência natural
seja exatamente essa, a judicialização. Porque muito dessa imaginação criativa,
que marca os membros e simpatizantes da ultradireita nacional, é totalmente
carente de alguma fundamentação teórica consistente e factível. Haja vista como
bradam estridentemente, no parlatório, discursos rasos e ofensivos, porque não dispõem
de teses efetivamente robustas e plausíveis.
Isso, quando não apelam para o escárnio
infame ou os impropérios de baixíssimo calão, que ferem totalmente o princípio
do decoro parlamentar. Aliás, esse é um aspecto interessante, quando o correr da
história transpira sinais de tensão na permanência de certos mandatos na Câmara
dos Deputados, justamente, por conta de atitudes e comportamentos incompatíveis
à atividade parlamentar e os princípios republicanos.
Bem, como é típico da euforia
descompensada de certos deputados, não é difícil imaginar, então, que ao
conquistar um bônus, como é o caso das Comissões, eles perderão os limites da
razão; pois, não há quem desconheça que o poder inebria! Aí é uma atitude
impensada daqui, uma palavra enviesada de lá, uma brincadeira de mau gosto
acolá, ... e quando se vê, o Conselho de Ética e/ou o Supremo Tribunal Federal
(STF) estarão soterrados de denúncias.
Como diria Cazuza, “Saiba que
ainda estão rolando os dados / Porque o tempo, o tempo não para” 1. E no Brasil contemporâneo, o que
não falta é novidade! Do amanhecer ao anoitecer a história nacional ganha
tintas fortes, com a profusão de acontecimentos escandalosos, dentro do cenário
político-partidário. Não se erra ao
dizer que o roteirista do Brasil coloca qualquer outro, de Hollywood, no
chinelo! Conspirações, intrigas, desafetos, mentiras, traições, ... tem de tudo,
no enredo da realidade brasileira!
Esse é o ponto. O tempo não para.
Já está provado por A mais B que o poder é incapaz de conter essa avalanche,
que desce a montanha à revelia das vontades e quereres de qualquer um. Borboletas
batem as asas em diferentes lugares; mas, acabam despindo verdades indigestas,
onde menos se espera, minuto a minuto. Assim, silêncios gritam, palavras escapam,
fatos são visibilizados.
É por essas e por outras que não
acredito que os ultradireitistas e seus aliados e simpatizantes irão prosperar
nessa empreitada. Ainda que estimulados pelas convicções retrógradas e conservadoras,
oriundas de vieses religiosos, a dinâmica das conjunturas é implacável e
incontrolável. Basta ver como uma estrutura de cartas ou dominós reage diante
de um mínimo toque. Uma peça que cai derruba o restante.
A contemporaneidade é assim! Um evento
que derruba outro, outro, outro, ... Uma personagem que é pega, depois outra,
outra, ... Teimo em acreditar que
ninguém imaginava o curso que a história contemporânea brasileira tomaria,
nesses últimos meses. Havia tanta certeza pairando no ar. Tudo parecia tão
absoluto no seu imobilismo de fachada. Até que o excesso de confiança, de
vaidade, de arrogância, de poder, colocou tudo no chão. As verdades vieram à
tona!
Portanto, diante dessa breve reflexão, pense nas palavras de Immanuel Kant, quando disse: “Avalia-se a inteligência de um indivíduo pela quantidade de incertezas que ele é capaz de suportar”. Sim, porque “Não importa quão sereno o dia de hoje pode ser, o amanhã é sempre incerto. Não deixe essa realidade assustar você” (Warren Buffett).
1 O tempo não para (1988) – Agenor De Miranda Araújo Neto / Arnaldo Pires Brandão - https://www.youtube.com/watch?v=_Jcn10Iiuu4