Até
o apagar das luzes...
Por
Alessandra Leles Rocha
Observando, além da perspectiva
eleitoral, os caminhos que segue o Brasil nessa reta final de gestão, o
descompromisso com os problemas que afetam diretamente as camadas mais vulneráveis
se mostra evidente. Sem quaisquer reticências ou constrangimentos, a verdade é
que a governança atual não foi pensada, em momento algum, para o coletivo
nacional. Não, ela foi pensada para uma elite e, por isso, nunca importaram os
cortes e contingenciamentos no orçamento, a ausência de políticas públicas e/ou
o sucateamento dos serviços essenciais, por exemplo.
Mas, o que me parece mais grave, nesse
momento, é o fato de que até o apagar das luzes, em 31 de dezembro, muito mais
abandonos, negligências e irresponsabilidades sociais devem ser contabilizados
no país. Sobretudo, se a reeleição não se confirmar. Aí é que o descaso deverá
imperar, como nunca, e o mau uso do dinheiro público deixará suas marcas
nefastas como herança maldita à próxima administração.
Vejam as notícias mais recentes: “Governo faz corte drástico em verba
destinada a enfrentamento de desastres naturais” 1,
“Governo federal corta R$1 bi para orçamento da Educação Básica para 2023” 2, “Para manter orçamento secreto,
governo reduz até verba de combate ao câncer” 3,
“Corte no orçamento da Farmácia Popular atinge 13 medicamentos” 4, “Cortes em Ciência e Cultura para
manter o Sistema da Dívida” 5, “Com
recorde de queimadas, governo gasta só 18% do orçamento contra incêndio” 6, ... O cenário de terra arrasada
está aí!
Admito que é difícil estabelecer
o que seria pior, ou seja, a ausência de um governo ou o desgoverno que pudemos
assistir de perto. Porque, no primeiro caso, os novos tempos seriam para
recolocar as engrenagens em funcionamento, retirar as poeiras e as teias de aranha,
atualizar os planejamentos, colocar o desenvolvimento e o progresso em franca
atividade.
Mas, no segundo caso não. Porque
a situação de desgoverno implica na existência de um desmantelamento, de uma
desorganização e desconstrução voluntárias das estruturas, sem quaisquer
propostas substitutivas capazes de satisfazer a gestão a contento. O caos é
instalado! Um caos que tem ordem, tem método; mas, que não leva nada a lugar
nenhum. Que não passa de uma espiral insana, na qual os erros se repetem
indefinidamente. E infelizmente, esse é o cenário do Brasil atual.
Por isso, mesmo com os acenos de uma
nova conjuntura nascendo no horizonte, a partir dos resultados da eleição, até
que se chegue, finalmente, ao derradeiro fim, os dias ainda serão nessa toada. Nem
adianta pensar que se quaisquer movimentos em favor da reeleição mudariam esse
panorama, porque não. O ponto nevrálgico dessa história não são escolhas
populares, a força do voto; mas, a ideologia colonial rançosa que banha o inconsciente
coletivo das elites brasileiras e que controla os poderes.
Quaisquer que fossem os caminhos
tomados, o resultado seria o mesmo. As notícias seriam as mesmas. Afinal de
contas, tudo foi feito para orbitar os interesses dessas elites, trazendo-lhes
a impressão confortável da inexistência de quaisquer ameaças as suas regalias, privilégios
e enriquecimentos. Porque essa é a base de convicção que sempre as sustentou
até aqui. Então, nunca houve disposição para mudar, para fazer diferente.
Talvez, agora, o que aconteça
seja o recrudescimento dos seus posicionamentos, tendo em vista os riscos
iminentes que se configuram diante de seus olhos, pelas projeções das pesquisas
eleitorais. As atitudes deixariam de se concretizar pelo automatismo do seu modus operandi tradicional, para se
transformarem em instrumentos de retaliação, de desforro. Como se a ruína
pudesse de fato representar um obstáculo intransponível para a reconstrução e a
reafirmação de novas crenças, valores e convicções, tornando-se uma garantia ao
seu retorno triunfante daqui a algum tempo.
Mas, a vida não é simples! E as conjunturas não se escrevem pela força de quereres e vontades alheios. Não há scripts perfeitos. Não há ausência de imprevistos. Uma dinâmica peculiar conduz os acontecimentos, de modo que as interferências humanas não têm um controle absoluto dos movimentos. O fundamental é termos a consciência de que “[...]No novo tempo, apesar dos perigos / Da força mais bruta, da noite que assusta, estamos na luta / Pra sobreviver, para sobreviver, para sobreviver”[...] 7.
1 https://www.correiobraziliense.com.br/economia/2022/09/5039931-verba-destinada-para-enfrentamento-de-desastres-naturais-sofre-corte-drastico.html
2 https://gauchazh.clicrbs.com.br/educacao-e-emprego/noticia/2022/09/governo-federal-corta-r-1-bi-para-orcamento-da-educacao-basica-para-2023-cl7p75bvp004p0153xa9y0sgi.html
3 https://www.correiobraziliense.com.br/economia/2022/09/5039133-para-manter-orcamento-secreto-governo-reduz-ate-verba-de-combate-ao-cancer.html
4 https://mercadoeconsumo.com.br/14/09/2022/estadao-conteudo/corte-no-orcamento-da-farmacia-popular-atinge-13-medicamentos/
5 https://auditoriacidada.org.br/cortes-na-ciencia-e-tecnologia-e-cultura-para-manter-o-sistema-da-divida/
6 https://www.correiobraziliense.com.br/brasil/2022/07/5022039-com-recorde-de-queimadas-governo-gasta-so-18-do-orcamento-contra-incendio.html
7 Novo Tempo (Ivan Lins / Vitor Martins) - https://www.letras.mus.br/ivan-lins/46444/