segunda-feira, 2 de maio de 2022

E aí, está disposto ou não???


E aí, está disposto ou não???

 

Por Alessandra Leles Rocha

 

Quem não gosta de euforia, de entusiasmo, de paixão? Tudo isso é muito bom; mas, sob muitos aspectos não muda o mundo para melhor, não muda a vida para melhor.

Estou vendo muita gente se virando do avesso no movimento de conscientização sobre a importância de fazer o título eleitoral e participar do pleito desse ano; mas, falta alguma coisa nessa agitação. Talvez, um pouco mais de português claro e direto, numa discussão franca e isenta sobre o exercício cidadão.

Partidarismo à parte. Idolatrias à parte. Escolhas à parte. Porque esse é um assunto que demanda um desapego profundo, que envolve, antes de qualquer outra coisa, consciência. E isso é algo pessoal e intransferível.

Trata-se de um diálogo que você estabelece consigo mesmo, sem meias verdades, sem meias mentiras, sem precisar ser diplomático ou polido em demasia. Afinal de contas, a escolha de um representante, seja em que situação for, é algo de extrema responsabilidade.

Sim. Um representante lhe representa. Representa os seus interesses, os seus anseios, as suas ideias, dentro de um determinado espaço, dentro de um determinado tempo. De modo que a representação política não diz respeito só ao agora.

Ela segue seu curso de consequências e desdobramentos por muitos e muitos anos. Seja sob aspectos positivos. Seja sob aspectos negativos. Afinal, ninguém acerta sempre. Porque as escolhas, as decisões, surgem a partir das conjunturas que se configuram.

Acontece que, no caso da política, isso tem uma repercussão tão gigantesca que exige sim, uma análise, um critério, um cuidado, muito maior, a fim de minimizar os impactos.

Tudo porque a política diz respeito não só a meia dúzia de gatos pingados; mas, de um coletivo que ultrapassa a cifra dos milhões de cidadãos. Gente de todo jeito, que carrega nos ombros o peso das implicações relativas à sua própria identidade nacional.

Tem pobre. Tem rico.  Tem analfabeto. Tem letrado. Tem ficha limpa. Tem ficha suja. Enfim... Cada um com a sua realidade, as suas demandas, as suas expectativas, os seus sonhos, as suas frustrações, ... que ninguém tem o direito de desmerecer.

E esse me parece o ponto nevrálgico da reflexão, porque o exercício cidadão brasileiro não foi ensinado a agregar as diferenças em busca de um denominador comum, para que o sucesso, o desenvolvimento, o progresso, fosse realmente bom para todos.

Em mais de 500 anos de história, houve sempre quem ficasse a margem das conquistas, dos direitos, das melhorias. Afinal, aqui, ali e acolá sempre tinha alguém para se colocar à frente das prioridades, por se julgar, de alguma forma, superior dentro do estrato social.

O que significa que a representatividade política acabava dentro de um enviesamento perverso e comumente indigesto; pois, a cada pleito se repete a sina de decisões ultra individualistas.

Passou da hora de prestar atenção  a essa ideia, “[...]Se o país não for pra cada um / Pode estar certo / Não vai ser pra nenhum [...]” 1. E não vai mesmo, se o brasileiro continuar acreditando que mudar pessoas é o suficiente, é a fórmula do “milagre”.

O poeta Mário Quintana já dizia “Livros não mudam o mundo, quem muda o mundo são as pessoas. Os livros só mudam as pessoas”. E em plena era high tech, os livros associados às tecnologias da informação e da comunicação têm sim, a obrigação de serem melhor aproveitados pelo cidadão.

Esse é o momento das multilinguagens – visuais, sonoras, verbais, espaciais, tecnológicas. De torná-las ferramentas verdadeiramente capazes de auxiliar na abstração dos conteúdos e na formulação do próprio entendimento político da realidade. Parar de seguir a cabeça dos outros como se não tivesse uma cabeça sobre o próprio pescoço!

Sabe, a notícia de que o “Brasil fica mais uma vez de fora da reunião do G7”2 tem um caráter didático nesses tempos eleitoreiros. Pois é, a realidade decidiu puxar o tapete de quem ainda queria acreditar que a complexa e caótica situação nacional não impactava a todos os brasileiros.

Que a fome, a miséria, o desemprego, a inflação, ... tudo isso era preocupação da pobreza, dos mais desfavorecidos, dos marginalizados. Mas, quando a situação chega a esse ponto, que “É a terceira vez consecutiva, nos últimos quatro anos, que o país deixa de ser convidado para a reunião, que desta vez ocorre na Alemanha, enquanto líderes da África do Sul, Senegal e Indonésia receberam convites” 3, a “Casa Grande” descobre o tamanho do perigo que tem pela frente e se percebe tão ameaçada quanto à “Senzala”.

Afinal, esse é um fórum constituído por sete nações, as quais conjuntamente representam metade da economia global – Alemanha, Canadá, Estados Unidos, França, Itália Japão e Reino Unido. Ele se reúne desde 1975 para discutir a Economia do mundo.

Portanto, esse é um sinal claro de que a nossa Economia vai mal, que as nossas relações diplomáticas e de comércio exterior vão mal. E esse é um “mal” que se decompõe em efeito cascata sobre todos os brasileiros.

Na medida em que agrava situações que já estão bastante críticas no cenário atual, tais como a desvalorização do real frente ao dólar, os impactos das constantes altas nos juros para tentar conter o arroubo da inflação, a desaceleração da produção industrial.

Portanto, quem estiver defendendo que o país está uma maravilha é de um cinismo vexatório, de uma hipocrisia desconcertante, de uma alienação estúpida. Lamento, mas não dá para expressar de outra forma!

Será mesmo, que tem alguém, dentre esses, que pensa em “apagar o incêndio com tacinhas de champanhe”? Porque o fogo da nossa tragédia se faz alto! Para cada canto que se olhe, da administração pública, o que se vê é um cenário de terra arrasada, de escombros de um desmantelamento proposital, que impede com que a máquina pública reaja satisfatoriamente no cumprimento das suas obrigações e serviços.

Sabe, estudamos história; mas, vivemos a história. Por isso, não dá para tecer comentários e análises somente com base em recortes predefinidos e tendenciosos, escolhidos a dedo por uns e outros. Retratos são só retratos.

Para entender o Brasil precisamos assistir ao filme inteiro, sem cortes! É dessa forma que se torna possível destacar os pontos importantes que nos fizeram chegar até aqui, de um jeito bom ou ruim.

Nem tudo foram flores, nem tudo foram espinhos; mas, a carência de cuidados permitiu que muitas ervas daninhas preenchessem os espaços vazios e destruíssem grande parte do que havia sobrevivido em meio a tantos vendavais.

Diante disso, compartilho uma reflexão que é perfeita nesse contexto: “Eu não voto por rótulos. [...] Eu não quero saber das campanhas eleitorais para nada. Eu quero saber das ideias que as pessoas têm e da maneira como depois as vão defender e praticar” (Agostinho da Silva – filósofo, poeta e ensaísta português).

Afinal, a história não deixa dúvidas ao fato de que “Os piores males que a humanidade já teve de suportar foram infligidos por maus governos” (Ludwig Heinrich Edler von Mises – economista austríaco). Mas, para perceber isso é preciso aquela consciência que não teme colocar os partidarismos à parte, as idolatrias à parte, as escolhas à parte. E aí, está disposto ou não???