E
nada mudou, por aqui, do “Beija-Mão” ao
século XXI
Por
Alessandra Leles Rocha
É, já era de se esperar! O Brasil
não sabe mesmo resolver problemas, priorizar importâncias. Por aqui se mistura
tudo em um mesmo balaio, a fim de tornar a situação tão complexa, tão
insolúvel, que no fim das contas, a inação se torna mais do que justificada
pelas impossibilidades. Isso se explica muito bem, pelo próprio movimento da
Pandemia no país, que se presta a vergonha de arrastar correntes, quando já
poderia estar em outro nível de prevenção e controle.
Tanto é verdade, que se fez
necessária a instauração de uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI), pelo
Senado federal, para apurar a gestão da mesma no país. Lógico que, sem nenhuma
surpresa, ela não só tem provado “por a mais b” os seus indícios iniciais,
como encontrou uma infinidade de crimes que se escondiam nos meandros das
ações. Do mais alto ao mais baixo escalão da República tem estado pessoas
trabalhando na contramão dos princípios éticos, morais e constitucionais.
Mais um exemplo, de comprovação
cabal, de como a má vontade e a indisposição do cidadão brasileiro em exercer
plena e efetivamente a sua cidadania, dão a carta branca necessária para que o
país caminhe por atalhos e vieses nada ortodoxos. Como se houvesse mesmo, uma
aceitação majoritária e coletiva capaz de legitimar “a passagem das boiadas”, muito além da proposta de fazê-la no
campo ambiental, como sugerido por um ministro, durante reunião, em 22 de abril
de 2020.
Não é de hoje, que o Brasil se
comporta como “propriedade de porteiras
abertas”, no campo político e institucional. Contando sempre com decisões a
toque de caixa, com a classe política mantendo seus olhos semifechados para
garantia dos critérios tendenciosos e seletivos, os quais só visam beneficiar a
eles próprios. E aí, nessas alturas do campeonato, o mal já está feito, os prejuízos
estão instituídos e fatura não tarda a ser cobrada do cidadão.
Por isso, eles deitam e rolam,
tripudiando sobre a população sem o menor constrangimento. E mesmo com décadas de
exibições de escárnio, de deselegância e de estupidez, vez por outra, ainda,
conseguem chocar. O problema é que fica nisso, o choque, a perplexidade e nada
mais.
Afinal, as próprias instituições
sociais e políticas permitiram que as situações chegassem a esse nível, por uma
vulgarização das relações, inclusive nos campos ideológicos e funcionais. Perdeu-se
o decoro. Perdeu-se a capacidade de entender as liturgias dos cargos ocupados.
De modo que tamanha
condescendência e flexibilização trouxe os seres humanos para uma arena, onde
tem imperado um verdadeiro vale-tudo. Daí a razão de não haver mais espaço para
o diálogo, para a construção de ideias e consensos, porque tais movimentos tornaram-se
totalmente inócuos.
Basta observar as manchetes
midiáticas para ver a quantidade de decisões aprovadas sem que haja uma ampla discussão,
ou pelo menos, um mínimo conhecimento a respeito, por parte da população.
Haja vista que não tendo
conseguido barrar a instauração da CPI, agora, não só alguns parlamentares permanecem
tentando impedir o seu êxito, como já sinalizam emplacar uma Reforma Eleitoral
que lhes permita certa blindagem obstaculizante a eventuais efeitos do sistema
de freios e contrapesos presente na estrutura jurídica brasileira. Sim, porque
o caminho que se vislumbra transita pela judicialização dos atos.
Dentre as propostas apresentadas
na tal Reforma estão a extinção da previsão de reserva de recursos para as
candidaturas de negros e mulheres, a mudança do sistema eleitoral de “proporcional” para “distritão”, a flexibilização do uso da verba do fundo partidário,
a censura de pesquisas na véspera do pleito eleitoral, a redução do prazo da
Justiça Eleitoral analisar as contas partidárias. Mas, há muito mais absurdos
presentes.
A verdade é que, nesse país, muito
se fala, muito se descobre, pouco se discute, pouco se resolve; enquanto, os
dias seguem seu curso de morticínios. Morrem pessoas. Morrem florestas. Morrem
culturas. Morrem esperanças. ... Enfim, morre a dignidade nacional.
Contudo, a República permanece se
mostrando acanhada, o que não representa necessariamente um mal do presente;
mas, a reprodução secular carregada do peso de terem, os seus representantes
institucionais, abdicado de uma posição mais incisiva há muito mais tempo, há
décadas.
Infelizmente, consequências de
uma política que se contenta em fazer “politicagem”,
sem a devida ousadia de romper com os fisiologismos nacionais, capaz de
compactuar sem constrangimentos com quaisquer manifestações impróprias, indecorosas.
A passividade e a alienação popular parecem reconfortantes demais para eventuais
arroubos e rupturas; afinal, sempre existe alguém para aplaudir, apoiar.
Pois é, foram esses péssimos
exemplos que construíram essa legitimação do bizarro, do repugnante. Afinal de
contas, a construção de valores éticos e morais dentro de uma sociedade é
referendada, particularmente, pelas figuras que se encontram nas esferas mais altas
do poder e da notoriedade.
Se essas se desvirtuam, se
corrompem, e passam a transitar por vias alternativas de interesses
tendenciosos e escusos, é inevitável que ocorra uma ruptura com a ética e a moral,
por meio de uma sinalização deturpada. O que no caso do Brasil, já não seria difícil
de acontecer, em razão das próprias bases de sua história, repletas de
bajulação, de muito “beija-mão” 1.