Não
há inimigo pior ...
Por
Alessandra Leles Rocha
Não há inimigo pior para o ser
humano do que ele próprio; sobretudo, quando ele se envolve no manto da
intempestividade. Destacando-se no cenário de especulações e conjecturas
eleitoreiras para 2022, pode-se dizer que o Presidente da República tem se
excedido nas manobras sobre o tabuleiro do poder e angariado reveses
importantes.
Talvez, por uma busca excessiva
por um adversário ideal mais adiante, as tentativas de desqualificação e
construção de impopularidade aos pretensos oponentes estão se esvaindo por suas
próprias mãos e erros de cálculo.
Ontem foi mais um 22 de abril a
ser esquecido pelo presidente. Primeiro, porque seu discurso na Cúpula do Clima
contradisse seus imensos esforços em reduzir a pó o trabalho de seus
antecessores. Ao valer-se dos bons resultados brasileiros em um passado recente,
ele omitiu sua gestão, até aqui, pela dificuldade que teria em explicar a desconstrução
e alteração das bases gestoras sob cuidados do Ministério do Meio Ambiente; o
que resultou na promoção de uma escalada de maus resultados estatísticos, no
que diz respeito a preservação e conservação dos recursos naturais.
Segundo, porque o pleno do
Supremo Tribunal Federal (STF) manteve a decisão sobre a imparcialidade do ex-juiz
Sérgio Moro em ação contra o ex-presidente Lula, depois de já terem declarado a
incompetência da Vara Federal de Curitiba para julgar o ex-presidente, nas
ações penais relativas aos casos do tríplex do Guarujá, do sítio de Atibaia e
do Instituto Lula (sede e doações). De modo que ele, agora, volta a gozar de
seus direitos políticos e se torna um forte pretenso candidato para 2022.
Se o presidente não fosse inimigo
de si mesmo não teria caído nessas esparrelas. Sua ânsia pelo adversário ideal,
que não lhe imponha obstáculos e dificuldades de vitória, está sim, criando
problemas sérios.
Com grande atraso, agora se sabe
como operou os trabalhos dos adeptos da direita e extrema direita nacional para
romper com os ciclos de governança contrários as suas opiniões e interesses. De
modo que foi por esse caminho que ele se uniu ao ex-juiz, envolvendo-se pela
bandeira da “anticorrupção” e o promovendo depois a seu Ministro da Justiça.
Acontece que antes de chegar ao
centro do poder federal, o ex-juiz já havia angariado uma popularidade
expressiva e trazia consigo uma plataforma de trabalho própria a ser
implementada.
Foi o bastante, então, para que
as rusgas se exacerbassem e culminassem nas farpas da fatídica reunião de 22 de
abril de 2020, quando o desalinhamento dos discursos se mostrou evidente e o
ex-juiz, logo em seguida, pediu exoneração do cargo de Ministro. De certo modo,
em um primeiro momento, o resultado passava a ideia de que acabara de se
construir a desconstrução de um pretenso oponente.
No entanto, ainda não se
imaginava que o ex-presidente voltaria ao cenário político, justamente, a
partir da análise dos pedidos peticionados pela sua defesa em relação ao
ex-juiz. Porque, a verdade da história, naquele momento, ainda transitava pelas
tais linhas tortas da vida.
A aliança que havia sido
estabelecida, com vistas ao sucesso do pleito de 2018, começava, então, a se
desfazer para as pretensões de 2022, diante da reorganização das conjunturas, as
quais não mais favoreciam nem ao atual presidente e nem ao ex-juiz.
Mas, não se pode esquecer de que,
antes disso, o presidente já havia operado da mesma maneira contra o Governador
de São Paulo, na sua cruzada insana contra a vacina CoronaVac, produzida em
parceria entre o Instituto Butantã e a Sinovac chinesa, para proteção contra a
COVID-19.
Ciente das pretensões do
governador, em relação ao pleito presidencial de 2022, a liderança nas
tratativas em relação à vacina precisava ser contida. Então, ele se colocou em
oposição à aquisição dos insumos para produção nacional e das vacinas já
envazadas; bem como, da sua aplicação junto à população.
Claro que prejuízos de natureza
temporal ocorreram; mas, no frigir dos ovos, o empenho do governador acabou
rendendo destaque e protagonismo, no cenário tão tumultuado da gestão da
Pandemia no país.
Diante do crescimento exponencial
das mortes pelo Sars-COV-2 e a pressão da opinião pública nacional e
internacional por uma vacinação ágil e efetiva, o presidente não teve outro
caminho a não ser apoiar as vacinas disponíveis no país, incluindo a CoronaVac.
Sem contar que, contrariando as expectativas
do presidente, frente a possibilidade de o ex-presidente voltar ao cenário
político, o governador sinalizou publicamente a sua pretensão a reeleição ao
cargo atual. De modo que os prognósticos quanto ao futuro foram se desfazendo
sem controle.
William Shakespeare já dizia, “ou você controla seus atos, ou eles o
controlarão”. O tabuleiro do poder não é para amadorismos, precipitações,
inquietudes vãs. É preciso saber o que fazer, por que fazer, quando fazer;
afinal, como tudo na vida, sobre o poder residem consequências imprevisíveis.
Basta ver, o tamanho dos estragos
que o diminuto inimigo viral tem nos feito experimentar. Os desdobramentos das catástrofes
climáticas, que se abatem sobre o planeta, em decorrência da fiação perversa e
desordenada dos seres humanos. ... Tudo o que acontece na vida faz parte do
jogo.
Por isso, não se pode jamais
esquecer de que “a felicidade e a
liberdade começam com a clara compreensão de um princípio: algumas coisas estão
sob nosso controle, outras não. Só depois de lidar com essa questão fundamental
e aprender a distinguir entre o que você pode e o que não pode controlar, é que
a tranquilidade interna e a eficácia externa se tornam possíveis” (Epiteto –
filósofo grego estoico).
Caso contrário, haverá sempre a
sombra de um fantasma que cresce e se alimenta no cerne de seu próprio sentido,
até que, um dia, consiga consumi-lo de tanta exaustão, sem ao menos lhe dar a
possibilidade de responder “Onde foi que
eu errei? ”.