Linhas
tênues
Por
Alessandra Leles Rocha
Recentemente escrevi um texto
falando sobre o “balaio de gato” que
se transformou a vida. Basta um piscar de olhos para confundir “alhos com bugalhos” e perder o foco do que
realmente importa. Algo que fica muito claro nos cenários do poder, onde parece
que o “quanto pior melhor” reina
absoluto para dificultar a compreensão isenta e objetiva da população. Isso significa
uma investida acirrada de sobreposição, a quaisquer preços, dos interesses
políticos em detrimento de quaisquer outros.
Ora, mas o país é sustentado por
um arcabouço de leis, regras, códigos, doutrinas para assegurar o equilíbrio e
a manutenção da sociedade, evitando ou mitigando a deflagração de eventuais
conflitos de interesses. E nesse campo das teias jurídicas, o Brasil dispõe de
um arranjo bastante robusto para auxiliá-lo no trânsito das decisões; o que não
quer dizer que não possa incorrer em situações equivocadas ou desconfortáveis a
opinião majoritária, por conta da própria força e possibilidades existentes na arena
do Direito.
Como grande parte da população
desconhece os meandros e terminologias jurídicas, não é difícil distanciá-la da
reflexão isenta e objetiva em casos de amplo interesse público; sobretudo, quando
se permite legitimar os interesses políticos a partir do respaldo de decisões da
Justiça. Muito embora, existam pessoas que se permitem aceitar esse processo
por vontade própria, por mera conveniência e passividade cidadã.
Assim, o foco do que está em jogo
deixa de ser o fato em si, para se resumir aos aspectos periféricos e menos
relevantes judicialmente; mas, bem mais simplistas e assimiláveis, criando uma
atmosfera de apoio deveras tendenciosa. Porque aquilo que deveria ser o objeto
de análise processual, que é necessariamente a razão do assunto ter alcançado a
esfera do judiciário, se perde em si mesmo pela fragilidade da peça instituída
ou da condução do rito processual. Como se a espuma passasse a despertar mais
atenção do que o próprio leite. Daí a necessidade da atenção, da lisura, do
comprometimento para evitar a nulidade do processo e, por consequência, a
construção de uma dúvida sobre a existência ou não do delito.
Não canso de repetir minhas
reflexões sobre o ranço colonial existente no Brasil, especialmente, no tocante
a práxis de que “os fins justificam os
meios”; mas, é por razões óbvias como essa. As tentativas em se fazer da
Justiça um instrumento de legitimação de interesses políticos só faz desvirtuar
completamente os seus princípios éticos e morais; como, também, deteriorar a
solidez das instituições e do espírito cidadão.
Como tão bem escreveu Rui Barbosa,
“saudade da justiça imparcial, exata,
precisa. Que estava ao lado da direita, da esquerda, centro ou fundos. Porque o
que faz a justiça é o “ser justo”. Tão simples e tão banal. Tão puro. Saudade da
justiça pura, imaculada. Aquela que não olha a quem nem o rabo de ninguém. A que
não olha o bolso também. Que tanto faz quem dá mais, pode mais, fala mais. Saudade
da justiça capaz”.
A quebra de protocolos, de
diretrizes, de condutas consagradas, estabelece discrepâncias de julgamentos e
de pessoas, ou seja, enfatiza as desigualdades, fomenta as polarizações que inflamam
as paixões do mundo. Tendo em vista se tratar da negligência e da desobservância
do Direito, cujo comprometimento fundamental deveria ser o de agir com imparcialidade
e no atendimento eficiente e responsável as causas que chegam ao seu
conhecimento. Afinal, “a defesa não quer
dizer o panegírico1 da culpa ou do culpado. Sua
função consiste em ser, ao lado do acusado, inocente ou criminoso, a voz dos
seus direitos legais” (Rui Barbosa – Obras Completas, 1942).
Portanto, a coexistência pacífica
e equilibrada que não só o Brasil; mas, o mundo anseia, busca no Direito uma
resposta precisa, uma decisão que exima dúvidas e questionamentos, que cumpra a
justiça o suficiente para desconstruir a banalização do ilícito, onde quer que
ele queira emergir.
O ser humano é, por excelência,
um ser falível. Ele pode errar por atos, omissões, indecisões ou juízos de
valor equivocados. Cabe, então, à Justiça colocar sobre sua balança a apuração dos
fatos com objetividade e precisão; para só assim, poder reparar, quando de fato
existirem, os desvios cometidos e oferecer a punição cabível dentro dos
preceitos das leis em vigência.