Os fins, os meios, as traições
Por Alessandra Leles Rocha
Embora a Pandemia
esteja fazendo estragos no país, é estranho como as principais casas legislativas,
Câmara dos Deputados e Senado Federal, parecem totalmente absorvidas pela
eleição de suas principais cadeiras. Uma preocupação generalizada em torno de
possíveis “traições” partidárias figura, inclusive, como assunto de destaque na
mídia nacional. Vejam que não restou nem o cuidado de “tampar o sol com a
peneira” para disfarçar como os interesses pessoais deles estão cada vez mais acima
de quaisquer interesses da sociedade. E legislando em causa própria vão tecendo
uma traição contínua ao povo que os elegeu.
Sim, porque diante de
antigas e recentes mazelas, há tempos que o Brasil carece um pouco mais de
atenção e vontade de seus congressistas. Porque não se trata só de remover as
teias de aranhas sobre pilhas de projetos e processos inertes; mas, no
significado prático disso. Não, não se trata apenas de prejuízos diversos para
a população. O não “arregaçar as mangas” do Congresso nacional, também, se associa
diretamente as posições retardatárias que o país ocupa no cenário mundial.
Sejamos honestos que
os nossos nobres representantes não se parecem muito afeitos a se inspirar
pelas novidades que acontecem ao redor do globo e resultam em melhorias
significativas nos campos do desenvolvimento. Não os vejo olhar para a
contemporaneidade e extrair dela as prioridades na hora de pautar as discussões
e as deliberações em plenário. Vivem negociando, barganhando interesses,
enquanto o objeto principal a ser decidido fica relegado ao fim da fila; se é
que ela tem mesmo um. Como se o país pudesse esperar e, por consequência, toda
a sua gente.
E isso é algo
realmente merecedor de reflexão, porque um processo semelhante tem sido
dispensado pelo Executivo; sobretudo, nessa Pandemia, e causado profundo
descontentamento e desconforto sociedade afora. Ainda que a postergação seja um
comportamento já incorporado pela maioria da população; não significa que ela tenha
perdido sua nocividade. O atraso, a
demora, podem matar, como temos visto recentemente acontecer.
O hábito de trivializar ideias e comportamentos
a fim de legitimá-los é, portanto, além de algo bem ultrapassado, muito
perigoso. Pena que é, justamente, isso o que se tenta fazer em relação ao
fisiologismo no país. Começando pela prática de sucessões quase que hereditárias,
as quais alçaram famílias inteiras ao apogeu da política brasileira, a história
foi desenhando um panorama de condutas e práticas condenáveis alicerçadas nas
trocas de favores que viessem a satisfazer apenas os interesses
político-partidários, que persistem ainda hoje.
De modo que no frigir
dos ovos, as promessas de campanha não conseguem ultrapassar as fronteiras da
linguagem verbal para se materializarem. O que não é difícil perceber, quando a
cada novo pleito se ouvem plataformas, defendendo demandas já manifestas tantas
vezes no passado, que haveria tempo hábil para que tivessem sido solucionadas,
mas não foram. Apesar disso, como a “credulidade”
ainda teima em resistir, essas promessas se traduzem no sucesso eleitoral de
alguns.
No entanto, à revelia
de vontades e quereres de muitos, por sorte a roda da vida está começando a
girar diferente. Talvez, finalmente, tenhamos alcançado o que disse Mário Sérgio
Cortella sobre a esperança, ou seja, não confundirmos esperança de o verbo
esperançar com esperança do verbo esperar. “[...]
Esperançar é se levantar, esperançar é ir atrás, esperançar é construir,
esperançar é não desistir! Esperançar é levar adiante, esperançar é juntar-se
com outros para fazer de outro modo” (Trecho retirado do livro “Educação e
Esperança”[1]).
Isso significa que a
sociedade, mesmo em seus vieses mais abandonados e carentes, começa a dar
sinais de almejar por uma representatividade que de fato lhe represente. Que seja
sua voz. Que lute por suas demandas e sonhos. Que seja ponto de consenso; um
denominador comum nas tribulações. Que valorize e respeite o voto que recebeu
de você, na simbologia máxima que ele traduz. Afinal, de cada beijo traidor
recebido até hoje, todos já estão fartos de saber que o fim nunca foi diferente
daquele da história original. Então...