Direitos
Humanos sob a lente da verdade
Por
Alessandra Leles Rocha
Segundo o escritor britânico Oscar
Wilde, “A vida imita a arte muito mais do que a arte imita a vida...”. Particularmente, eu penso que não; a vida e a
arte são faces de uma mesma moeda e se misturam diante de nossos olhos. Mas, o
que me fez pensar sobre isso foi mais uma, entre tantas polêmicas, que se abateu
sobre a Academia de Artes e Ciências Cinematográficas (Academy of Motion Picture Arts and Sciences, AMPAS) pouco antes da entrega do Oscar, no final de fevereiro deste
ano.
Depois que algumas atrizes, como
Jennifer Lawrence e Gwyneth Paltrow criticaram publicamente a desigualdade
salarial em Hollywood; agora, a questão à tona é a diversidade étnica. Spike Lee, Jada Pinkett Smith e Will Smith
manifestaram seu boicote ao grande prêmio do cinema, em razão do seu descontentamento
diante da falta de indicados negros ao Oscar. Então, de repente se percebe que
a luta pela igualdade prevista na legislação de Direitos Humanos vai muito além
das fronteiras.
Frente aos
abismos provocados pelas diversas formas de desigualdade, o que está posto em discussão
é o desrespeito ao ser humano. É uma afronta grotesca a construção de estereótipos
sociais aceitos dentro desse ou daquele contexto, quando a vida real é a
exposição da pluralidade em todos os sentidos.
Somos diferentes
sim! Cada um de nós é um, mesmo se colocados dentro do rótulo, ou classificação,
de uma etnia. E que bom que seja assim! A singularidade permite a variabilidade
genética, comportamental, filosófica, existencial e, é desse modo que, a
construção de uma sociedade acontece e evolui. Habilidades e competências que
não se distinguem por detalhes morfológicos; mas, por uma capacidade in natura que se há de desenvolver ao
longo do tempo e da vida. Mas, continuamos a “procurar pelo em ovo”, o que é
uma pena. Especialmente, quando o assunto é arte.
Nada é mais libertária,
fraterna e igualitária do que a manifestação artística, ao ponto, inclusive, de
resultados significativos na terapêutica psíquica e emocional. É o individuo,
portanto, em sua essência, que determina o nível de qualidade que a sua arte
irá alcançar. Sem dedicação, sem empenho, sem vontade, o artista não passa da
mediocridade, mesmo que encontre pelo caminho um ‘empurrãozinho camarada’ para torna-la
‘digerível’ ao público em geral. A arte dessa maneira não vinga em longo prazo;
fica pelo caminho!
Grandes
artistas são o que são pelo conjunto de valores humanos e comportamentais que reúnem
para lapidar sua obra. Daí não importa o gênero, a etnia, a idade, vez por outra
eles nos surpreendem fazendo alquimia com seu próprio ofício. De onde ninguém
esperava um expressivo resultado, vem à surpresa. E é isso que os olhos da
sociedade precisam (re) aprender a enxergar, ao invés de se apegarem a detalhes
ridiculamente insignificantes; como por exemplo, para enaltecer um ter que diminuir
o outro.
No tocante à arte
da interpretação, seja ela cinema, teatro ou televisão, isso se torna ainda
mais desprezível. Quando estamos diante de uma cena, o que nos arrebata é a
mágica da sensibilidade interpretativa que supera e transcende a qualidade dos
efeitos especiais, ou da caracterização, ou da música, ou do cenário. É a força
de um olhar, ou as lágrimas frias a escorrer sobre uma face endurecida pelo
ódio, ou a ternura de um abraço de perdão, enfim... Somos espectadores fiéis às
grandes interpretações; ao contrário, dos que pensam que o mundo gira ao redor
de uma face centrada num padrão predeterminado por A ou B.
É, assim, nas pequenas
ignorâncias do mundo que se constroem os artefatos da guerra. Cada ser humano
que chega ao mundo é um cidadão, um indivíduo numericamente classificado pelo Estado
e, até certa idade, ninguém se preocupa, além disso. Somente quando começamos a
ampliar as nossas relações sociais é que determinados aspectos começam a ter importância,
significado para os outros. A desigualdade fica mais e mais visível a quem não
consegue pensar fora de uma igualdade pré-fabricada.
Desse modo, os
muros são erguidos. Tudo é uma ameaça; tanto subjetiva quanto objetivamente. De
repente nos tornamos reféns das loucuras alheias, de quem quer ter o controle
absoluto do mundo: o que você vai pensar, vai admirar, vai aplaudir, vai
copiar, vai... vai... vai... Uma arbitrária idealização da identidade coletiva.
E de tão acostumados a essa ‘doutrinação’ silenciosa, nem nos damos conta dos prejuízos
éticos e morais desencadeados. Então, valeu a manifestação conjunta da arte e
da vida nesse caso! Precisamos que os
indicados aos prêmios das Academias, ou simplesmente da vida, sejam aqueles cujo
mérito tão extraordinário consiga sem esforço silenciar quaisquer atitudes
tolas, ou desrespeitosas, que ainda persistam na sociedade.