Por Alessandra Leles Rocha
Pergunta a manchete “O que você faria com os 115 milhões da Mega Sena?”, e por incrível que pareça a resposta não vem com facilidade. Dinheiro demais sempre confunde a cabeça; até mesmo para responder de pronto.
Diante dessas cifras milionárias exibidas pelas loterias no país, paro para contemplar o paradoxo brasileiro que impede a legalização dos cassinos, sob a justificativa de que os mesmos levam as pessoas ao vício da jogatina compulsiva; mas, mantém sob a batuta governamental diversas modalidades de aposta, que nada mais são do que “jogos de azar”. Do mais rico ao mais pobre, atire a primeira pedra quem nunca arriscou uma “fezinha”, hein? Jogar, arriscar, apostar, tudo isso faz parte da natureza humana e, quando envolve algum tipo de retorno material, aí o interesse se torna ainda maior. Por isso, o discurso contra os cassinos é bastante inconsistente. Quem quer jogar, joga na loteria, joga nos cassinos do Uruguai, joga em Las Vegas, joga aonde o seu poder aquisitivo puder lhe levar; mas, deixar de fazê-lo é uma questão bastante pessoal e não governamental.
E voltando ao milionário prêmio a ser sorteado essa noite, imagina se o sortudo ganhador irá deixar de jogar. Talvez, não por agora; mas, chegará o momento em que a mão irá coçar e ele (ou ela) entrará na roda-viva novamente. É! Se tivéssemos cassinos por aqui, tudo regularizado, pagando impostos como é lá nos Estados Unidos, os nossos milionários emergentes teriam onde se divertir, não é? Fariam a sua alegria e a de milhares de outras pessoas que teriam novas frentes de trabalho disponíveis; garçons, chefes de cozinha, recepcionistas, artistas, produtores musicais, iluminadores, maquiadores etc.etc.etc. Mas, como a realidade aqui é outra, o jeito é parar de conjecturar!
Então, no rol das possibilidades sobre o que fazer com tantos milhões, voltamos ao trivial: adquirir muitos imóveis, muitos carros, viajar pelo mundo em cruzeiros nababescos; enfim, viver de rendas, sem pensar em nada. Sem pensar em nada? Ficou maluco (a)??? Depois de se dirigir todo discreto, tentando esconder o sorriso cor de pérolas, e tomar posse do que lhe é de direito, suas informações caem nas mãos do Fisco e será que ficarão guardadinhas, no mais absoluto sigilo? Pois é! Como não pensar, não é mesmo? A sensação de que “todos os seus problemas foram resolvidos”, dura pouco. Milhões em dinheiro, milhões em preocupação. Sem perceber você se transforma em alvo e leva consigo as pessoas mais próximas; todos em evidência, em risco. Nem sempre a realidade é tão atraente! Se a vida confortável traria sossego sob alguns aspectos, por outros ela indica não valer à pena.
Quem joga sabe bem que a sorte não acena para todos. Mesmo que você insista em correr atrás do “pote de ouro”, pode ser que ele nunca chegue, não faça parte da sua história. Então, deveríamos nos perguntar “O que somos capazes de fazer sem os 115 milhões da Mega Sena?”. Enquanto você não é um dos premiados, a vida segue seu curso como deve ser, cheia de altos e baixos, vitórias e derrotas, alegrias e pesares; de frente para o espelho da realidade, rompemos com os delírios de extravagâncias e consumo, mas nos deparamos com seres aguerridos o bastante para não sucumbir aos solavancos da vida e capazes de sobreviver e ter, como qualquer ser humano, momentos felizes. Vivemos um dia após o outro, buscando novas oportunidades, driblando as adversidades, tecendo parcerias, comungando experiências, estendendo solidariedade, enxergando o mundo com mais amor. Para quem consegue realizar tudo isso, ganhar ou não na loteria é o que menos importa, no final; pois a vida já lhe preencheu todos os sentidos e todas as necessidades. Se um dia houver de ganhar milhões, certamente saberá como empregá-lo com justiça, com inteligência, com fraternidade; afinal, uma verdade é incontestável: “caixão não tem gavetas” e “nem o céu possui agências bancárias”!