Por Alessandra Leles Rocha
Embora a lei nos diga que todos temos direitos e deveres, a prática na verdade dista bastante da teoria, e por essa razão não são raras às vezes em que o cidadão brasileiro manifeste tanto receio em perder. Aproveitando-me de que mais uma eleição se aproxima, um bom exemplo desse temor é a comum manifestação: “eu não perco meu voto!”. Vejamos só a que ponto chegou à sociedade! Ora, ora! Tratam de um dos poucos direitos que temos como quem trata de uma aposta futebolística!
Não sei se preguiça de usar a cachola por conta própria, de agarrar com unhas e dentes essa arma tão poderosa de transformação, de se posicionar diante dos acontecimentos e das mazelas cotidianas; mas, o fato é que a sociedade brasileira nesse afã de viver sem pensar entrega “de mãos beijadas” o direito secreto e individual de eleger seus representantes nas esferas do poder. Amparados nos discursos de pesquisas sabidamente não muito fidedignas, na camaradagem que possa resultar em benefícios próprios, na ignorância de compor a massa e não destoar da opinião da maioria; assim, eles agem sem parcimônia diante das relevâncias da vida. Longe de um altruísmo piegas, o pensar individual atento ao coletivo, é o grande trunfo para o bem comum; mas, frequentemente se reclama da eleição do diretor da escola, do vereador, do prefeito, do deputado etc.etc.etc., sob a alegação de que “se soubesse que seria assim, não teria dado meu voto!”, “em nome da amizade, acabei fazendo uma escolha ruim!”, enfim... o péssimo e indesejável hábito de enxergar apenas o próprio umbigo!
E no mais profundo paradoxo a sociedade brasileira se equilibra entre uma atmosfera de felicidade, exibida em pesquisas mundo afora, e uma lamúria diária sobre a vida que não se cansa em estampar problemas crônicos; ao invés, de virar a mesa e de arregaçar as mangas em prol de uma realidade bem diferente, com uma felicidade verdadeira contida na mutação do status de país para o status de nação. Sim! Enquanto nos fechamos no automatismo individualista da luta pelo interesse próprio e esquecemo-nos da coletividade o alcance de ganhos reais torna-se cada vez mais distante. Vivemos um país desagregado, onde cada segmento tem que hastear a própria bandeira e partir para sua própria guerra, que termina por não chegar a nenhum lugar e com milhares de soldados enfraquecidos. Exemplos como Japão, Alemanha, Coréia do Sul, Chile e tantos outros, não faltam para nos dimensionar sobre o que seja ser uma nação e todos os implicativos positivos que desse nacionalismo advém. Mas, enquanto isso, muitos ainda “pensam” em “não perder o voto”!
Depois de tantos vexames, com sorte o Projeto “Ficha Limpa” 1 foi aprovado e passa a vigorar nesse próximo pleito; mas, sem a força da consciência individual na escolha, talvez muito pouco seja transformado. A luta pelo sufrágio ao longo da história foi marcada por grandes desafios, pela busca da democracia, da participação universal de todos os segmentos sociais, e hoje, quando assistimos à omissão das pessoas em refletir, analisar, ponderar sobre os diversos aspectos desse ato, sentimos uma sensação terrível de que tudo fora em vão. Certamente, que muitas dessas análises prévias são frutos de conjecturas, pois a dinâmica do amanhã é incerta; mas, elas também sinalizam aspectos merecedores de atenção e por essa razão tornam-se imprescindíveis.
A escolha é sua, é minha, é nossa, está em nossas mãos! Já passou da hora de ganharmos o voto elevando esse país à esfera de uma nação que almeja pelo progresso, pelo desenvolvimento, pela sustentabilidade de sua cidadania. De agirmos pensando em curto, em médio e em longo prazo o peso das consequências de nossas ações. De olharmos bem fundo em nossa própria realidade e estabelecermos seus pontos positivos e negativos e o que mais é possível fazer para avançarmos evolutivamente. Não se trata de uma aposta, de vencedores ou derrotados; mas, de assumirmos nossa responsabilidade sobre quem somos, o que pensamos, o que fazemos e o que esperamos para esse país.