segunda-feira, 6 de novembro de 2023

O nome do Brasil no mapa do mundo ...


O nome do Brasil no mapa do mundo ...

 

Por Alessandra Leles Rocha

 

Para minha total surpresa, os Jogos Pan-Americanos de Santiago, no Chile, finalizados ontem, não tiveram ampla divulgação pelos veículos de comunicação tradicionais, no Brasil, ficando restrita a alguns canais alternativos na internet. Uma pena, posto que o país superou de maneira extraordinária, o Pan-Americano de Lima, no Peru, em 2019. Dessa vez, foram 205 medalhas no total, sendo 66 ouros, 73 pratas e 66 bronzes.

De modo que fiquei pensando profundamente a respeito, considerando que historicamente grandes eventos desportivos sempre despertaram a atenção dos países, como vitrines das suas habilidades e competências humanas. Geopoliticamente falando, os esportes se tornaram uma arena de força e poder, haja vista o exemplo dos Jogos Olímpicos de Berlim, na Alemanha, em 1936, utilizado como máquina de propaganda do nazismo.

Mas, tenho que admitir, a contemporaneidade vive sob uma outra lógica. Estes são tempos estranhos, em que o sentido de unidade, de coletividade, de senso comum, está bastante abalado. Algumas nações estão sob o domínio das paixões polarizantes, ideologicamente sustentadas por perspectivas diametralmente opostas e altamente explosivas. Algo que ultrapassa os limites dos cidadãos comuns e percola por todas as camadas e instâncias da sociedade, reduzindo de maneira drástica as possibilidades de análise isenta sobre qualquer assunto.

Assim, depois de todo o processo de disputa eleitoral experienciado pelo Brasil, em 2022, e que reverberou, em 2023, o ápice de toda a expressão antidemocrática e anticidadã pelas forças conduzidas pela ultradireita nacional, um evento desportivo dessa envergadura tornou-se um assunto, um tanto quanto espinhoso, na perspectiva dos veículos de comunicação e de informação; sobretudo, os tradicionais.

Ora, todas as vezes em que o Brasil é representado no cenário desportivo mundial surgem questionamentos em torno da necessidade de maiores investimentos no setor, maior apoio para a formação das novas gerações de atletas, enfim. E como é de conhecimento público, os esportes não foram uma prioridade para a última gestão governamental brasileira. Os desafios para os desportos nacionais se dão em todos os níveis, principalmente, para os de alta performance, que são os representantes do país nas grandes competições. Praticamente, eles tiram leite de pedra para brilhar no cenário mundial.

No entanto, tendo em vista que uma parcela bastante significativa dos veículos de comunicação e informação nacionais estiveram alinhados ao antigo governo, seria desconfortável lidar com a possibilidade em torno dessas questões. Mas, supondo que os resultados não fossem decepcionantes e mantivessem, pelo menos, os da edição anterior do evento, ainda assim, eles estariam sendo conquistados já na gestão vencedora da última eleição, cuja ideologia não encontra respaldo na maioria desses veículos de comunicação e informação.

Pois é, o Brasil no pódio é algo semioticamente muito significativo e relevante para o governo em curso. É a imagem de um país vencedor, forte, competitivo, apesar de resiliente diante de muitas fragilidades socioeconômicas. Embora, não deixe de incorrer sobre ele uma cobrança em torno de maiores investimentos no setor, maior apoio para a formação das novas gerações de atletas, desenvolvimento de novas políticas desportivas educacionais. Especialmente, depois da precoce substituição da liderança no Ministério do Esporte.

Mas, como se tem visto em diferentes setores do país, os apoiadores e simpatizantes da ultradireita nacional não querem visibilizar quaisquer conquistas que favoreçam ao atual governo. Acontece que esse modo de fazer política, de defender seus pontos de vista, não se constrange em obstaculizar o crescimento e o desenvolvimento do país no cenário internacional. Nem tampouco, no caso do esporte, de criar espelhos vivos que possam inspirar outras crianças e jovens a buscar uma oportunidade de futuro além dos limites da sua dificuldade cotidiana. Inclusive, porque a ultradireita é radicalmente contra a ascensão das camadas sociais mais frágeis e vulneráveis aos direitos humanos fundamentais, tais como educação, esporte, cultura, lazer.

Por essas e por outras, os Jogos Pan-Americanos de Santiago, no Chile, tiveram uma visibilidade afunilada e, de certo modo, aquém do que poderia alcançar. Em tempos de saúde mental tão abalada pelas constantes investidas de um mundo cruel e perverso, que insiste em proliferar e distribuir notícias abjetas, deveríamos estar em busca de acontecimentos que nos permitissem transitar no extremo oposto a fim de nos dar a oportunidade de respirar um ar menos tóxico e pesado.

Foram dias em que milhares de luzes humanas se acenderam e seus talentos despontaram. Conhecemos um Brasil desportivo gigantesco, e descobrimos que nem tudo estava tão distante da nossa realidade. Gente, fomos ouro no Wrestling. Prata no Arco Recurvo e no Beisebol. Bronze na Pelota Basca. Isso para citar algumas surpresas! Foi como se, de repente, o Brasil mostrasse um lado seu totalmente extraordinário, considerando toda a dose de superação e de resiliência necessária para estar ali, fazendo o impossível parecer fácil.

O bom é que ele tem, ainda, muito mais para mostrar! Dia 17 de novembro começam os Jogos Parapan-Americanos de Santiago, no Chile. Porém, mais uma vez, a divulgação tende a ficar restrita a alguns canais alternativos na internet. Algo que não surpreende, dado todo o panorama de invisibilidade que teima em pairar sobre os cidadãos brasileiros deficientes. Sim, discutir a questão da deficiência implica necessariamente em expor as inúmeras fragilidades e vulnerabilidades existentes nas políticas públicas brasileiras. É, ser um paratleta, no Brasil, é uma verdadeira odisseia!

Assim, depois de traçar essa breve reflexão, penso que as palavras de Michael Jordan finalizam bem a ideia. Segundo ele, “Há muitos times em todos os esportes que têm grandes jogadores e nunca ganham títulos. Na maioria das vezes, esses jogadores não estão dispostos a se sacrificar pelo bem maior do time. O que é engraçado é que, no final, a falta de vontade deles de se sacrificar somente torna glórias individuais mais difíceis de alcançar. Uma coisa que eu acredito piamente é que se você conquista algo como um time, as glórias individuais vão vir por conta própria. Talento ganha jogos, mas trabalho em equipe e inteligência ganham campeonatos”.

Por isso, para que o Brasil seja mais e mais protagonista no cenário desportivo mundial, precisamos que o país esteja coeso em torno dessa ideia. Governos, dirigentes, atletas, escolas, patrocinadores, mídias, cidadãos. O esporte é fluído e precisa do movimento de geração em geração para se renovar, se atualizar, se aprimorar. Não basta viver de glórias. Não basta só pensar no hoje.

Não é à toa que Nelson Mandela declarou, durante a Copa do Mundo de Rúgbi, em 1995, sediada pela África do Sul, que “Eu percebi o impacto que aquele esporte poderia causar, tamanha era a importância dele para o país. E principalmente porque o esporte fala uma língua que é entendida por todos, e em todas as partes do mundo”. E essa compreensão resultou no fato de a África do Sul ter passado do descrédito à ovação acalorada, quando chegou à final e venceu o torneio. As marcas do apartheid cederam lugar para uma nova percepção global da África do Sul, ou seja, de um país que podia vencer.