O nome do
Brasil no mapa do mundo ...
Por Alessandra
Leles Rocha
Para minha total surpresa, os
Jogos Pan-Americanos de Santiago, no Chile, finalizados ontem, não tiveram
ampla divulgação pelos veículos de comunicação tradicionais, no Brasil, ficando
restrita a alguns canais alternativos na internet. Uma pena, posto que o país superou
de maneira extraordinária, o Pan-Americano de Lima, no Peru, em 2019. Dessa
vez, foram 205 medalhas no total, sendo 66 ouros, 73 pratas e 66 bronzes.
De modo que fiquei pensando
profundamente a respeito, considerando que historicamente grandes eventos
desportivos sempre despertaram a atenção dos países, como vitrines das suas
habilidades e competências humanas. Geopoliticamente falando, os esportes se
tornaram uma arena de força e poder, haja vista o exemplo dos Jogos Olímpicos
de Berlim, na Alemanha, em 1936, utilizado como máquina de propaganda do
nazismo.
Mas, tenho que admitir, a
contemporaneidade vive sob uma outra lógica. Estes são tempos estranhos, em que
o sentido de unidade, de coletividade, de senso comum, está bastante abalado. Algumas
nações estão sob o domínio das paixões polarizantes, ideologicamente
sustentadas por perspectivas diametralmente opostas e altamente explosivas. Algo
que ultrapassa os limites dos cidadãos comuns e percola por todas as camadas e
instâncias da sociedade, reduzindo de maneira drástica as possibilidades de
análise isenta sobre qualquer assunto.
Assim, depois de todo o processo
de disputa eleitoral experienciado pelo Brasil, em 2022, e que reverberou, em
2023, o ápice de toda a expressão antidemocrática e anticidadã pelas forças
conduzidas pela ultradireita nacional, um evento desportivo dessa envergadura
tornou-se um assunto, um tanto quanto espinhoso, na perspectiva dos veículos de
comunicação e de informação; sobretudo, os tradicionais.
Ora, todas as vezes em que o
Brasil é representado no cenário desportivo mundial surgem questionamentos em
torno da necessidade de maiores investimentos no setor, maior apoio para a formação
das novas gerações de atletas, enfim. E como é de conhecimento público, os
esportes não foram uma prioridade para a última gestão governamental brasileira.
Os desafios para os desportos nacionais se dão em todos os níveis,
principalmente, para os de alta performance, que são os representantes do país
nas grandes competições. Praticamente, eles tiram leite de pedra para brilhar
no cenário mundial.
No entanto, tendo em vista que
uma parcela bastante significativa dos veículos de comunicação e informação
nacionais estiveram alinhados ao antigo governo, seria desconfortável lidar com
a possibilidade em torno dessas questões. Mas, supondo que os resultados não
fossem decepcionantes e mantivessem, pelo menos, os da edição anterior do
evento, ainda assim, eles estariam sendo conquistados já na gestão vencedora da
última eleição, cuja ideologia não encontra respaldo na maioria desses veículos
de comunicação e informação.
Pois é, o Brasil no pódio é algo semioticamente
muito significativo e relevante para o governo em curso. É a imagem de um país
vencedor, forte, competitivo, apesar de resiliente diante de muitas
fragilidades socioeconômicas. Embora, não deixe de incorrer sobre ele uma
cobrança em torno de maiores investimentos no setor, maior apoio para a formação
das novas gerações de atletas, desenvolvimento de novas políticas desportivas
educacionais. Especialmente, depois da precoce substituição da liderança no
Ministério do Esporte.
Mas, como se tem visto em
diferentes setores do país, os apoiadores e simpatizantes da ultradireita
nacional não querem visibilizar quaisquer conquistas que favoreçam ao atual
governo. Acontece que esse modo de fazer política, de defender seus pontos de
vista, não se constrange em obstaculizar o crescimento e o desenvolvimento do
país no cenário internacional. Nem tampouco, no caso do esporte, de criar
espelhos vivos que possam inspirar outras crianças e jovens a buscar uma
oportunidade de futuro além dos limites da sua dificuldade cotidiana. Inclusive,
porque a ultradireita é radicalmente contra a ascensão das camadas sociais mais
frágeis e vulneráveis aos direitos humanos fundamentais, tais como educação,
esporte, cultura, lazer.
Por essas e por outras, os Jogos
Pan-Americanos de Santiago, no Chile, tiveram uma visibilidade afunilada e, de
certo modo, aquém do que poderia alcançar. Em tempos de saúde mental tão
abalada pelas constantes investidas de um mundo cruel e perverso, que insiste
em proliferar e distribuir notícias abjetas, deveríamos estar em busca de acontecimentos
que nos permitissem transitar no extremo oposto a fim de nos dar a oportunidade
de respirar um ar menos tóxico e pesado.
Foram dias em que milhares de
luzes humanas se acenderam e seus talentos despontaram. Conhecemos um Brasil
desportivo gigantesco, e descobrimos que nem tudo estava tão distante da nossa
realidade. Gente, fomos ouro no Wrestling. Prata no Arco Recurvo e no Beisebol.
Bronze na Pelota Basca. Isso para citar algumas surpresas! Foi como se, de
repente, o Brasil mostrasse um lado seu totalmente extraordinário, considerando
toda a dose de superação e de resiliência necessária para estar ali, fazendo o
impossível parecer fácil.
O bom é que ele tem, ainda, muito
mais para mostrar! Dia 17 de novembro começam os Jogos Parapan-Americanos de Santiago,
no Chile. Porém, mais uma vez, a divulgação tende a ficar restrita a alguns
canais alternativos na internet. Algo que não surpreende, dado todo o panorama
de invisibilidade que teima em pairar sobre os cidadãos brasileiros deficientes.
Sim, discutir a questão da deficiência implica necessariamente em expor as inúmeras
fragilidades e vulnerabilidades existentes nas políticas públicas brasileiras. É,
ser um paratleta, no Brasil, é uma verdadeira odisseia!
Assim, depois de traçar essa
breve reflexão, penso que as palavras de Michael Jordan finalizam bem a ideia.
Segundo ele, “Há muitos times em todos os esportes que têm grandes jogadores
e nunca ganham títulos. Na maioria das vezes, esses jogadores não estão
dispostos a se sacrificar pelo bem maior do time. O que é engraçado é que, no
final, a falta de vontade deles de se sacrificar somente torna glórias
individuais mais difíceis de alcançar. Uma coisa que eu acredito piamente é que
se você conquista algo como um time, as glórias individuais vão vir por conta
própria. Talento ganha jogos, mas trabalho em equipe e inteligência ganham
campeonatos”.
Por isso, para que o Brasil seja
mais e mais protagonista no cenário desportivo mundial, precisamos que o país
esteja coeso em torno dessa ideia. Governos, dirigentes, atletas, escolas, patrocinadores,
mídias, cidadãos. O esporte é fluído e precisa do movimento de geração em
geração para se renovar, se atualizar, se aprimorar. Não basta viver de
glórias. Não basta só pensar no hoje.
Não é à toa que Nelson Mandela declarou, durante a Copa do Mundo de Rúgbi, em 1995, sediada pela África do Sul, que “Eu percebi o impacto que aquele esporte poderia causar, tamanha era a importância dele para o país. E principalmente porque o esporte fala uma língua que é entendida por todos, e em todas as partes do mundo”. E essa compreensão resultou no fato de a África do Sul ter passado do descrédito à ovação acalorada, quando chegou à final e venceu o torneio. As marcas do apartheid cederam lugar para uma nova percepção global da África do Sul, ou seja, de um país que podia vencer.