quinta-feira, 24 de junho de 2021

Não se engane! A brasa segue encoberta por cinzas...


Não se engane! A brasa segue encoberta por cinzas...

 

Por Alessandra Leles Rocha

 

Muitos não se dão conta de que as raízes das discussões ambientais remontam da Revolução Industrial, na metade do século XVIII. Pois é, ali, com a sociedade urbanoindustrial, emergiu uma nova organização do espaço geográfico, a ampliação da utilização dos recursos naturais – água, lenha e carvão para mover as máquinas à vapor, a diversidade de resíduos sólidos produzidos, enfim...

De modo que, durante muito tempo, o olhar sobre as questões socioambientais se restringia ao desconforto dos problemas gerados pela industrialização; mas, sem a devida consciência quanto a causa. Insalubridade. Epidemias. Violências. Miséria.

Somente com o desenvolvimento das Ciências e o recrudescimento dos impactos advindos da 2ª e 3ª Revoluções Industriais é que a compreensão e as discussões em torno do Meio Ambiente e da Sustentabilidade começaram a se intensificar e ganhar corpo.

Inúmeros estudos, promovidos por entidades e instituições renomadas de pesquisa, passaram a trazer dados e projeções a respeito dos caminhos do desenvolvimento urbanoindustrial no planeta, em paralelo ao crescimento populacional e suas demandas.

Os resultados apontavam o acirramento do desgaste dos recursos naturais renováveis e não renováveis e a iminência da sua insuficiência para atender aos seres humanos; portanto, era preciso repensar o progresso e traçar metas e planos sustentáveis.

Considerando os processos de colonização exploratória ocorridos anteriormente à revolução Industrial, fica claro que muitos países já vinham de uma exaustão ambiental há muito mais tempo do que outros. Entretanto, a única função do passado nesse contexto era trazer à tona as más práticas de uso e ocupação do meio ambiente, como exemplos a não serem repetidos ou perpetuados na contemporaneidade.

Porque a lógica é simples. A sustentabilidade é uma relação entre o tempo e a suficiência de recursos. Quanto mais rápido acontece o esgotamento de uma determinada área, menos recurso a humanidade terá para o futuro; visto que, nem sempre é possível reverter os danos e promover a recuperação. Enquanto o meio ambiente vem sendo dilapidado, a população do planeta, por sua vez, não parou de crescer e de manifestar infinitas necessidades, incompatibilizando o equilíbrio ambiental.

O problema, portanto, está nas resistências em relação as mudanças necessárias as práxis ambientais empregadas. Os interesses do capital, ainda, querem se sobrepor aos fatos cientificamente comprovados. Embora, o peso das conjunturas venha reajustando as tomadas de decisão, a cada nova carência que se assinala no horizonte; como é o caso dos recursos hídricos e das mudanças climáticas.

A queda de braço com a Ciência está perdendo o sentido, diante da concretude dos acontecimentos. Felizmente, começa-se a entender que não é uma questão meramente de narrativas, discursos e ações práticas promovidos por essa ou aquela pessoa.

As políticas de desenvolvimento socioambiental são de ordem institucional, com o apoio de entidades e organismos internacionais dentro e fora dos respectivos territórios, onde estão baseadas. Porque é através dessa rede integrada que a globalização, enquanto processo integrativo socioeconômico e cultural, pode se fortalecer.

Pena, que o Brasil queira permanecer à margem ou na contramão desse fluxo. A intransigência brasileira não representa apenas a deterioração e a destruição dos recursos naturais; mas, uma cascata de impactos negativos no que tange a sua inserção no campo globalizado. Contudo, a realidade contemporânea rechaça veementemente aqueles que atrelam sua imagem comercial com declarados agentes de degradação socioambiental, como é o caso.

Sei que são tempos de uma sociedade que gosta de se mostrar sob recortes que lhes façam mais satisfatórios. Mas, com o Meio Ambiente é tudo ou nada, não dá para partir de fragmentos. Essa ideia, por exemplo, de discutir a proposta de crédito de carbono 1, com base em uma eventual barganha de preservação das florestas brasileiras, é infantil.

O Brasil quer, por toda lei, justificar que, se o mundo quiser ver os nossos biomas intocados, ou minimamente, preservados, sem queimadas, desmatamentos e outras atividades ilegais de depredação, terá que pagar por isso, porque já destruíram suas florestas e ninguém fez objeção.

Parece cômico; mas, isso não é nem a pontinha do iceberg que afasta o país da inclusão no mundo globalizado sustentável. Antes fosse. O Meio Ambiente brasileiro está sob ameaça, em virtude da visão colonialista em que se apega o governo.

Sustentada pelo imediatismo exploratório inconsequente, ela se concentra, por exemplo, na ampliação de terras para o agronegócio voltado à exportação, no extrativismo mineral e vegetal ilegal, na negligência aos direitos indígenas e quilombolas.

E para colocar em prática essa fúria incontrolável, desde o início da atual gestão tem havido o enfraquecimento das regulamentações ambientais, o desmantelamento dos órgãos responsáveis e a redução na transparência das informações disponíveis, a extinção ou reestruturação dos órgãos colegiados associados às políticas socioambientais, ... O que significa que está estabelecida uma ruptura, que o país não se importa em ser um pária internacional em assuntos de Meio Ambiente.

Portanto, esse movimento nacional está acima das peças humanas que movem essas engrenagens; está a cargo de mentores intelectuais que não dispõem de formação tecnocientífica para tal. Nenhuma mudança, então, faz diferença; visto que, todos leem a mesma cartilha pré-definida para repetirem, em coro, o mantra de um capitalismo insustentavelmente retrógrado.

Mas, como diz o provérbio indígena, “Só quando a última árvore for derrubada, o último peixe for morto e o último rio for poluído é que o homem perceberá que não pode comer dinheiro”. Aguardemos o curso das conjunturas, elas não falham jamais. Afinal, “Nunca se esquecem as lições aprendidas na dor” (Provérbio africano).   

 



1 É um conceito, surgido a partir do Protocolo de Kyoto em 1997, que busca diminuir a emissão de gases de efeito estufa. Portanto, tratam-se de unidades de medida que correspondem, cada uma, à uma tonelada de dióxido de carbono equivalente. Ações que promovem reduções de gases de efeito estufa recebem, então, uma certificação de redução que conta como créditos de carbono, os quais podem ser comercializados com países que não reduziram sus próprias emissões.