Não
se engane! A brasa segue encoberta por cinzas...
Por
Alessandra Leles Rocha
Muitos não se dão conta de que as
raízes das discussões ambientais remontam da Revolução Industrial, na metade do
século XVIII. Pois é, ali, com a sociedade urbanoindustrial, emergiu uma nova
organização do espaço geográfico, a ampliação da utilização dos recursos
naturais – água, lenha e carvão para mover as máquinas à vapor, a diversidade de
resíduos sólidos produzidos, enfim...
De modo que, durante muito tempo,
o olhar sobre as questões socioambientais se restringia ao desconforto dos
problemas gerados pela industrialização; mas, sem a devida consciência quanto a
causa. Insalubridade. Epidemias. Violências. Miséria.
Somente com o desenvolvimento das
Ciências e o recrudescimento dos impactos advindos da 2ª e 3ª Revoluções
Industriais é que a compreensão e as discussões em torno do Meio Ambiente e da
Sustentabilidade começaram a se intensificar e ganhar corpo.
Inúmeros estudos, promovidos por
entidades e instituições renomadas de pesquisa, passaram a trazer dados e
projeções a respeito dos caminhos do desenvolvimento urbanoindustrial no
planeta, em paralelo ao crescimento populacional e suas demandas.
Os resultados apontavam o
acirramento do desgaste dos recursos naturais renováveis e não renováveis e a iminência
da sua insuficiência para atender aos seres humanos; portanto, era preciso
repensar o progresso e traçar metas e planos sustentáveis.
Considerando os processos de
colonização exploratória ocorridos anteriormente à revolução Industrial, fica
claro que muitos países já vinham de uma exaustão ambiental há muito mais tempo
do que outros. Entretanto, a única função do passado nesse contexto era trazer
à tona as más práticas de uso e ocupação do meio ambiente, como exemplos a não
serem repetidos ou perpetuados na contemporaneidade.
Porque a lógica é simples. A sustentabilidade
é uma relação entre o tempo e a suficiência de recursos. Quanto mais rápido acontece
o esgotamento de uma determinada área, menos recurso a humanidade terá para o
futuro; visto que, nem sempre é possível reverter os danos e promover a
recuperação. Enquanto o meio ambiente vem sendo dilapidado, a população do
planeta, por sua vez, não parou de crescer e de manifestar infinitas necessidades,
incompatibilizando o equilíbrio ambiental.
O problema, portanto, está nas resistências
em relação as mudanças necessárias as práxis ambientais empregadas. Os interesses
do capital, ainda, querem se sobrepor aos fatos cientificamente comprovados. Embora,
o peso das conjunturas venha reajustando as tomadas de decisão, a cada nova carência
que se assinala no horizonte; como é o caso dos recursos hídricos e das
mudanças climáticas.
A queda de braço com a Ciência
está perdendo o sentido, diante da concretude dos acontecimentos. Felizmente,
começa-se a entender que não é uma questão meramente de narrativas, discursos e
ações práticas promovidos por essa ou aquela pessoa.
As políticas de desenvolvimento
socioambiental são de ordem institucional, com o apoio de entidades e
organismos internacionais dentro e fora dos respectivos territórios, onde estão
baseadas. Porque é através dessa rede integrada que a globalização, enquanto
processo integrativo socioeconômico e cultural, pode se fortalecer.
Pena, que o Brasil queira
permanecer à margem ou na contramão desse fluxo. A intransigência brasileira não
representa apenas a deterioração e a destruição dos recursos naturais; mas, uma
cascata de impactos negativos no que tange a sua inserção no campo globalizado.
Contudo, a realidade contemporânea rechaça veementemente aqueles que atrelam
sua imagem comercial com declarados agentes de degradação socioambiental, como
é o caso.
Sei que são tempos de uma
sociedade que gosta de se mostrar sob recortes que lhes façam mais
satisfatórios. Mas, com o Meio Ambiente é tudo ou nada, não dá para partir de fragmentos.
Essa ideia, por exemplo, de discutir a proposta de crédito de carbono 1, com base em uma eventual barganha de
preservação das florestas brasileiras, é infantil.
O Brasil quer, por toda lei,
justificar que, se o mundo quiser ver os nossos biomas intocados, ou
minimamente, preservados, sem queimadas, desmatamentos e outras atividades
ilegais de depredação, terá que pagar por isso, porque já destruíram suas
florestas e ninguém fez objeção.
Parece cômico; mas, isso não é
nem a pontinha do iceberg que afasta
o país da inclusão no mundo globalizado sustentável. Antes fosse. O Meio
Ambiente brasileiro está sob ameaça, em virtude da visão colonialista em que se
apega o governo.
Sustentada pelo imediatismo
exploratório inconsequente, ela se concentra, por exemplo, na ampliação de
terras para o agronegócio voltado à exportação, no extrativismo mineral e
vegetal ilegal, na negligência aos direitos indígenas e quilombolas.
E para colocar em prática essa fúria
incontrolável, desde o início da atual gestão tem havido o enfraquecimento das regulamentações
ambientais, o desmantelamento dos órgãos responsáveis e a redução na transparência
das informações disponíveis, a extinção ou reestruturação dos órgãos colegiados
associados às políticas socioambientais, ... O que significa que está
estabelecida uma ruptura, que o país não se importa em ser um pária internacional
em assuntos de Meio Ambiente.
Portanto, esse movimento nacional
está acima das peças humanas que movem essas engrenagens; está a cargo de
mentores intelectuais que não dispõem de formação tecnocientífica para tal. Nenhuma
mudança, então, faz diferença; visto que, todos leem a mesma cartilha
pré-definida para repetirem, em coro, o mantra de um capitalismo insustentavelmente
retrógrado.
Mas, como diz o provérbio
indígena, “Só quando a última árvore for
derrubada, o último peixe for morto e o último rio for poluído é que o homem perceberá
que não pode comer dinheiro”. Aguardemos o curso das conjunturas, elas não
falham jamais. Afinal, “Nunca se esquecem
as lições aprendidas na dor” (Provérbio africano).
1 É um conceito, surgido a partir do Protocolo de Kyoto em 1997, que busca diminuir a emissão de gases de efeito estufa. Portanto, tratam-se de unidades de medida que correspondem, cada uma, à uma tonelada de dióxido de carbono equivalente. Ações que promovem reduções de gases de efeito estufa recebem, então, uma certificação de redução que conta como créditos de carbono, os quais podem ser comercializados com países que não reduziram sus próprias emissões.