terça-feira, 19 de janeiro de 2021

O “know-how” e a Vacina postos em xeque


O “know-how” e a Vacina postos em xeque

 

 

Por Alessandra Leles Rocha

 

 

O chamado “know-how” é construído no tempo. Da noite para o dia não há como se atingir a habilidade, a tecnologia, a capacidade, a competência ou, simplesmente, o saber como fazer. Quando o Sars-COV-2 adentrou ao nosso convívio, como um ilustre desconhecido, fomos tomados por uma perplexidade inicial para depois nos ingressarmos nas linhas de frente para decifrá-lo e tomarmos as medidas mais adequadas e eficazes. Portanto, um “know-how” a ser desenvolvido simultaneamente ao processo pandêmico; o que significa que lá se foram até aqui 11 meses.

Mas do ponto de vista do Brasil, contrariando vários bons exemplos de “know-how” em diferentes áreas, o resultado dessa vez caminha aquém das expectativas mais elementares. A falta de planejamento, de método, de organização tem sido crucial para fomentar um panorama caótico.  Esquecido de que, dessa vez, esse não era um problema único e exclusivamente seu, o país não ponderou sobre uma análise global todos os impactos e demandas, tornando-se retardatário em questões emergenciais. Abdicou de estabelecer o seu “know-how”.

Equipamentos de proteção individual e respiradores foram as primeiras insuficiências apontadas durante a 1ª onda da pandemia em território nacional. O país viveu momentos de tensão, no limite de sua capacidade de atendimento, enquanto tentava driblar tais carências. Algo inimaginado e que, certamente, não esqueceremos jamais. E sem dispensar um olhar holístico para uma situação tão grave, os gestores responsáveis focaram na solução desse ponto emergencial como se estivessem tentando apagar um incêndio com copos d’água.

Entretanto, na dianteira do “know-how” os principais centros de pesquisa trabalhavam ininterruptamente na busca por potenciais vacinas que pudessem conter a disseminação da pandemia o mais rápido possível. Sem apoio orçamentário do governo federal, os principais institutos de pesquisa brasileiros, Instituto Butantan e a Fiocruz, buscaram estabelecer parcerias com alguns desses centros para aquisição de vacinas com potencial transferência tecnológica para produção nacional das mesmas.

Mas diante da inação do protagonismo federal na tecitura desses acordos, as conquistas foram pequenas diante da necessidade do país. Afinal, como diz o provérbio, “quem chega primeiro bebe água limpa”. A demora na tomada de decisões no campo comercial diante de uma acirrada lei da oferta e da procura é sempre fatal. Ficamos à mercê das conjunturas internacionais, a espera no fim de uma longa fila de interessados pelas potenciais vacinas.

E quando finalmente foi dado o aval, para os únicos dois acordos firmados pelo país – Instituto Butantan / Sinovac e Fiocruz / Oxford / AstraZeneca, para uso emergencial das vacinas, a esperança se ofusca pela realidade da insuficiência de doses disponíveis até o momento, ou seja, são 6 milhões de doses da CoronaVac, parceria Butantan / Sinovac. Quanto a vacina da parceria Fiocruz / Oxford / AstraZeneca, que viria de um laboratório indiano, não tem uma previsão exata de chegada em solo brasileiro. Além disso, tanto o Butantan quanto a Fiocruz ainda aguardam a liberação de insumos para as respectivas vacinas, os quais são oriundos da China, por conta de entraves burocráticos que demandam intermediação diplomática pelo Brasil.

O que significa que não conseguiremos cumprir a totalidade do 1º grupo prioritário estabelecido para receber a 1ª dose da CoronaVac. O que instala uma nova tensão, na medida em que se permanece com a maior parte da população sem receber a 1ª dose e sem perspectiva de conseguir cumprir a 2ª dose em tempo hábil aos poucos que já foram vacinados. Portanto, o país não saiu do lugar e o vírus permanece ativo, mutante e, altamente, circulante por aí.

Esse panorama só faz apontar por uma solução cada vez mais distante no que diz respeito a uma retomada segura do cotidiano. Distante da imunização que visa prevenir os quadros mais graves, os quais demandam internações longas em Unidade de Terapia Intensiva (UTI), a população não tem outro caminho a não ser evitar as aglomerações, utilizar corretamente a máscara, higienizar frequentemente as mãos por meio de lavagem com água e sabão ou álcool em gel, se não quiser se expor a roleta russa do vírus.

Aliás, o colapso que atinge algumas cidades da região norte do país, por conta da falta de oxigênio para os pacientes internados, não resume em si a história; mas, de certa forma, é a materialização do momento para quem ainda tiver alguma dúvida sobre a gravidade da pandemia. A insuficiência acontece quando se cria um gargalo de sobrecarga no sistema de saúde, seja ele público ou privado.

Assim, se a demanda por esse produto aumentou exponencialmente em pouco tempo foi porque mais pessoas passaram a necessitar desse recurso. Muitas delas, inclusive, em atendimento domiciliar dada a impossibilidade de internação pelo esgotamento do número de leitos e equipes de saúde para atendimento hospitalar. São casos graves. Muito graves.

Por isso, a Pandemia expõe a necessidade de um comportamento coletivo no que diz respeito à prevenção. Cada indivíduo que decide romper essa “corrente do bem” só fará fortalecer a disseminação viral e a velocidade de ocorrência de mutações do agente infeccioso. Porque o vírus depende obrigatoriamente de um organismo vivo para se reproduzir. Então, sem a vacinação completa, conforme os protocolos previstos, cada um de nós permanece como potencial “bola da vez” para o Sars-Cov-2, até que a história encontre o desfecho ideal.   


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