#DefendaOsLivros
Por Alessandra Leles
Rocha
Em pesquisa do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística
(IBGE), dados divulgados em 2018 apontam para persistência do analfabetismo
para um contingente populacional de 7%, ou seja, 11,5 milhões de brasileiros que
não sabem ler e nem escrever. Para muitos essa informação pode parecer distante
das suas preocupações diárias ou, quem sabe, uma cifra pouco expressiva no âmbito
total da população. Mas, a verdade é que esses dados traduzem a ponta de um
gigantesco e complexo iceberg de
desigualdades que flutua em mares tupiniquins.
O analfabetismo é a porta de entrada para a consolidação de
uma base de trabalhadores informais e distantes, anos luz, dos direitos
constitucionais previstos na Lei Magna de 1988. Mas, na esteira deles emerge um
contingente pseudo escolarizado, popularmente denominado como analfabetos
funcionais, que foram alfabetizados, mas não letrados; o que significa que sabem
escrever e ler sem, contudo, depurar a interpretação e a criticidade contidas
no texto. O que, então, sinaliza os desafios existentes no processo de
ensino-aprendizagem nacional.
Assim, o ensino no país vai prosseguindo deficitário e constituindo
indivíduos pouco preparados tanto do ponto de vista cidadão como, também, do
ponto de vista profissional. Afinal, na conjuntura em que se estabelece a
educação brasileira em que as carências de todas as ordens se avolumam ao longo
das décadas, o reflexo natural é uma produção de alunos abaixo das expectativas,
em razão do desperdício de seu próprio potencial de aprendizagem e construção
do conhecimento.
Portanto, não é sem razão, que exista tanta dificuldade de
absorção de pessoas pelo mercado de trabalho no país. Apesar de uma taxa de desemprego atual em
torno de 13,7%, não se concentra só nas variáveis componentes da atualidade a
dificuldade de reabsorção dessa mão de obra. A questão da qualificação que
perpassa pela formação educacional é um fator que jamais pode ser excluído da
análise.
As relações laborais existentes no mundo do século XXI
demandam bem mais do que conhecimentos acadêmicos. Procuram-se candidatos que
apresentem uma visão holística do cotidiano. Sejam articulados, cooperativos, proativos,
dinâmicos,... mas, especialmente, atualizados; o que implica diretamente na
leitura, um componente educacional.
Entretanto, a leitura não é só parte integrante e integradora
da grade curricular. Ler é um requisito básico do cidadão e a ferramenta do
profissional contemporâneo. O que não significa apenas uma leitura de
manchetes, de títulos; mas, de conteúdos diversos que lhe permitam transitar
pela conectividade dos assuntos em voga. Em linhas gerais, trata-se de uma leitura a
partir da multimodalidade, ou seja, utilizando todas as formas disponíveis de
produção de linguagem – livros, jornais, revistas, sites, filmes, audiobooks, etc.
Mas, além do fato de que a realidade de muitas escolas está aquém
de oferecer esse conhecimento aos alunos, os próprios, na sua grande maioria,
não dispõem de recursos financeiros suficientes para investir autonomamente no
aprimoramento da sua formação. De modo que, suas habilidades, competências e
talentos são sumariamente negligenciados e descartados pelo próprio país;
tornando-os pretensos candidatos para funções meramente operacionais, cujos
salários os manterão dentro da já conhecida realidade das impossibilidades.
Por isso, a ideia de retomada da tributação aos livros 1 pareceu-me de um escárnio perverso em
relação à cidadania. Ainda que a Constituição Federal resguarde nas suas linhas
essa isenção de imposto, o simples fato da apresentação da proposta sob o
argumento de que “os livros são produtos de elite” é uma afrontosa reafirmação de
que a desigualdade deva permanecer prosperando secularmente no país. Nesse
sentido, todo o exposto acima também estaria fadado a prosseguir seu curso
devastador. O que se traduz, inclusive, no fato de já terem levantado a hipótese
de um corte de R$4,2 bilhões no orçamento do Ministério da Educação, para 2021.
Sem contar que tais manifestações, em síntese, só têm por
finalidade desconstruir os fundamentos instituídos constitucionalmente no país,
em relação à livre manifestação do pensamento, da atividade intelectual, artística,
científica e de comunicação, independentemente de censura ou licença (Art. 5º);
a liberdade de aprender, ensinar, pesquisar e divulgar o pensamento, a arte e o
saber (Art. 206); e, a proibição da criação de embaraço, por lei, à plena
liberdade de informação jornalística em qualquer veículo de comunicação social
e inexistência de licença de autoridade para a publicação de veículo impresso
de comunicação (Art. 220).
Mas, a Educação, os Livros e tantos outros assuntos que
permeiam a nossa formação humanística e cidadã não podem esperar, por conta das
sementes da desesperança que alguns teimam em lançar ao vento. Sendo assim, “não confundamos esperança do verbo
esperançar com esperança do verbo esperar. Violência? O que posso fazer? Espero
que termine... Desemprego? O que posso fazer? Espero que resolvam... Fome? O
que posso fazer? Espero que impeçam... Corrupção? O que posso fazer? Espero que
liquidem... Isso não é esperança, é espera. Esperançar é se levantar,
esperançar é ir atrás, esperançar é construir, esperançar é não desistir!
Esperançar é levar adiante, esperançar é juntar-se com outros para fazer de
outro modo” (Mario Sergio Cortella).