Reflexões
para um crescimento humano sem limites
Por
Alessandra Leles Rocha
Lá se vão cinquenta anos, meio século, desde que a
humanidade passou a se preocupar efetivamente com os seus próprios caminhos em
relação à sua convivência com o Meio Ambiente. Diante do mais lógico e óbvio,
um grupo de pessoas ilustres denominado Clube de Roma se
reuniu em abril de 1968 para debater os limites do crescimento humano.
A partir de modelos matemáticos desenvolvidos pelo
MIT, nos EUA, os resultados apontaram que a Terra não suportaria o crescimento
populacional, dadas as pressões geradas sobre os recursos naturais e
energéticos; bem como, os elevados níveis de poluição gerados. De modo que,
essa discussão se transformou no Relatório do Clube de Roma ou Relatório
Meadows, publicado em 1972, e que vendeu mais de 30 milhões de cópias em 30
idiomas.
Penso que foi uma demonstração científica para uma
análise de puro bom senso. Afinal, foi o crescimento humano e sua dispersão
sobre o planeta que impuseram um confronto relacional com o Meio Ambiente,
deflagrando guerra aonde só deveria haver uma coexistência pacífica.
Inicialmente por mera questão de sobrevivência; mas, com o tempo, uma questão
de empoderamento cognitivo. O desenvolvimento intelectual dos seres humanos o
conduziu à glória e, concomitantemente, à ruína lenta e gradativa.
Tanto o modo como à humanidade pautou o seu uso e
ocupação do solo, quanto as Revoluções Industriais que se seguiram a partir da
segunda metade do século XVIII são sim, fatores que explicam consistentemente
os descaminhos trilhados por nós. Em nome de valores como o status social, o
poder, o consumo, a ganância, a propriedade,... as sociedades subverteram a
própria sobrevivência. E dentro da tendência natural do crescimento humano ao
longo do tempo era certo que o impacto negativo gerado se desdobraria em
repercussões catastróficas.
Não é à toa que ano após ano, as notícias
socioambientais são cada vez mais dramáticas; apesar do Relatório
Meadows e de todos os outros, oriundos de eventos sobre Meio Ambiente
e Sustentabilidade -Conferência de Estocolmo, 1972; Rio 92; Rio +10 (em
Joanesburgo); Cúpula de Desenvolvimento Sustentável, em NY (2015) -,
que o sucederam nesses últimos cinquenta anos.
A humanidade bateu seu martelo quanto as suas
prioridades e, apesar de inúmeras discussões e debates acalorados, não se
preocupa em exercitar o bom senso quando o assunto é energia, poluição,
saneamento, saúde, ambiente, tecnologia, crescimento populacional, ou seja,
aspectos que repercutem diretamente no DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL.
Mas, deveria! Basta ver o exemplo dos oceanos. Bilhões de toneladas de lixo,
principalmente plásticos, se arrastam por meio das correntes marítimas e
alcançam os rincões mais remotos do planeta. Contribuições voluntárias de quem
não está nem aí para o mundo.
Esta não é uma discussão sobre o BEM ou sobre o Mal,
sobre o certo ou o errado. O que importa refletir e entender é que se alguns
fazem a sua parte em relação ao Desenvolvimento Sustentável outros não; mas,
qualquer que seja a parcela de prejuízo (ou eventual benefício) será
compartilhada por todos. Segundo Mahatma Gandhi, “um homem não pode
fazer o certo numa área da vida, enquanto está ocupado em fazer o errado em
outra. A vida é um todo indivisível”.
Veja, por exemplo, a epidemia de Dengue, no Brasil.
A resistência de alguns em exercitar a sua cidadania e evitar a proliferação
dos focos do mosquito não impede que este voe distâncias maiores e faça vítimas
sem distinção, prejudicando a sociedade. Tão fácil tão simples de agir; mas, as
pessoas refutam em assumir uma responsabilidade, uma pró-atividade, a qual
antes de ser com os outros é, primeiramente, com elas mesmas. Elas são o
primeiro alvo para os mosquitos, os quais não quiseram combater.
Do mesmo modo o Desenvolvimento Sustentável,
também, não é somente para alguns e, nem tampouco, é coisa de outro mundo. As
pessoas precisam entender que ninguém está pedindo para apagar a história e
renegar os avanços científicos e tecnológicos conquistados até aqui. O que se
espera é construir uma base de desenvolvimento capaz de suprir as necessidades
de todos, sem comprometimento de exaustão dos recursos naturais renováveis e
não renováveis; mas, com planejamento estratégico, soluções mitigadoras,
responsabilidade e bom senso. E isso é possível.
No entanto, tem havido uma resistência ao diálogo.
A sociedade tem trazido a discussão socioambiental para um ringue de confronto
ideológico, um acirramento tão desnecessário quanto totalmente, antiproducente;
o que é um contrassenso descomunal, visto que não há lados, ou segmentos,
quando vivemos todos sobre uma pequena e limitada esfera azul suspensa na
imensidão do espaço sideral.
Não há porque defender apenas alguns interesses,
alguns pontos de vista, em detrimento de outros. O assunto é, antes de tudo, de
interesse coletivo e não individual ou particularizado. Afinal, todos precisam
de uma água limpa para a sua sobrevivência. Ou de um ar sem poluentes, sem
particulados, sem gases tóxicos, para respirar. Ou de um solo capaz de produzir
alimentos sem a presença de contaminantes industriais ou industrializados. Ou
de áreas de matas e florestas para conter o avanço de arboviroses, tais como, o
vírus da Malária, vírus da Dengue, da Chikungunya, da Zika e da Febre Amarela.
Enfim...
Infelizmente, o fluxo das relações socioambientais
tem caminhado aceleradamente para a mercantilização. O problema é que
transformá-las em capital, automaticamente, faz o mesmo com a vida, inclusive a
humana. Ao promover quaisquer tipos de desequilíbrio ao desenvolvimento
sustentável, a humanidade coloca em risco a si mesma.
Então, imediatamente eu me recordo de uma citação
do escritor Augusto Cury que diz, “O dinheiro pode nos dar conforto e
segurança, mas ele não compra uma vida feliz. O dinheiro compra a cama, mas não
o descanso. Compra bajuladores, mas não amigos. Compra presentes para uma
mulher, mas não o seu amor. Compra o bilhete da festa, mas não a alegria. Paga
a mensalidade da escola, mas não produz a arte de pensar. Você precisa
conquistar aquilo que o dinheiro não compra. Caso contrário, será um miserável,
ainda que seja um milionário”.
A maioria das situações atuais de catástrofes,
quando analisadas ainda que superficialmente, já dá conta da presença da ação
antrópica como responsável. Nosso maior algoz não é o Meio Ambiente, não é o
Desenvolvimento Sustentável, não são as leis ou a falta delas. O nosso maior
algoz somos nós, seres humanos de carne e osso com a nossa genuína
cupidez 1. Desqualificar as ciências, os estudos
socioambientais, os grandes e renomados pesquisadores, nada disso muda o curso
da história, nada disso impede de a vida sucumbir à destruição.
Se prosseguirmos nessa direção, obstinados e
imprevidentes, arrogantes e enceguecidos, nossa sina será materializar em breve
as palavras de Carlos Drummond de Andrade, no poema O Homem e as
Viagens 2, publicado no livro As impurezas
do Branco, de 1973; ou seja, nos faltará lugar para fincar pé na imensidão
incomensurável do céu.
1 Ambição, geralmente, por
propriedades e/ou bens materiais; desejo excessivo por riquezas; cobiça que faz
abandonar os principais valores morais.