Natal…
Por Alessandra Leles Rocha
Então é Natal… O ano passou na
velocidade da luz e já nos preparamos para seu findar. Foram dias intensos sob uma atmosfera de tensão
jamais imaginada. Tudo muito instável, muito difícil, muito angustiante. O desequilíbrio
entre boas e más notícias faz com que as últimas prevaleçam e estremeçam nossas
esperanças.
Mas, aqui estamos. Dezembro é o mês de
se fazer um balanço da vida. Hora de se despir das fantasias e adereços e cair
em si sobre o que é realmente essencial. Independente de qual seja a sua fé, o
próprio sentimento de agregação familiar que o período propõe desperta para
grandes reflexões.
Depois de tanta luta, tanta guerra,
tanto conflito, consigo e com o mundo, corpo e alma pedem um pouco de alento e
percebem a necessidade de se melhorar, de evoluir. De repente, passamos a
enxergar as picuinhas do cotidiano na exata dimensão que elas têm. Passamos a reavaliar
nossas prioridades. Estabelecemos novos compromissos.
Quando nos dispomos a abdicar das aparências,
das máscaras, dos protocolos, nossos olhos passam realmente a enxergar. Enxergar
a si, a vida, ao outro. A visão pode não ser tão bela, tão aprazível; mas,
mesmo nas piores imagens, descobrimos que é possível aprender, agregar
conhecimento e redimensionar os próprios valores.
Sabe, ninguém é 100% certo nem 100%
errado. Somos um pouco de tudo, de defeitos e de virtudes. Somos humanos e é
nessa condição que precisamos trabalhar em busca de uma evolução consciente e
consistente por uma coexistência melhor. Isso se chama fraternidade e tem um
efeito transformador indizível.
Entendemos, então, o real significado
da troca de presentes. O gesto de presentear significa oferecer a alguém algo
que possa torná-lo (a) essencialmente feliz. Nem sempre essa gota de felicidade
está relacionada com algo material. Há muitas formas de presente, pois há
muitas demandas pelo ser humano. Talvez, a mais significativa entre todas, em
nosso tempo, seja simplesmente perceber a presença do outro.
Não, isso não é bobagem. Temos nos
tratado uns aos outros como seres invisíveis. Quando muito, e para alguns
poucos, temos dispensado migalhas de tecnologia e só. Nessa invisibilidade
temos tecido uma solidão coletiva que se não mata, fere como um punhal. Afinal de
contas, na contramão desse processo, contrariando o discurso do invisível, todo
indivíduo quer pertencer, ser aceito, ser amado, ser lembrado.
Segundo José Saramago, em Ensaio sobre a Cegueira, “Fizemos
dos olhos uma espécie de espelhos virados para dentro, com o resultado, muitas
vezes, de mostrarem eles sem reserva o que estávamos tratando de negar com a
boca”. Por isso, você pode comprar milhões de presentes que conseguem até extrair alguns sorrisos e agradecimentos; mas, nada se compara a um gesto de reconhecimento da presença do outro.
Olhos nos olhos. Um abraço que toca os
corações. Um aperto de mãos intenso. Uma palavra que conforta. Enfim... Basta
pensar que há situações na vida em que presentes materiais não seriam capazes
de alterá-las e, nem tampouco, fazer aflorar uma felicidade genuína.
Ao retirarmos os outros da invisibilidade,
também nos tornamos visíveis. E isso é verdadeiramente fortalecedor na construção
de uma sociedade mais justa, mais solidária, mais criativa, mais inovadora. Sonhos
começam a ser compartilhados. Diferenças começam a se somar em torno de um propósito
comum. E o respeito passa a ser diretriz de todas as ações.
Esse é o verdadeiro Natal! Que não dura
apenas uma noite. Que não acalenta a alma apenas por algumas horas. Que não se
restringe a uns poucos. Que está ao alcance das
mãos, dos olhos, do coração.