sábado, 24 de setembro de 2016

Religião e cultura não podem justificar negação dos direitos de pessoas LGBT, diz Ban Ki-moon


‘Não há lugar no século XXI para a discriminação com base na orientação sexual ou na identidade de gênero’, afirmou o secretário-geral da ONU, Ban Ki-moon, em evento paralelo à 71ª sessão da Assembleia Geral. Encontro reuniu chefes de Estado, vice-presidentes e primeiros-ministros.
“Não há lugar no século XXI para a discriminação com base na orientação sexual ou na identidade de gênero (das vítimas)”. A mensagem é do secretário-geral da ONU, Ban Ki-moon, que convocou a comunidade internacional na quarta-feira (22) a lutar pelo igualdade de direitos para o público LGBT.
Em evento que reuniu presidentes, vices e primeiros-ministros paralelamente à 71ª sessão da Assembleia Geral, o dirigente máximo das Nações Unidas criticou países que “nadam contra a maré da história” ao adotarem novas punições ainda mais desmedidas a indivíduos que são gays ou que apenas falam sobre ser gay.
Em ao menos 76 países, leis criminalizam relacionamentos privados e consensuais entre pessoas do mesmo sexo, expondo milhões de indivíduos a riscos de detenção, inquérito penal. Em ao menos cinco Estados, a homoafetividade pode ser condenada com pena de morte.
Chamado “Path2Equality” (Caminho para a Igualdade, em tradução livre), o encontro na sede da ONU, em Nova York, marcou a primeira vez em que líderes mundiais participaram de uma reunião do grupo de trabalho das Nações Unidas sobre LGBTs.

A sua religião ou cultura é tão fraca
que a única maneira pela qual vocês
podem sustentá-la é
a negação dos direitos básicos dos outros?

Lésbicas, gays, bissexuais, pessoas trans e intersex enfrentam também preconceito e violência das próprias sociedades onde estão inseridos.
“Os fatos são perturbadores. A cada ano, centenas são mortos, milhares são gravemente feridos e milhões vivem suas vidas na sombra da discriminação e da reprovação. Isso é um ultraje”, condenou Ban, que lembrou ainda que muitos Estados se recusam a reconhecer abusos contra as vítimas. O secretário-geral da ONU criticou duramente ideias utilizadas para justificar a violência contra LGBTs.
“Eu pergunto àqueles que usam argumentos culturais ou religiosos para privar pessoas LGBT dos seus direitos humanos: o que vocês ganham por tornar os outros menos iguais? A sua religião ou cultura é tão fraca que a única maneira pela qual vocês podem sustentá-la é a negação dos direitos básicos dos outros?”
Ban lembrou que ele mesmo não conhecia muito bem os desafios enfrentados por esse público quando assumiu o posto de chefe da ONU, mas aprendeu ouvindo as vítimas. “Todos os que não compreendem devem escutar de perto”, afirmou.
O secretário-geral expressou ainda uma preocupação particular com crianças e jovens que sofrem bullying e, muitas vezes, são expulsos de casa e forçados a viver nas ruas.
Apesar dos desafios, o dirigente da ONU destacou conquistas recentes. Quase 40 países já reconhecem legalmente relacionamentos entre pessoas do mesmo sexo. Outras nações têm buscado medidas para facilitar o reconhecimento formal do gênero de indivíduos trans. Ao longo do ano passado, mais três países abandonaram sanções criminais contra LGBTs — Nauru, Moçambique e Seicheles.
Ban Ki-moon lembrou ainda da decisão do Conselho de Direitos Humanos nesse ano de indicar, pela primeira vez, um especialista independente para investigar violações perpetradas contra gays, lésbicas, bissexuais e pessoas trans. Ainda em 2016, em outubro, o Escritório de Direitos Humanos deve conduzir uma pesquisa sobre mais de 200 iniciativas em 65 países voltadas para o proteção desse público.

Causa LGBT tem um preço político

Ban alertou que o trabalho desenvolvido ao longo de seus dez anos de mandato em prol dos LGBTs não deve ser abandonado pelo próximo secretário-geral. “A ONU está comprometida a agir”, ressaltou.
“O grupo de trabalho sobre LGBTs é nosso grande aliado, mas nós temos muito adversários. Há um preço político por se manifestar, um preço que eu tenho orgulho de pagar”, disse o chefe da ONU, que lembrou da resistência que enfrentou de alguns países quando aprovou medidas administrativas que garantiam para casais gays de funcionários os mesmos salários e auxílios dados pelas Nações Unidas a casais heterossexuais.
Lembrando que os progressos foram conquistados com muita luta, o secretário-geral lamentou que ativistas tenham pagado preços ainda mais altos e reafirmou seu compromisso com a causa. “Eu sempre vou lutar pela igualdade dos membros LGBT da nossa família humana”, garantiu.