segunda-feira, 23 de maio de 2016

Reflita: Qual é o preço da vulnerabilidade?


Vulneráveis

 

Por Alessandra Leles Rocha

 

Em um primeiro momento podemos pensar: estamos cada vez mais vulneráveis. Mas, com um pouco mais de reflexão descobrimos que, na maioria do tempo, nós nos colocamos em um nível de vulnerabilidade inquestionável. Deslizando entre os limites da liberdade e da segurança, o mundo pós-moderno tem se deixado atrair pelos encantos da nova Era; sobretudo, a tecnologia, e se esquecido de pensar sobre os meandros dessa dinâmica social.  

Pois bem. Observando atentamente, aqui e ali, conseguimos destacar traços da humanidade que nos fazem questionar se de fato o Homo sapiens é verdadeiramente bom. São muitos os exemplos de atitudes nada altruístas, nada fraternas, com seus pares. Há muito egoísmo, muita vaidade, muita necessidade em se sentir superior, poderoso, imbatível.

E cientes desses perfis contrários ao senso humano e coletivo, porque não dizer patológicos, ideias são lentamente aspergidas no intuito de serem absorvidas e impregnadas a esses valores já distorcidos. Há uma tentativa obscura de manipulação de pensamentos e atitudes, que diferentemente de comportamentos cristalinos e genuinamente radicais e agressivos, fazem suas vítimas através da inação racional.

Lentamente a humanidade se robotiza e se deixa guiar pelos apelos do mundo. Seja assim, vista isso, compre aquilo, siga tal pensamento,... de modo que seja possível enquadrá-lo dentro de um determinado grupo. Indiscutivelmente o século XXI se apresenta pela diversidade de tribos que surgem a partir dessa tentativa de pertencimento humano. Ser humano já não nos basta; é preciso estar conectado aos demais além das afinidades biológicas.  

O materialismo tomou conta das relações e deteriorou as identidades. Há uma imensa dificuldade em se estabelecer na própria essência e, por isso, personagens e mais personagens surgem em nome de uma sobrevivência; como se a seleção natural fosse agora determinada pelas aparências.  Tudo isso inicia o travamento de uma luta desgastante e cruel, que dissolve a nossa imagem diante do espelho; os indivíduos passam a ser o que eles acreditam que os outros pensam e enxergam deles. Não é à toa, então, a ferocidade com que disputam os seus ‘quinze minutos de fama’.

De fato, a sociedade vive um apartar entre o real e o imaginário. O excesso de visibilidade que se tem através da tecnologia da informação não traduz algo real. Compartilha-se tudo, exceto a sua própria humanidade, os seus defeitos, as suas ideias, os seus desejos, os seus fracassos, enfim. Vive-se uma vida pelo prisma de lentes cor-de-rosa; mas, quem disse que a idealização é uma boa solução contra os problemas? Quando se deita a cabeça no travesseiro, o inconsciente não te deixa dormir; afinal de contas, cada um sabe muito bem aonde lhe apertam os sapatos.

No fundo a humanidade tem sobrevivido de uma ‘propaganda enganosa’ de si mesma. Um trágico complexo de ser ‘politicamente correta’, quando na verdade arde dentro do espírito às chamas mais altas do seu primitivismo, da sua barbárie. Por isso, quando alguém se mostra real há imediatamente um desconforto entre os demais; pois, eles se sentem agredidos pela verdade que destrói a sua imaginação. Quanto mais fomentamos a ilusão, a perfeição; mais, nos colocamos em risco se em um dado momento a verdade vem à tona.

O mundo pós-moderno não ama a diferença seja ela qual for; ao contrário, a competitividade que se acirra está centrada na manutenção da massificação. Todos precisam moldar-se a figura uns dos outros em termos físicos, financeiros, materiais, ideológicos, comportamentais; a disputa é essa.  E isso acontece em todos os níveis de relação social, ou seja, em casa, na escola, no trabalho, no lazer, na religião. Daí, a imensa dificuldade de resolver os desdobramentos que emergem desses comportamentos, como por exemplo, o bullying, o revanchismo, a violência moral. Olhe ao redor e perceba como resultado, a humanidade se encontra cada vez mais doente física e emocionalmente.
Portanto, quem sabe a nossa proteção contra tamanha vulnerabilidade, ou a cura para as nossas mazelas mais profundas, não se inicie pelo passo dado em direção a sermos fieis a nós mesmos, hein? Pense nisso.