quinta-feira, 24 de março de 2016

Nesta Páscoa...


Nesta Páscoa...

 

Por Alessandra Leles Rocha

 

“Fica sempre, um pouco de perfume
nas mãos que oferecem rosas
nas mãos que sabem ser generosas

Dar do pouco que se tem
ao que tem menos ainda
enriquece o doador,
faz sua alma ainda mais linda

Dar ao próximo alegria,
parece coisa tão singela
aos olhos de Deus, porém,
é das artes a mais bela”.

(Alberto Costa)

 

Diz o provérbio que “há males que vem para o bem”. De fato, com o preço dos ovos de chocolate um absurdo, quem sabe agora consigamos entender a Páscoa acima dos significados mundanos. Seja na compreensão da ressurreição, ou de uma passagem, a verdade é que este período nos fornece elementos para uma profunda reflexão sobre o papel humano que representamos no mundo.

Ninguém duvida que viver nunca foi e nunca será um exercício fácil e simples. Circunstancialmente, ou por opção, a verdade é que no computar dos erros e dos acertos, a segunda opção parece escolher sempre o rol da exceção.   É uma ‘pisada na bola’ aqui outra ali e, de repente, os estragos são feitos e os reparos difíceis, ou impossíveis, de corrigir.

Mas, desatenções à parte, o fato é que a realidade contemporânea nos coloca ainda mais à prova, em tempo integral. As ‘facilidades’ tecnológicas, por exemplo, que idealizaram o futuro da sociedade, infelizmente, não tem chegado com a capacidade de traduzir apenas conforto, bem-estar e alegria.  De certo modo, foram sucumbidas pela fugacidade, pelo imediatismo, por uma pressa descabida que acelera o corpo, a alma e as relações sociais. Nossa aparente liberdade é ditada pelos ponteiros dos relógios, pelas máquinas. E tentando ‘ganhar tempo’ fomos nos afastando de nós e do mundo, virtualizando a realidade, como se isso não fosse trazer nenhum tipo de prejuízo.  

Porém, as consequências são cada vez mais preocupantes; inclusive, o fato do ser humano estar adoecendo o espírito. Com o distanciamento de suas raízes biologicamente humanas, ele tem se tornado vulnerável diante de tão brutais rupturas existenciais. Sua gênese que buscava conviver, coexistir com seus pares e com o mundo, desfrutando de todos os processos relacionais possíveis - o que inclui dizer os sentimentos, as emoções -, agora está cada vez mais só. A ideia original era ser capaz de tornar os dias um banquete, no qual se senta entre amigos, sem a menor pressa de se retirar. Mas...

O que assistimos todos os dias são exemplos de um processo de empedernimento, como se o sangue a correr pelas veias dos viventes tivesse sido congelado por uma atmosfera tóxica e cruel; o qual, lentamente, vai dominando os sentidos dos seres humanos. Uma inversão de valores e princípios começa a ganhar corpo, sobretudo, na concepção de apartar uns dos outros; em uma falta de compadecimento diante das mazelas do mundo, que chega a assustar.

Por tudo isso é que precisamos nos render aos princípios pascais. Parar, mesmo que por um breve período, e nos permitir mergulhar no mais profundo do nosso ser, onde somente a nossa própria voz possa ser escutada. Afinal, não há no mundo quem jamais tenha se desviado do caminho, em nome do pertencimento e da aceitação alheios, sucumbindo sem enfrentamento à força intimidadora dos apelos, das tentações e das pressões do mundo. De seres humanos passamos a ser ‘arrastadores de correntes’, sem imagem, sem sonhos; como se tivéssemos perdido o fio de nossa meada e nos tornado meras cópias desfiguradas de nós mesmos.

Então, não há outra coisa a fazer, senão, tentar renascer.  Permitir-se atravessar pelo caminho de volta as origens. Despir-se de tudo o que não nos faz nenhum sentido e, ao contrário, só nos imputa sofrimento e dor. E para nascer, assim como renascer, é fundamental a presença de outro ser humano generosamente disposto a nos acolher, nos aceitar. A Páscoa nos coloca, portanto, unidos diante das nossas insignificâncias humanas para que possamos redimir nossos erros e imperfeições, para ampliarmos nossa tolerância e fraternidade em prol do mundo, o qual todos fazemos parte.

Assim, independente de qual seja a sua convicção religiosa, lembre-se dessas palavras de Madre Teresa de Calcutá: “Dê ao mundo o melhor de você. Mas isso pode não ser o bastante. Dê o melhor de você assim mesmo. Veja você que, no final das contas, é tudo entre VOCÊ e DEUS. Nunca foi entre você e os outros”. Que sua Páscoa tenha, então, a doçura que você jamais experimentou.