Se ainda nos resta uma única
gota...
Por Alessandra Leles Rocha
Lá se vão quarenta e quatro (44) anos
desde o Clube de Roma 1, o
primeiro encontro realmente voltado para o debate sobre o Meio Ambiente e
Desenvolvimento Sustentável, e que descortinou o cenário adiante: Estocolmo
(1972) 2, Rio de Janeiro (1992) 3, Johanesburgo (2002) 4 e, agora, a Rio+20 5.
Ainda que milhares de cidadãos não estejam lá, presentes e sentados às mesas de
discussão e negociação, cada um no silêncio de sua alma precisa refletir
profundamente, pois não se trata de alarmismo ou demagogia, só haverá futuro e
vida se algo for transformado imediatamente.
Discutir sobre o Meio Ambiente é antes
de tudo encarar os desafios de frente. No caso do lixo, por exemplo, não há
solução final, pois o mesmo não para de ser produzido e cada vez mais se torna
diversificado em constituição. O assunto deve ser tratado, portanto, do ponto
de vista de gestão sistematizada e integrada. Consideradas vilãs pelos ambientalistas,
as sacolinhas plásticas, por exemplo, já estão sendo proibidas através de
legislações estaduais, em várias partes do Brasil; mas, continuamos a consumir
na aquisição de um único produto diversos tipos de embalagens e no
acondicionamento dos resíduos domésticos, senão usamos mais as tais sacolinhas,
utilizamos os sacos próprios para lixo, pois não havemos de fazer o descarte de
qualquer jeito, inclusive propiciando o aparecimento de insetos transmissores
de doenças e animais peçonhentos atraídos pela farta oferta de água, abrigo e
alimento. E diariamente vemos surgir diante dos olhos nossa pequena porção de
lixo – plásticos, papeis, vidros, metais, pilhas, baterias, entulho
etc.etc.etc. -, a qual o poder público há de pensar o que fazer com ela!
Mas os espaços geográficos parecem
encolher diante do crescimento vertiginoso das necessidades humanas. Além de um
lugar para descartar os resíduos, precisa-se de milhares de outros para alocar
a população, as escolas, os hospitais, as indústrias, o comércio, as áreas de
lazer e cultura,... e, então, de repente se entende de uma vez por todas que a
grande esfera é limitada! Que os resíduos a serem geridos não são produzidos
apenas no contexto doméstico de cada lar; mas, de um universo de outras
atividades. Que qualquer lugar para descartar também não serve como solução,
porque pode interferir na qualidade dos cursos d’água e já sabemos que esse
líquido precioso está em falta para atender o imenso contingente populacional
do planeta; seja pela seca, pelo desmatamento das nascentes e margens dos
cursos d’água, pelo assoreamento ou pela poluição em todas as suas faces. Mais
de sete bilhões de vidas que precisam de água para matar a sede, para suprir as
necessidades de higiene, para utilizar na preparação dos alimentos, para irrigar
as produções agrícolas e manter vivos os animais para o abate, para a
construção civil, para os hospitais, para as escolas, para...
A revolução industrial acionou o gatilho
do progresso e do desenvolvimento tecnológico no planeta, só se esqueceu de
pensá-los intimamente correlacionados ao fluxo dinâmico da existência humana. A
mesma mão que ofereceu o infinito de possibilidades retirou gradativamente a
qualidade e a garantia da sobrevivência humana. Ocupamos espaços sem análise ou
critério, dilapidamos os recursos naturais sem a devida observação óbvia de sua
finitude, promovemos a proliferação e a disseminação de doenças pelo mau uso
dos recursos, desenvolvemos toneladas de resíduos e inutilidades pela falta de
consciência frente ao consumo,... empregamos mal o nosso conhecimento a ponto
de sacrificar sem pudores o Meio Ambiente.
Depois de tantas conferencias,
seminários, encontros, jornadas para tratar dessas questões e os relatórios
parecerem inertes dentro das gavetas, a esperança teme minguar. Destruir o
planeta significa exatamente destruir a própria casa. Sem uma casa para voltar
no fim do dia, qual seria o significado do trabalho, da acumulação de bens e
riquezas, da classificação social? Vejamos a árdua luta dos diversos grupos de
refugiados em prol de um espaço territorial que lhes permita uma moradia digna
para resgatar sua cidadania, seus valores e sua cultura. É a casa que abriga
nossos sonhos, que nos protege das adversidades, que guarda as nossas memórias,
que emoldura o nascer de novos dias. Nem a semana do Meio Ambiente, nem a
Rio+20, nem qualquer outro momento estão pondo em discussão banalidades ou
declarações apaixonadas e inflamadas de pessoas meramente idealistas; o que
está sobre a mesa de negociações é um ultimato, são todos os atestados de que o
amanhã de algumas décadas a mais pode jamais se tornar realidade e que o modelo
vigente já é o retrato do grande fracasso humano. Arregaçar as mangas e agir é
o que nos cabe fazer se ainda nos resta uma única gota do instinto animal de
sobrevivência.