O uso das palavras
Por Alessandra Leles Rocha
E como fala o ser humano! Se aproveitasse bem o uso das palavras o mundo, certamente, estaria muito melhor! Com a primeira década de dois mil se despedindo, nada mais conveniente sobre refletir frente ao palavrório dispersado e desperdiçado por cada um de nós até então; para quem sabe, começar dois mil e onze expressando vocábulos mais edificantes, mais sinceros, mais profundos, mais éticos, mais fraternos.
Há tempos que o trivial da comunicação no contexto de uma boa convivência social desapareceu. Palavras mágicas acompanhadas da parceria inconfundível das boas maneiras foram postas de lado em nome de uma modernidade, que de fato é simplesmente indelicadeza e falta de educação. “Com licença”, “Por favor”, “Muito obrigado”, “Bom dia”, “Me desculpe”, etc.etc.etc. não dispõem de prazo de validade, são atemporais, são reflexos dourados da racionalidade humana, da capacidade indiscutível de bem viver com os semelhantes; nada de tempo, de modismo, de estilo.
Pena, que ao abrir a exceção para elas, outras tantas palavras alçaram voo pela imensidão e deixaram mais pobre a alma humana. Transformaram a eloquência em espécie vulgar de padrão simplório e altamente restrito; linguagem corruptora da beleza da língua pátria versada na despretensão da pressa tecnológica em ser mais do que agente comunicador. Tudo deve ser prático, objetivo, sem requintes de detalhes, um pingo de fato deve significar algo para essa gente tão assoberbada!
E de tanto restringir, aprender a nos expressar em cento e quarenta toques, abusar dos símbolos e das imagens, amordaçamos a mente e a alma. Qual não é a queixa de milhões de seres humanos quando o assunto é falar? Falar sozinho, em casa, com amigos, no trabalho, na rua, com o papel... simplesmente falar, tornou-se uma barreira intransponível, um silêncio eloquente que cria abismos e lacunas entre as pessoas; sobretudo, porque quando o assunto é sério, profundo, envolve sentimentos, o falar exige submergir além da camada superficial.
Falamos pelos cotovelos tudo o que não afeta diretamente quebrar a blindagem que nos protege; mas, nos emudecemos quando o assunto é revelar quem somos, o que pensamos, o que queremos, o que planejamos, o que guarda a nossa própria alma imperfeita. Por isso, o mundo tem encontrado tanta dificuldade em falar da saudade, do amor, da amizade, da paixão, da igualdade, da liberdade, da fraternidade,... da vida com a verdade que ela anseia tanto por escutar. E dizer com verdade, não significa açucarar as palavras e mostrar seu lado mais bonito; dizer com verdade é encarar, com tudo de bom, ruim ou mais ou menos que o pacote contenha, mas libertar-se dos pesos e sentir a leveza mais fantástica dos sentidos.
Assim, quando os relógios badalarem por doze vezes na passagem de trinta e um de dezembro para primeiro de janeiro do novo ano, que o mundo ecoe todas as palavras capazes de simbolizar o belo, o justo e o sagrado para a humanidade; tecendo delicadamente uma aura de paz, de amor, de justiça sobre os homens. Ao longo de todo o novo ano, sejamos mais prudentes e sensatos ao fazer uso das palavras, pois uma vez pronunciadas elas se perdem no vento e sobre elas não temos mais controle. Portanto, dialogar sempre, esse é o princípio das relações sociais; mas, fazê-lo com sabedoria e discernimento para que todos os dias venham coroados de grandes e profícuas realizações à humanidade.