Para
pensar...
Por
Alessandra Leles Rocha
Infelizmente, a tendência acaba
sendo sempre não contar com o imponderável da vida. Como se absolutamente nada
pudesse dar errado, ou fugir dos planos, ou apresentar mudanças de última hora.
É por isso que as tragédias costumam ter esse componente de anunciação prévia,
algum sinal de alerta, por mínimo que seja, mas suficientemente capaz de fazer
pensar, de causar algum desconforto, alguma tensão no ar. Dessa vez, era a
estação chuvosa do verão brasileiro manifesta com muito mais rigor, muito mais
extremismo em diversas regiões do país, incluindo Minas Gerais.
Então, considerando a maneira
como as intempéries têm arrasado o cotidiano brasileiro, era preciso mais
cautela, mais previdência, em transitar por lugares naturalmente expostos as
ações do clima. Os ventos, as chuvas e os movimentos das águas, sejam elas
fluviais ou marítimas, são instrumentos da natureza poderosíssimos para o
processo erosivo dos relevos. Lapidando dia a dia, vão fraturando os terrenos e
reduzindo os agregados a fragmentos de diferentes formas e tamanhos que podem
se despregar do todo a qualquer momento.
Há pouco mais de um ano, uma
família morreu no litoral do Rio Grande do Norte depois que uma falésia, um
tipo de paredão íngreme encontrado em regiões litorâneas, desabou sobre eles. O
que aponta para a necessidade de criação de um protocolo de orientação turística,
o qual não só prepare adequadamente os guias; mas, sobretudo, os turistas que buscam
visitar locais susceptíveis a esse tipo de ocorrência. Especialmente, porque o
Brasil é um país pródigo de belezas naturais que tendem a ser exploradas para o
turismo, tanto em regiões de grande porte quanto de médio e pequeno porte.
Mas, se engana quem pensa que as tragédias
rondam apenas os espaços geográficos naturais. Não. A experiência do ocorrido
na boate Kiss, em Santa Maria/RS, em 2013, trouxe à tona uma discussão sobre os
protocolos de segurança, também, nos espaços de lazer e entretenimento urbanos,
no Brasil. Nesse episódio foram 242 vidas perdidas e um total de 636 feridos, por
conta de uma sucessão de erros cometidos, os quais desencadearam um incêndio em
um local desprovido de saída de emergência adequada. A desatenção, a
despreocupação em relação aos mínimos detalhes mostrou como a fatalidade pode ser
avassaladora em um piscar de olhos, em qualquer lugar.
Vê-se, então, que a necessidade
da precaução, da prevenção, não é mimimi. A vida humana é muito frágil. Pena que
nem sempre ela é colocada no topo da lista das prioridades. Quantos naufrágios de
barcos, em rios e no mar, por exemplo, já comoveram o Brasil? Embarcações
lotadas e com excesso de peso já deram origem a tragédias horríveis, como a do
Bateau Mouche IV, no Réveillon de 1988/1989, na Baía de Guanabara, no Rio de
Janeiro. É como se houvesse se transformado em praxe a crença de que tudo vai
dar certo, por se acreditar de olhos fechados no profissionalismo dos
prestadores de serviço e na existência de leis e regulamentações, que sustentam
os contratos do setor de turismo, entretenimento e lazer.
Até que, de repente... se
descobre que tudo isso só vale até a página dois da história. Quando as tragédias
acontecem é que se percebe o tamanho dos desdobramentos e das consequências que
estavam invisíveis nas entrelinhas, invisibilizadas de certa forma pelas
expectativas e ansiedades fomentadas pelo espírito lúdico da diversão. Toda a
alegria, então, se transfigura pelo peso da responsabilidade, das medidas a
serem tomadas, do sofrimento, da dor, do desalento, ... de um misto de emoções
e sentimentos difíceis de serem contabilizados, processados e digeridos. Quanta
vontade de voltar no tempo, de mudar os planos, de postergar as ações, de
permanecer quieto no lugar. Mas, não é possível.
Talvez seja por isso que o provérbio
nos avisa: “Prevenir é melhor que remediar!
”. Eu responsável por você, que é responsável pelo fulano, que é responsável
pelo beltrano, que é responsável pelo sicrano, ... faz cair a ficha e admitir o
nível de corresponsabilidade que nos cerca. Por isso não dá para ser
displicente, irresponsável, ingênuo ou crédulo, quando lidamos com vidas. Divertir,
desanuviar a mente, espairecer, nunca foi tão fundamental, como agora, em
tempos Pandêmicos; pois, não é só o corpo que precisa de cuidados, a mente e a alma
também precisam.
Justamente por essa razão é que não podemos fazer desses momentos um estopim de mais tormentas, de mais aflições. Esse é um momento de ponderar os prós e os contras, de avaliar, de refletir passo a passo as escolhas, as decisões. Porque, apesar dos pesares, a contemporaneidade ainda não nos fez perder por completo os sentidos, as percepções, na hora de ler e entender os sinais que a vida dá. Afinal, de um jeito ou de outro, reluz das experiências ruins do cotidiano o aviso de que “para aproveitarmos a liberdade temos que nos controlar” (Virginia Woolf – escritora inglesa).