Sub.
Super. Gramática versus Ciência
Por
Alessandra Leles Rocha
Não, não é uma mera questão de qual prefixo empregar. Querem convencer a sociedade de que há SUPERnotificação nas estatísticas da Pandemia, no Brasil. Que o
assombroso número de vidas perdidas, a partir de março de 2020, não se
restringe a disseminação impiedosa do Sars-Cov-2; mas, de um viés que tenta
inquietar a população com fins políticos.
Bom, ensina a história, que as
grandes tragédias da humanidade só conseguiram estimar seus números, com mais
fidedignidade, depois dos processos efetivamente concluídos.
Números dessa natureza nunca são
cravados com exatidão, porque por trás dos fatos aparentes há uma infinidade de
incógnitas que interferem diretamente na dinâmica dessa apuração. De modo que é
muito mais plausível, no fim das contas, que os dados estejam SUBestimados do que o contrário.
O mundo tem sido aprendiz da
COVID-19, o que significa uma construção de conhecimentos intensa e
ininterrupta. Foram necessários alguns meses de vivência e observação do
processo pandêmico, para que as primeiras informações pudessem começar a ser
interpretadas cientificamente a partir dos resultados apurados e compartilhados
no cenário mundial.
E, um tanto quanto óbvio, foi
debruçar os esforços para a análise dos parâmetros da manifestação aguda da
doença a fim de delinear as melhores estratégias de tratamento. Era fundamental
perceber como reagiam os pacientes aos efeitos do vírus no organismo e as
demandas terapêuticas que esses impunham em cada nível da patologia, ou seja, assintomático,
leve, grave e gravíssimo.
À medida em que esses panoramas
foram sendo elucidados, numa ampla perspectiva de análise ao redor do planeta,
a possibilidade de inclusão de estudos sobre os efeitos Pós-COVID no organismo
humano foi se consolidando. No campo respiratório, os relatos têm descrito que
em pacientes, cujos quadros foram moderados, apresentaram cansaço e falta de
ar, mesmo passados alguns meses da alta médica. Em casos mais graves, foram
relatadas sequelas permanentes, como a fibrose pulmonar.
Em relação ao coração e aos rins,
dentre as sequelas encontradas destacam-se a miocardite, a arritmia cardíaca, o
choque cardiogênico, a isquemia, a proteinúria, a hematúria e a insuficiência
renal aguda, respectivamente. No cérebro, os sintomas descritos vão desde
confusão mental e dificuldade cognitiva até delírios. Quanto ao sistema
vascular, os pacientes mais graves tendem a desenvolver acidentes vasculares
cerebrais (AVCs), trombose e embolia pulmonar.
Mas, além de todas essas
manifestações, os acometidos pela COVID-19 também tiveram sequelas no fígado,
pâncreas, intestino e pele.
Considerando uma baixíssima
testagem da COVID-19, no Brasil, associada a todas essas informações, coletadas
ao longo dos meses de Pandemia, e as condições biológicas de cada organismo
antes, durante e depois da infecção pelo vírus, muitos indivíduos, especialmente
assintomáticos, podem ter morrido depois da doença, sem saber a causa exata do
falecimento.
É possível que essas mortes não
tenham sido determinadas, na ocasião, como decorrência da COVID-19; mas, a
partir de alguma dessas manifestações, que são comuns também a outras doenças. Por
exemplo, o infarto, a embolia pulmonar, a insuficiência renal ou a insuficiência
respiratória. Isso porque não sabemos se as pessoas falecidas tiveram ou não
contato com o Sras-Cov-2.
Portanto, a tendência de uma SUBnotificação é plausível. Tendo em
vista que não é possível testar esses casos, a partir de eventuais amostras
biológicas dos pacientes falecidos. Seria necessário, então, comparar o
histórico de óbitos, em cada localidade, decorrentes desses achados clínicos
para mensurar uma possível ascensão estatística abrupta. Como foi relatado a
respeito da Síndrome Respiratória Aguda Grave, que demonstrou um crescimento numérico
de casos, muito acentuado, ao longo da Pandemia.
O simples fato das mortes, cientificamente
atribuídas ao COVID-19, terem ultrapassado mais de 470 mil, já é razão
suficiente para compreendermos a gravidade da situação. Porque, embora as
vacinas tenham sido desenvolvidas em tempo recorde, a sua distribuição tem
ocorrido de maneira insatisfatória e insuficiente, o que potencializa a
disseminação e a ocorrência da doença entre a população. Todos os dias o país continua
perdendo mais de 1000 pessoas.
Portanto, não há alarmismo. Todas
as narrativas que transitam nesse sentido são insanas e desnecessárias. Há um
fato concreto que precisa ser resolvido de maneira eficiente e rápida. Cada
país precisa fazer sua parte nesse processo ou o mundo persistirá por muito
tempo com o vírus circulante e causando problemas à população.
Então, “Perguntar de que morreu
alguém é estúpido, com o tempo a causa esquece, só uma palavra fica, MORREU”
(José Saramago – Ensaio sobre a Cegueira). Afinal de contas, o mundo já perdeu só
para a COVID-19 mais de 3,75 milhões de seres humanos, ou seja, uma estatística
que supera os dados de quaisquer outras
conjunturas ou das grandes guerras já ocorridas. O que demonstra que devemos
temer os inimigos biológicos invisíveis, muito mais do que as estatísticas em
si, porque eles sim, são muito mais poderosos do que se poderia imaginar.