A Organização Pan-Americana da Saúde/Organização Mundial da Saúde (OPAS/OMS) no Brasil promoveu na quinta-feira (16), em Brasília (DF), um seminário sobre ações voltadas à mobilidade sustentável nas cidades brasileiras. No evento, os participantes discutiram modelos, experiências e evidências capazes de fortalecer políticas e medidas para a melhoria dos desenhos urbanos.
A Organização Pan-Americana da Saúde/Organização Mundial da Saúde (OPAS/OMS) no Brasil promoveu na quinta-feira (16), em Brasília (DF), um seminário sobre ações voltadas à mobilidade sustentável nas cidades brasileiras. No evento, os participantes discutiram modelos, experiências e evidências capazes de fortalecer políticas e medidas para a melhoria dos desenhos urbanos.
A coordenadora da Unidade de Determinantes da Saúde, Doenças Crônicas Não Transmissíveis e Saúde Mental da OPAS/OMS no Brasil, Katia Campos, citou a relevância do Projeto Vida no Trânsito – iniciativa lançada em 2010 pelo Ministério da Saúde – para uma transformação dos espaços urbanos no país. “O projeto, que começou com a Iniciativa Bloomberg para Segurança Global no Trânsito, é hoje reconhecido internacionalmente como um programa de governo”, afirmou.
Segundo Cheila Lima, técnica da Coordenação Geral de Doenças e Agravos Não Transmissíveis e Promoção da Saúde do Ministério da Saúde, o Brasil quer ampliar o olhar para o tema da mobilidade urbana. “Temos que pensar nas cidades para as pessoas, ou seja, pensar no remodelamento de nosso espaço urbano. As pessoas estão vivendo mais e precisam viver com mais qualidade”, acrescentou.
A coordenadora disse ainda que, para seguir rumo ao desenvolvimento sustentável, é necessário qualificar as informações sobre acidentes e lesões no trânsito com base em seu georreferenciamento. Isso, segundo ela, permitirá a implementação de ações específicas que sejam eficazes para mudar essas realidades. “O Programa Vida no Trânsito vem justamente nessa perspectiva. É uma resposta do setor de saúde na atuação intersetorial, já que estamos tratando de problemas multicausais”.
Representando o Conselho Nacional de Secretários de Saúde (CONASS), Mércia Gomes sugeriu que o seminário culmine em um documento técnico que possa ser apresentado aos candidatos às eleições, com o fim de pautá-los em relação à importância do tema. “Com base em tudo que já construímos com o Vida no Trânsito, temos que mostrar aos novos governadores e secretários de saúde, que assumirão em janeiro de 2018, que a violência no trânsito é um problema de saúde pública”.
O painelista Aguiar da Costa, da Secretaria Nacional de Transporte e da Mobilidade Urbana do Ministério das Cidades do Brasil, lembrou que a Política Nacional de Mobilidade Urbana – instituída em 2012 por meio da Lei 12.587/2012 –, foi um grande passo para iniciar o aprimoramento do desenho das cidades. “Com a política, buscou-se principalmente pensar na mobilidade como um todo: desenvolvimento urbano, integração das políticas, acessibilidade e mobilidade tanto de pessoas quanto de cargas. Pensar nas pessoas em vez de trabalhar apenas com os sistemas de transporte”, explicou.
Luiz Néspoli, superintendente da Associação Nacional de Transportes Públicos (ANTP), trouxe ao debate a elaboração de um Projeto de Intervenção Urbanística (PIU) – uma série de estudos técnicos necessários para promover o ordenamento e a reestruturação urbana em áreas subutilizadas com potencial de transformação. Esses estudos sistematizam e criam mecanismos urbanísticos que melhor aproveitam a infraestrutura urbana, aumentam as densidades e desenvolvem novas atividades econômicas e criação de empregos.
As experiências de algumas cidades brasileiras também foram compartilhadas durante o seminário. Luiz Saboia, secretário-executivo de Conservação e Serviços Públicos de Fortaleza (CE), contou que, em um forte cenário de recessão, a cidade estabeleceu o tema da mobilidade urbana e segurança viária com pouca infraestrutura, mas com alto potencial de replicabilidade.
“Fizemos uma série de ações de desenho urbano que induziram uma mudança de comportamento das pessoas”, contou. A capital do Ceará tem, atualmente, 232 quilômetros de ciclovias. Saboia afirmou que essa transformação só foi possível por meio de três fatores-chave: forte apoio político, ações orientadas por problemas da sociedade e corpo técnico qualificado. “A cidade queria ver na prática uma ação transformadora, um plano de baixo custo, mas de alto impacto”, disse. De acordo com o gestor, um dos grandes desafios é colocar o pedestre em primeiro lugar.
Outro exemplo compartilhado foi o da cidade de Sorocaba, no estado de São Paulo. José Carlos Almeida, secretário de Mobilidade e Acessibilidade do município, argumentou que o primeiro paradigma a ser vencido foi o de que uma cidade com solo irregular não comportava ciclovias. No entanto, isso não foi suficiente para desestimular o uso das bicicletas como meio de locomoção.
“Diziam que Sorocaba não tinha uma tradição cultural do uso de bicicletas. Quando as ciclovias foram feitas, o ciclista simplesmente apareceu e esse movimento está crescendo a cada dia”, afirmou. Em um contexto de escassez de recursos, o projeto foi realizado com o apoio da iniciativa privada. O uso das bicicletas é gratuito e integrado com o transporte público da cidade (BRT).
Transporte público e o ODS 11.2
A meta 11.2 dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável prevê, até 2030, “proporcionar o acesso a sistemas de transporte seguros, acessíveis, sustentáveis e a preço acessível para todos, melhorando a segurança rodoviária por meio da expansão dos transportes públicos, com especial atenção para as necessidades das pessoas em situação de vulnerabilidade, mulheres, crianças, pessoas com deficiência e idosos”.
Mirando nessa meta, Marcos dos Santos, diretor administrativo e institucional da Associação Nacional das Empresas de Transportes Urbanos (NTU), ressaltou a potencialidade do transporte público urbano como forte aliado do desenvolvimento sustentável. Para ele, sua ampliação impacta positivamente na saúde da população e na melhoria da segurança viária.
“Os ônibus são o transporte público mais seguro, respondendo por apenas 0,48% das vítimas fatais no trânsito, ou seja, uma em cada 200”, pontuou. “Além disso, o investimento nessa área reduz o impacto nos sistemas e orçamentos de saúde (ocupação de leitos hospitalares por lesões no trânsito) e também reduz a perda de anos produtivos devido às incapacitações.” Para Santos, os sistemas BRT, os corredores de ônibus e as faixas exclusivas são intervenções que devem ser priorizadas no espaço viário.
Formas alternativas de mobilidade
Em um outro painel, este sobre entornos seguros e saudáveis, a arquiteta Meli Malatesta enfatizou o quanto a mobilidade ativa contribui para a saúde da população. “Todos os trajetos que fazemos começam e terminam a pé”, lembrou, ressaltando que, apesar de esse tipo de locomoção ser o mais utilizado nas cidades, ainda é pouco pensado em políticas públicas sobre trânsito.
Seguindo a mesma linha, Danielle Hoppe, do Instituto de Políticas de Transporte e Desenvolvimento (ITDP), defendeu a necessidade de repensar os modelos existentes de cidade e pontuou que, para as políticas públicas terem sucesso, é necessário que os tomadores de decisão sejam sensíveis ao tema – ou seja, tenham a vivência do pedestre. Marta Obelheiro, da WRI Brasil, ressaltou os princípios de um sistema viário seguro, levando em conta o fato de que não existe comportamento perfeito entre os seres humanos e que é necessário considerar isso na hora de elaborar projetos.
Comunicando intervenções
As intervenções temporárias foram abordadas por Carla Navarrete, da Iniciativa Bloomberg para a Segurança Global no Trânsito, como uma forma eficaz de comunicação, capaz de gerar mídia espontânea. “Essas ações possibilitam o fortalecimento das relações entre a comunidade. As pessoas passam a se sentir parte daquilo e isso faz com que se apropriem do espaço. Dessa forma, é possível testar e evidenciar o que funciona em um projeto antes mesmo de ele ser implementado”, disse.
Com uma vasta experiência na cobertura de trânsito, a jornalista do Correio Braziliense, Adriana Bernardes, explicou que, com o “enxugamento” do número de profissionais nas redações brasileiras, a imagem do “setorista”, ou seja, do jornalista especialista em temas, é cada vez mais rara. Disse também que nem sempre as coletivas de imprensa são a melhor estratégia para comunicar os temas relacionados ao trânsito. “Jornalistas querem matérias exclusivas. É melhor o gestor conversar com os diretores, editores e repórteres do jornal sobre a importância do assunto. Esse é o principal caminho para construir e manter uma relação de confiança.”
Adriana afirmou ainda que é necessário desmistificar a ideia de que jornalistas sempre buscam pautas negativas. “É um fato: as pessoas querem ler, ver e ouvir histórias com finais felizes”.