A arte e o significado de contar histórias
Por Alessandra Leles Rocha
O que é viver senão a incrível arte de contar histórias! Sim! Somos por excelência, contadores de histórias! Curtas ou longas, alegres ou tristes, nossas ou dos outros,... a verdade é que diariamente registramos nas páginas da mente e do coração os caminhos percorridos.
A história do mundo, que aprendemos na escola e nos meios de comunicação, não é mais do que o relato de tantas outras vidas, por isso tanta beleza, tanta importância! Não há mais, ou menos, importante história; entre famosos e anônimos, cada um colabora na parte que lhe compete. Tudo é essencial, relevante, marcas que precisam permanecer para ensinar, para orientar, para alertar sobre os vieses e os desafios, um dia obstáculos imaginados intransponíveis. Por mais simples que seja a história, sem grandes virtuosismos na hora de contar, cada palavra, cada pausa, cada suspiro, recriam a atmosfera invisível necessária para tocar os ouvidos da alma de quem se predispõe a escutá-la.
Quão nobre missão é essa de não deixar que o tempo passe em branco! Não haveria registros no papel, na internet, nos museus, nos arquivos, se alguém guardasse no silêncio aquele momento. O que seriam das fotografias, por exemplo, se as imagens não ganhassem sempre uma nova narração? Sem histórias a vida acumula um novelo de perguntas desnecessárias, repetitivas, emaranhados de problemas cuja solução tantos possuem nas próprias mãos; ainda que a experiência não possa servir na medida exata do outro, ela sempre é um valioso sinalizador de possibilidades.
É! Na era das agendas eletrônicas, dos smartphones, dos tablets, ou mesmo das agendas de papel, o relógio nos impõe a economia do raciocínio, das palavras. Breves e apressados, assim estão os seres humanos! A velocidade contemporânea tem sim, assinalado impiedosa a impossibilidade do nosso exercício nato e voluntário de contar histórias. Dias e noites parecem desaparecer no breve piscar dos olhos. As tarefas se multiplicam em meio ao caos. Estamos vivendo, absorvendo ou sendo absorvidos pelos ciclos; mas, impedidos de algum modo de registrá-los, transformá-los em histórias, em “causos”, para compartilhá-los e, só assim, garantirmos a sua sobrevivência pelo tempo.
Longe dos resquícios de um “saudosismo improdutivo e paralisante”, discutir o papel do ser humano como agente construtor e difusor da história é algo de suma importância para a sociedade mundial, inclusive porque diz respeito ao estreitamento que essa função resulta nas relações humanas. Lotadas nos seus limites cotidianos, as pessoas estão perdendo a habilidade de conviver, de viver em harmonia com o mundo, de se expressarem, de contarem e ouvirem histórias. O mundo se transformou, a violência destruiu a possibilidade de sentar a porta de casa no fim da tarde, a urbanização esqueceu-se da significância do banco da praça,... por fim, o “virtualismo” das relações indiscutivelmente tem afastado a possibilidade da troca existencial das histórias; aquela magia que sentíamos quando alguém muito especial nos colocava no colo e contava histórias (próprias, inventadas, de livros, pouco importava!), ou as conversas animadas nos cafés e almoços em família que faziam o entrelaçamento do ontem, do hoje e do amanhã, ou aquele discurso emocionado do orador da turma de faculdade relatando aos presentes o que foram aqueles anos de parceria e luta até o momento de dizer adeus.
Nunca se sabe, quando será a última história, quando o ponto final ganhará seu sentido exato; por isso, havemos de nos preocupar em mantê-las atualizadas, contadas e recontadas com entusiasmo e emoção. Histórias têm cheiro, tem gosto, tem toque, tem música, tem o poder único e indiscutível de nos devolver a vida e nos “catapultar” de volta ao centro da pista para tirá-la para dançar de rosto colado mais uma vez. Como diz Rubem Alves, “aquilo que está escrito no coração não necessita de agendas porque a gente não esquece. O que a memória ama fica eterno” 1; e mesmo, que “tudo não sejam flores”, cada história tem sempre a habilidade de nos impactar e desencadear ondas de progresso e evolução incalculáveis.