Reflexões
de uma docente...
Por
Alessandra Leles Rocha
Muitos são os
caminhos para quem decide transitar pela Educação. Pública. Privada.
Universitária. Básica. ... Mas, ainda que se faça uma opção, afinal é
impossível abraçar esse mundo de possibilidades, a sala de aula é sempre um
universo em expansão.
De um dia para
outro, de uma turma para outra, de uma escola para outra, tudo o que não
representa a Educação é a inércia monótona. E está certo! Lugar que abriga
pessoas e conhecimentos não pode mesmo ficar parado no tempo e no espaço. Daí o
(a) professor (a) ser um ser em movimento contínuo, distante de só ensinar;
mas, que fundamentalmente precisa se dispor a aprender.
Muitas vezes eu
penso que a percepção sobre a insuficiência dos 50 minutos de aula precisa ser
reavaliada. Quanta coisa não acontece nesse pequeno recorte de tempo! Adentrar a
uma sala de aula é sempre um flerte com o imprevisível; às vezes, positivo
outras negativo. E isso não inclui somente os alunos, mas os (as) professores
(as) também. E ainda que o planejamento não se cumpra dentro das expectativas,
que a aula não repercuta o idealizado; mas, qualquer que seja a experiência dentro
daquele contexto, ela precisa ser considerada. Um (a) professor (a) não pode
negar que na vida tudo se aprende.
Não me esqueço de
cada experiência docente que desenvolvi até hoje e dos desafios que cada uma
delas me impôs, no sentido de refletir com seriedade e compromisso a cada
balanço feito sobre os sucessos e não sucessos no processo; ainda mais, porque
iniciei a minha docência sem uma formação docente.
Então, num misto de
reprodução daquilo que meus melhores professores representavam para mim e uma
dose generosa de instinto e bom senso, o trabalho ia sendo tecido e ajustado. Graças
a minha constante autocrítica e apesar da disposição em participar de
workshops, palestras, seminários e minicursos de aprimoramento, fui percebendo
cada vez mais acentuada a necessidade de algo maior, mais aprofundado e decidi
retornar para a Universidade e cursar uma licenciatura. A busca por entender
tudo o que eu tinha feito até ali, tanto em erros quanto acertos, e o desejo de
agregar sempre conhecimentos adicionais, representou um saldo final surpreendente.
Mas, como na vida
há sempre um “mas”, houve aspectos não solucionados que, talvez, já estejam
cronificados nas carências da Educação brasileira, no que tange à formação
docente. Em termos de Educação Inclusiva, por exemplo, os discursos são
esparsos e as ações formativas quase inexistentes. Nada de analisar um livro
adaptado em Braile. Nada de sugestões didático-pedagógicas para se trabalhar
com deficientes auditivos. Nada de discutir um planejamento de aula
efetivamente inclusivo. Nada...
É como se a
formação docente, por si só, idealizasse um perfil de professor, um perfil de escola,
um perfil de aluno, um perfil de Educação. Só que entre a teoria e a prática descobre-se
um abismo. A realidade, seja ela pública ou privada, esbarra com as
pluralidades sociais e humanas. Antes de pensarmos em alunos precisamos pensar
que estamos diante de cidadãos, sujeitos que precisam construir a sua cidadania
e o seu lugar de fala na sociedade.
Imagine só,
lecionar para a Educação de Jovens e Adultos (EJA). A complexidade existente
nesse contexto é ímpar. Idades, realidades, interesses,... encontrar o consenso
e o equilíbrio necessários para a realização do processo de ensino-aprendizagem
requer um “jogo de cintura” que, certamente, precisaria ter sido lapidado
durante o processo de formação. Mas, quase sempre não é.
De repente, então,
o (a) professor (a) tem um choque, especialmente aquele (a) recém-formado (a),
com pouca experiência. Frente às demandas que se apresentam em cada turma, ele
(a) entende que terá que dominar além do conhecimento, novas competências e
habilidades, as quais, talvez, ele jamais pensou. É; ele (a) descobre que será
aluno da vivência, do cotidiano, dos desafios impensados.
No entanto, desse
caos pode sim, encontrar-se luz. A docência tem o poder mágico de ampliar as
perspectivas, descortinar o obscuro, visibilizar o invisível. Você pode chegar
um péssimo cidadão ao universo docente e, antes de piscar os olhos, levar um
banho de realidade e sair vestido de cidadão de primeira linha. Sala de aula
nenhuma no mundo é um ambiente estéril. Ali sim, nada se perde tudo se cria
tudo se transforma. De duzentos dias letivos, o último não é nem de longe o que
o primeiro aparentava ser; nem para o (a) professor (a), nem para os alunos.
Por isso, o maior
compromisso docente que existe, pelo menos em minha opinião, é a consciência de
que a Educação não pode ser desenvolvida como um privilégio. Educação é direito
universal. É base fundamental para que qualquer pessoa se insira verdadeira e
adequadamente em uma sociedade. De modo que o (a) docente não deve, em hipótese
alguma, fazer diferença entre seus alunos na hora de ensinar. E isso é muito
bom, porque ajuda a lapidar a criatividade, a inventividade; o que, não deixa
de motivar e estimular, também, os alunos.
E embora, todas as
agruras que essa profissão impõe em nosso país (e não são poucas), essa
compreensão redimensiona o (a) professor (a), no sentido de fazê-lo (a) resgatar
a sua autoestima e a sua dignidade. Na medida em que ele (a) exerce de maneira
respeitosa e consciente o seu ofício, a desqualificação social que circula em
torno da docência perde força e passa a ser repensada por alunos, pais e
população em geral. Porque um docente que não acredita na sua profissão, que não
prepara a sua aula, que reclama de tudo e de todos, independente de quaisquer
motivos plausíveis que manifeste, só faz consolidar a perda de credibilidade e de
respeito da sociedade.
Ensinar é difícil. É
muito esforço. É muita dedicação. Um verdadeiro festival de suor e lágrimas,
como falam por aí. Então, tem que ser por escolha, por vontade, por convicção;
ou quem sabe, pela simples vontade de se reinventar todos os dias. A sala de aula
é sempre uma grande oportunidade de se descobrir, de revelar talentos ocultos
ou inimaginados, de olhar para si e para o mundo com mais generosidade, mais
indulgência, mais esperança. Caro (a) professor (a), como dizia nosso nobre colega,
e Geógrafo brasileiro, Milton Santos 1,
“o mundo é formado não apenas pelo que já
existe, mas pelo que pode efetivamente existir”.