Assim como os dominós
Por Alessandra Leles
Rocha
Desde que a sociedade decidiu
compactuar com o “mal feito” a realidade tornou-se fora da capacidade de “digestão”.
Aplaudir a contramão dos princípios éticos e morais que regem a vida em
coletividade e estabelecem o peso dos direitos e deveres, dar guarida aos
personagens principais da desordem compromete e muito quaisquer pretensões de
uma coexistência pacífica e justa. Como disse Martin Luther King 1, “O que
me preocupa não é o grito dos maus. É o silêncio dos bons”.
A partir do momento que o diálogo
perdeu sua importância na mediação dos conflitos e interesses, que o bom senso
passou a ser estritamente uma visão individualista e não em prol do grupo, que
o “pagar para ver” transformou-se em palavra de ordem, a balança não mais
encontrou seu equilíbrio e a justiça ficou soterrada pelas demandas de natureza
diversas. Da capacidade autossuficiente de resolver e decidir, o ser humano de
repente passou a necessitar de interlocutores para se fazer ouvir e entender.
Ora, o problema é que muitos desses “interlocutores”
não cumprem seu papel com imparcialidade e lisura. Por quê? Ah! Difícil apontar
uma única resposta! Mas, uma coisa é certa, esse tipo de atitude só posterga e
arrasta o desgaste das situações; amplia o rol da desconfiança, da perda de
credibilidade nos valores e nos princípios ordenadores da sociedade. Aí, o
retrato que se apresenta é o de sempre: os justos pagando pelos pecadores.
Bem, mas os direitos existem a partir
da demonstração dos fatos. Direito não é para quem quer, mas para quem tem. Na medida
em que os fatos se repetem sem trégua e avançam no seu grau de impacto, a
injustiça inflama os ânimos e a reflexão, ainda que tardia, se manifesta. Lembremo-nos
o perigo em se abrir precedentes; de aparentes banalidades a danos
irreversíveis as atitudes correm a velocidade da luz. Então, até quando aceitar
o “mal feito”?
Esse modo peculiar de “tampar o sol
com peneiras” e só agir mediante ao desconforto direto não demonstra inteligência.
Basta por reparo que o cotidiano é cíclico e mais dia menos dia “a bola da vez”
pode ser você. Afinal, quem tem por hábito transgredir as normas geralmente não
escolhe o alvo; o fim é que justifica os meios.
Nas palavras de Ayn Rand 2, “quando você perceber que, para
produzir, precisa obter a autorização de quem não produz nada; quando comprovar
que o dinheiro flui para quem negocia não com bens, mas com favores; quando
perceber que muitos ficam ricos pelo suborno e por influência, mais que pelo
trabalho, e que as leis não nos protegem deles, mas, pelo contrário, são eles
que estão protegidos de você; quando perceber que a corrupção é recompensada, e
a honestidade se converte em auto-sacrifício; então poderá afirmar sem temor de
errar, que sua sociedade está condenada”. Portanto, a indiferença não é tão
inofensiva como muitos tentam fazer parecer; na verdade, ela é uma semente
maléfica para encobrir todos os equívocos, todos os erros, todas as maldades,
todas as atrocidades cometidas contra o planeta e, sobretudo, aos seres
humanos. É preciso se posicionar, olhar para a vida acima da ótica do próprio
umbigo, exercer a análise e a ponderação; afinal, ainda que não se queira
admitir somos um imenso conjunto de dominós, aonde a queda de um irá
inevitavelmente repercutir nos demais.