“Ser ou não ser?”
Por Alessandra Leles Rocha
“Ser ou não ser?” 1, eis a grande questão humana dissecada brilhantemente pela sensibilidade poética de Shakespeare2; mas, eternamente duelada com voracidade pela sociedade. Não importa o tempo, o Homo sapiens vive seus dias sobre a Terra na busca ininterrupta por sua aceitação pessoal e coletiva, onde ser ou não ser pode representar o início ou o fim.
Tarefa difícil, para não dizer praticamente impossível; por isso, vagando distante da perfeição idealizada de uma aceitação unânime, o ser ou não ser nos exila no meio termo aceitável e acessível de pertencer a algum grupo ou nicho ideológico, comportamental. Gente, que entre esse “é ou não é” afina ideias, atitudes, pensamentos comuns e garante um lugar ameno em meio às hostilidades da selva humana.
Mal chegamos ao mundo e por imposição, consciente ou não, do círculo de convivência mais próximo, as primeiras diretrizes desse ser ou não ser foram sendo escritas. Com o correr do relógio, o passar dos anos e nosso crescimento natural, outras tantas se agregaram e nos impulsionaram a persegui-las, quase convencidos de que as chaves para o sucesso e a felicidade estavam guardadas em suas mãos. Escolher entre ser ou não ser nos aproxima do Olimpo consagrador ou do inferno penitente do fracasso. Só nos estágios avançados da vida fomos tomando consciência da dimensão e do peso de ser humano; máquina viva, fábrica de sonhos, berço de sentimentos, fonte inesgotável de ideias e aspirações. Ser ou não ser nos descortina o dualismo da vida e confronta a magnitude de ser com a realidade de existir (ou de estar em determinada posição ou situação social), ambas distintas; entretanto, especialmente complementares.
Ser ou não ser reflete a alma, aprimora os valores, os princípios. Afaga ou apunha-la; encanta ou desespera; orgulha ou envergonha, reverencia ou ignora... É a lâmina pontiaguda sobre nossa consciência; presa a imaterial força que habita dentro de nós, no livre arbítrio da escolha. Ser ou não ser cobra seu ônus, oferece sua benesse. Enquanto desfrutar os encantos da alvorada e do poente, a vida há de murmurar em silêncio ao seu espírito “ser ou não ser”, e cada dia reservará seus mistérios e glórias para que não haja enfadonha repetição em sua existência; assim, como o céu é repleto de estrelas, mas jamais se exibe com a mesma vestimenta, por mais parecido que pensamos estar.