Dois
pesos e duas medidas
Por
Alessandra Leles Rocha
Circula pelos corredores dos
Poderes, em Brasília/DF, a ideia de que sejam reduzidas as penas dos criminosos
que participaram da barbárie do 8 de janeiro de 2023; porém, excluindo-se a
possibilidade de anistia nem benefício para os mandantes e os financiadores dos
ataques.
É curioso que a Direita e seus
matizes, mais ou menos radicais e extremistas, venham com essa, nessas alturas
do campeonato! O motivo da minha constatação é simples. Está no contexto desse
espectro político-partidário nacional indivíduos que já defenderam a redução da
maioridade penal, no país, em razão de que menores infratores diante de seus
delitos, incluindo crimes mais graves, como homicídio, latrocínio e violação,
estão sujeitos apenas às medidas socioeducativas, previstas no Estatuto da
Criança e do Adolescente – ECA (lei nº 8.069, de 13 de julho de 1990).
Ora, é de conhecimento público
que, há tempos, os menores são usados pelos grupos criminosos, pelo fato de que
respondem de maneira diferenciada pelos seus delitos e em tempo menor de
reclusão. Sim, menores infratores só podem ficar privados da sua liberdade, em
instituições de atendimento socioeducativo, até completarem 18 anos, ou seja, a
maioridade penal. Portanto, cumpridas as determinações previstas pelo ECA, eles
são reintegrados à sociedade e passíveis de reincidência na criminalidade.
Assim, traçando uma analogia,
essa proposta para reduzir as penas dos criminosos que participaram da barbárie
do 8 de janeiro de 2023, constitui o mesmo princípio. Atenuando-se às suas
responsabilidades, diante de fatos gravíssimos, essas pessoas tornam-se
passíveis de reincidência das mesmas práxis, ou seja, vulneráveis a persuasão
criminosa pelos mesmos mandantes e financiadores. Dado o grau de alienação
social a que foram submetidos e convencidos a atuarem de forma bárbara e
incivilizada.
Vale ressaltar que toda a trama
golpista, que culminou no fatídico 8 de janeiro de 2023, não teve o
reconhecimento de uma imensa maioria dos partícipes, diretos ou indiretos, como
atos atentatórios à Democracia, ao Estado de Direito, às Instituições e à Cidadania.
O que significa que essas pessoas não reconhecem suas atitudes e comportamentos
como práxis criminosas sujeitas aos rigores da Lei. Ainda que sejam todos,
acima de 18 anos, eles se veem apenas como vítimas de perseguição política, o
que reforça a possibilidade de reincidirem em práticas semelhantes.
É preciso ter em mente que o
sentimento golpista nutrido pelo discurso da Direita e seus matizes; sobretudo,
os mais radicais e extremistas, não se arrefeceu e nem irá se arrefecer, por
questões históricas nacionais. O que move esses indivíduos é um forte
sentimento de reapropriação de um poder, o qual consideram propriedade herdada
de seus antecessores. De modo que não parece existir quaisquer possibilidades
de que as ações desinformativas e alienantes sejam interrompidas junto às
massas de seguidores e apoiadores desse espectro político-partidário.
De modo que estabelecer uma
redução de pena para atos, como os que aconteceram em 8 de janeiro de 2023, é
compactuar com uma nova onda golpista. Os vândalos que depredaram os prédios da
República, em Brasília/DF, não agiram por impulso. Incidia no seu consciente a
força de uma discursividade persuasiva, diariamente reforçada através das
mídias sociais. Eles foram à capital federal cientes do que estava proposto a
ser feito. Havia método. Havia estratégia. Tanto que os alvos de depredação se
mostraram específicos, não se estendendo a outros prédios do patrimônio
arquitetônico da cidade.
Além disso, essas pessoas
contavam sim, com a total impunidade. Só depois do fato consumado e da resposta
da Justiça aos acontecimentos, é que elas se deram conta da punição e passaram
a suplicar por anistia. Aliás, 542 acusados tiveram penas substituídas por
medidas alternativas, como prestação de serviços à comunidade, multa e
restrições de direitos. Trata-se do acordo de não persecução penal (ANPP) que é
aplicado em situações nas quais são cometidos delitos sem violência ou grave
ameaça, com pena mínima inferior a quatro anos.
Portanto, das 1.039 pessoas que foram condenadas, até o momento, 48% delas não firmaram acordos ou não tiveram direito às medidas alternativas. E são elas, as que tem sido utilizadas como instrumento da Direita e seus matizes; sobretudo, os mais radicais e extremistas, para o discurso de anistia. Como se vê, eles dispõem de dois pesos e duas medidas, ou seja, para os menores infratores, eles defendem à redução da maioridade penal, para que possam ser punidos de maneira mais grave e severa, e para os envolvidos no 8 de janeiro de 2023, eles defendem a redução de pena, para não perder a simpatia das suas massas de seguidores e apoiadores.