O Bode Expiatório
Por
Alessandra Leles Rocha
Você já deve ter ouvido a
expressão “bode expiatório”. Ela se refere à prática de culpar uma pessoa, ou
grupo, por algo negativo que aconteceu, mesmo que não seja a verdadeira
responsável. É o que está acontecendo, nesse exato momento, na realidade
brasileira, em relação ao Supremo Tribunal Federal (STF).
O incômodo causado pela existência
de uma Corte Suprema que atua de maneira disciplinada e com o devido rigor às
leis brasileiras, tem promovido a ira da ultradireita dos EUA e reverberado no
governo estadunidense.
Primeiro, porque o Brasil, um
país em franco desenvolvimento, é capaz de punir seus traidores e ofensores à
Democracia, a partir do exímio trabalho do STF, ao contrário do que aconteceu
por lá, um país de desenvolvido. O que abre precedentes para que a oposição
estadunidense questione os (des)caminhos que a sua Democracia vem trilhando,
nos últimos anos, e passe a exigir mudanças.
Segundo, porque é necessário aos
interesses da ultradireita internacional, incluindo sua parcela nos EUA, criar
elementos de grave tensão social, especialmente, no Sul Global (África, América
Latina, Ásia e Oceania), para consolidar sua reapropriação imperialista.
Como já dito e repetido, diversas
vezes, pelo atual governo dos EUA, eles não se furtarão em interferir nos
pleitos eleitorais da América Latina, em 2025 e 2026. O que faz da rusga com o
Brasil, um bode expiatório, para intimidar e inibir o exercício da soberania, por
cada país da região.
Por fim, a síntese desse cabo de
guerra, imposto pelos EUA ao Brasil, é frear o ideário multilateralista defendido
pelos BRICS. Eles estão profundamente desconfortáveis diante da expansão da
influência de países como o Brasil, a Índia, a China e a África do Sul, como
foro de articulação político-diplomática de países com o Sul Global e de
cooperação nas mais diversas áreas.
Afinal, durante muito tempo, esses
foram territórios submetidos ao imperialismo estadunidense. De modo que esses
aspectos permitem um melhor entendimento do que realmente está acontecendo na seara
diplomática entre EUA e Brasil. Do mesmo modo que os estadunidenses promoveram
uma série de golpes de estado na América Latina, na década de 1960, incluindo o
Brasil, para firmarem a sua hegemonia imperialista nos tempos da Guerra Fria,
agora, em pleno século XXI, eles tentam recurso semelhante.
Acontece que já se passaram 6 décadas
e o mundo, nem de longe, é o mesmo! Haja vista que a Guerra Fria acabou, há
tempos. Hoje, quem faz contraponto aos EUA é a China, desempenhando um papel
central e, cada vez mais, influente no cenário geopolítico atual, sendo
considerada uma potência que desafia a Ordem Mundial.
Ora, ela disputa por influência e
poder em diversas áreas, como tecnologia e segurança. Além disso, a China
emergiu, ao longo desse recorte temporal, como a segunda maior economia do
mundo e a maior exportadora, com grande influência sobre o comércio internacional.
Por essas e por outras, considerando
o contexto atual do Sul Global, a China vem desempenhando um papel
multifacetado, sendo vista não só como um parceiro econômico e investidor; mas,
também, como um ator político que desafia a ordem global estabelecida pelo
Ocidente.
Veja, ela tem se posicionado como
uma alternativa ao modelo ocidental de desenvolvimento, oferecendo
financiamento e projetos de infraestrutura através de iniciativas como a Nova
Rota da Seda ou Iniciativa do Cinturão e Rota (BRI), os quais diversos acordos já
estão em curso.
Portanto, qualquer que seja o
tensionamento belicoso imposto pelos EUA, ao Brasil, ou a qualquer outro país
da América Latina, em nome da manutenção do seu imperialismo, parece fadado ao
insucesso. Porque a China já figura como um importante parceiro comercial e
investidor para muitos países do Sul Global, impulsionando o crescimento
econômico e a infraestrutura em diversas regiões. E dadas as conjunturas
atuais, quem trocaria o certo pelo duvidoso, tendo em vista todo o conjunto de incertezas,
riscos e resultados imprevisíveis, apresentados pelos EUA? Essa é a análise a
se fazer.