Vida. Arte.
História. ...
Por Alessandra
Leles Rocha
Segundo Oscar Wilde, escritor e
poeta irlandês, “A vida imita a arte muito mais do que a arte imita a
vida...”. De qualquer modo, diante da aprovação da PEC da Blindagem, pela Câmara
dos Deputados, não pude deixar de lembrar a cena final do filme Tropa de Elite
2: O Inimigo Agora é Outro, de 2010 1
e a frase que ficou famosa: “O sistema é f***a”, porque “O sistema dá
a mão pra salvar o braço”.
Depois de todo o vira-latismo
manifesto por diversos representantes da ala político-partidária de Direita,
agora, é a vez de se absterem do decoro, de maneira absoluta. Os pseudotiranos
da Câmara dos Deputados bradam em alto e bom tom seus pseudopoderes ilimitados
e a sua indisposição em se submeter às leis ou à constituição.
Bem, mas isso é só espuma! A gota
d’água, que ainda está submersa nesse pântano de vergonha, diz respeito ao fato
de que eles (as) não pretendem votar o Projeto da isenção do Imposto de Renda,
a PEC que acaba com a escala de trabalho 6x1 e quaisquer outros assuntos que
sejam de real interesse da população brasileira. Estão entrincheirados para lutar, com todas as
suas forças, apoios e simpatias, contra as demandas históricas do país.
Dentro de cada um desses
deputados pulsa o ranço dos tempos em que tudo o que representava riqueza e
prestígio alicerçava o poder de uma elite dominante. Haja vista o sistema
político-social, vigente durante a República Velha, o coronelismo.
Grandes proprietários de terras,
os "coronéis", que controlavam a política local por meio da troca de
favores (clientelismo) e da coerção violenta (como o "voto de
cabresto"). O coronel atuava como um intermediário de poder, negociando
com as elites políticas e garantindo votos de seus pseudoeleitores em troca de
benefícios, como trabalho e proteção.
Portanto, as décadas se sucedem;
mas, as velhas práxis parecem persistir na sua resistência tóxica e deletéria,
em relação ao progresso e ao desenvolvimento nacional. Isso acontece, porque esse secular arranjo
social silenciou a expressão do exercício da cidadania.
De modo que esse exercício foi basicamente
reduzido ao voto, quando, na verdade, ele demanda uma participação ativa dos
indivíduos na sociedade, exercendo seus direitos e cumprindo seus deveres
cívicos, políticos e sociais, a fim de se alcançar o desenvolvimento coletivo e
a garantia de bem-estar para todos os cidadãos.
Acontece que essa visão limitada
e centrada na escolha representativa, legitima a construção de uma
representatividade político-partidária equivocada e distorcida. Composta por indivíduos,
em sua maioria, pertencentes ao ideário político alinhado historicamente à
Direita e seus matizes; sobretudo, os mais radicais e extremistas.
Os quais, como se vê, estão dispostos
a subverter o próprio processo que os levou ao poder, para continuar garantindo
seu quinhão de regalias, de privilégios e de poderes.
Como tão bem explicou Mario
Sergio Cortella, filósofo, escritor e professor brasileiro, “Ética é o
conjunto de valores e princípios que nós usamos para decidir as três grandes
questões da vida: ‘Quero?’, ‘Devo?’, ‘Posso?’. Tem coisa que eu quero mas não
devo, tem coisa que eu devo mas não posso e tem coisa que eu posso mas não
quero”. E isso é importante, porque “Agir conforme aquilo que se fala,
alinhar discurso e prática, além de ser uma postura ética, é um sinal de
autenticidade”; mas, principalmente, de confiabilidade, de credibilidade.
Assim, temos que admitir, o
grande problema da sociedade brasileira foram os excessivos precedentes abertos
ao longo da sua historicidade, mesmo diante de claras evidências de corrosão
ética. Tivesse o país tomado as medidas cabíveis a cada problema emergido, os
absurdos, os vexames, os desvios psicocomportamentais não teriam prosperado.
É por conta dessa normalização,
dessa trivialização, expressa pela condescendência abjeta, a transigência
despudorada, a fraqueza humilhante, que uns e outros passaram a se considerar
acima do Bem e do Mal. Nesse sentido, como dizia José Saramago, dramaturgo,
poeta, escritor português e Prêmio Nobel da Literatura, em 1988, “A única
maneira de liquidar o dragão é cortar-lhe a cabeça, aparar-lhe as unhas não
serve de nada”.