5 de
Outubro - um dia importantíssimo para a historicidade brasileira!
Por
Alessandra Leles Rocha
Ontem, 5 de outubro, foi um dia importantíssimo
para a historicidade brasileira. Há exatos 37 anos, a Constituição Federal (CF)
vigente, era promulgada. A partir daquele momento entendia-se o fim do regime
militar no Brasil e o início do processo de redemocratização do país. Conhecida
como “Constituição Cidadã”, ela desponta como um marco para a ampliação
da cidadania através da garantia de direitos civis, políticos e sociais, na
participação popular da sua elaboração e na promoção de uma sociedade mais
inclusiva e democrática.
Ela foi, então, o primeiro passo
importante dado em direção ao conjunto de reparações sociais decorrentes do próprio
processo de construção histórica secular nacional. O Brasil estava funcionando
sob o ditame das velhas práxis coloniais, de um arraigamento ideológico, o qual
fora fundamentado pelo mercantilismo e a exploração das riquezas naturais, defendido
por uma sociedade estratificada, patriarcal e escravista, mediante forte
influência eurocêntrica, mesmo sendo uma sociedade racialmente miscigenada.
Daí a dificuldade de promover uma
absorção do texto constitucional, ainda que em pleno século XX e XXI. O Brasil contemporâneo
é um país que resiste as transformações e evoluções do mundo, porque não
conseguiu romper as amarras seculares da desigualdade social persistente, do
extermínio e do genocídio de populações indígenas, do estabelecimento de uma
estrutura agrária concentradora de terras, no modelo latifundiário, na
exploração da mão de obra, inclusive mantendo práticas de trabalho análogo à
escravidão, do racismo estrutural e da imposição de um modelo cultural,
econômico e religioso eurocêntrico.
E observando com atenção aos
recentes acontecimentos nacionais isso fica muito claro. A pirâmide social
brasileira permanece exibindo a concentração de renda, recursos e poderes nas
mãos de uma ínfima minoria, ou seja, 1% da população.
Isso significa que são esses
indivíduos a se apropriarem do poder político, influenciando a criação de
políticas públicas e leis que beneficiem seus próprios interesses. O que
enfraquece, de maneira flagrante, a capacidade da população, em geral, de
participar efetivamente do processo democrático.
Além disso, ao longo dos séculos,
a relação das elites brasileiras com o poder judiciário se caracterizou por uma
forte influência e reprodução social, na medida em que as elites econômica e
política se entrelaçavam com as elites jurídicas, resultando em um sistema capaz
de gerar certos privilégios.
Em linhas gerais, as elites
brasileiras sempre se mostraram como uma casta acima da lei, sujeitas à
condescendência e à flexibilização em caso de eventuais punições. Portanto,
distantes de um comportamento cidadão pautado pela ética e pela moral.
Contudo, eis que os atos de
profundo vandalismo e depredação, ocorridos em Brasília/DF, em 8 de janeiro de
2023, tornaram pública a intenção de um novo Golpe de Estado, incluindo, o
assassinato de autoridades, tais como os recém eleitos Presidente da República e
o Vice-Presidente, e o Presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), na ocasião.
Fatos que, agora, estão sob
julgamento na 1ª Turma do Supremo Tribunal Federal (STF) e, por essa razão, têm
movido certos parlamentares, ligados exatamente à Direita e seus matizes, a uma
saga obstinada por aprovar uma anistia, travestida de redução de pena, para os respectivos
envolvidos.
Vejam só, o que deseja essa gente
é desrespeitar o Judiciário brasileiro, na figura da sua corte maior, o STF. Querem
aprovar uma anistia como quem zomba de suas sentenças, declarando-as inaplicáveis,
se arvorando da posição de tribunal da última instância, de legítimos revisores
das decisões da justiça brasileira.
Algo que representa o mais
absoluto desprezo e escárnio em relação ao Estado Democrático de Direito e
afronta diretamente o clamor popular contrário, e recentemente expresso nas
ruas, à deliberação de uma anistia.
Mas, não para por aí, o absurdo
não fica restrito a certos elementos que compõem o Congresso Nacional. Eis que,
de repente, o Ministro da Defesa, durante audiência na Comissão de Relações
Exteriores e Defesa Nacional do Senado, manifestou a necessidade de reajuste salarial
para os generais.
O que causou indignação entre
militares da base, tanto da ativa quanto da reserva, pelo fato de o ministro ter
olhado apenas para o topo da pirâmide hierárquica, ignorando as dificuldades
enfrentadas por eles.
Ora, mas, não bastasse isso,
considerando o fato de que a recente tentativa de Golpe de Estado no Brasil, em
julgamento no STF, envolveu a participação de militares, inclusive, de alta
patente, falar em reajuste salarial para esse segmento, nessas alturas do
campeonato, é simplesmente escandaloso.
Sobre as Forças Armadas
brasileiras, paira uma atmosfera, no mínimo, constrangedora e desconfortável,
diante do fato público de que alguns de seus integrantes, agiram no sentido de
subverter o processo de transição do poder ao presidente eleito em 2022.
Justo eles que são uma categoria especial
de agentes públicos, com regime jurídico próprio definido na Constituição
Federal, inclusive, com um regime de proteção social que se diferencia dos
servidores civis.
Viu só,?! Seja na figura dos
representantes político-partidários, ou de seus financiadores, apoiadores e
simpatizantes, o fato é que a Direita brasileira e seus matizes vivem em uma
realidade à margem. Desconectada e distante dos fatos que compõem o Brasil,
inclusive do que trata a sua própria Constituição vigente.
Quer um exemplo? Dando continuidade
ao ideário de ampliação da cidadania, iniciado em 1988, por que não aprovar a o
fim da escala 6x1, ou seja, esse modelo de trabalho, o qual são exercidos seis
dias de jornada para um de folga?
No mundo do século XXI, diversos
países já executam um novo modelo, como a escala 4x3, ou seja, quatro dias de
trabalho e três de descanso, por exemplo. Esse tipo de mudança é defendida em razão de possibilitar
a melhoria na qualidade de vida dos trabalhadores, permitindo mais tempo para a
família, lazer e qualificação profissional.
Mas, por aqui, na Terra Brasilis,
representantes político-partidários da Direita e seus matizes se unem as elites
de diferentes setores empresariais para se opor. Os mesmos que vêm trabalhando
arduamente em favor das práxis que precarizam o trabalho, incluindo a “Pejotização”.
Trata-se da prática de formalizar
a contratação de um trabalhador como Pessoa Jurídica (PJ) para evitar as
obrigações e direitos trabalhistas, como FGTS, 13º salário e férias, que
garantiriam um vínculo empregatício pela CLT.
O que é, então, publicizado como
autonomia, independência, com o discurso de que o profissional é seu próprio
empregador, na verdade, mascara uma fraude.
Sim, apesar de o trabalhador atuar
como autônomo, na prática ele segue ordens, cumpre horários e utiliza recursos
da empresa, configurando um vínculo empregatício disfarçado e a perda de
direitos trabalhistas. A empresa reduz custos. O empregado é desprotegido dos
seus direitos.
Portanto, é hora de refletir! Hora
de debruçar sobre a Constituição da República Federativa do Brasil, promulgada
em 05 de outubro de 1988, e encontrar em suas páginas a inspiração necessária
para dar continuidade ao processo de ampliação da cidadania brasileira;
sobretudo, no que diz respeito a promoção de uma sociedade mais justa, mais inclusiva,
mais representativa e mais democrática.
Afinal, como reconheceu o próprio
presidente da Assembleia Nacional Constituinte de 1987–1988, Dep. Ulysses
Guimarães, “Todos os nossos problemas procedem da injustiça. O privilégio
foi o estigma deixado pelas circunstâncias do povoamento e da colonização, e de
sua perversidade não nos livraremos, sem a mobilização da consciência nacional”.