Em relatório sobre como políticas e legislações podem coibir o desrespeito à lei e promover crescimento inclusivo, o Banco Mundial lembra das manifestações de 2013 no Brasil, quando protestos exigiram serviços públicos de qualidade ‘padrão FIFA’. Em situações de insatisfação, organismo financeiro recomenda usar recursos públicos de forma transparente e redobrar esforços contra corrupção.
Em novo relatório sobre como políticas e legislações podem coibir o desrespeito à lei e garantir processos decisórios inclusivos, o Banco Mundial aponta que a percepção dos deveres e direitos do cidadão pelo conjunto da sociedade brasileira é “historicamente fraca e fragmentada”.
O organismo financeiro afirma que, enquanto os mais pobres no Brasil tinham de utilizar serviços públicos de baixa qualidade, as classes média e alta recorriam a serviços particulares, o que deixava as camadas mais ricas “relutantes” em contribuir com o sistema fiscal do país.
De acordo com análise da edição de 2017 do Relatório Mundial de Desenvolvimento — “Governança e a Lei” —, publicada em janeiro (30), a conjuntura brasileira foi gradualmente se transformando, sobretudo por conta de um período de 12 anos de crescimento inclusivo no princípio dos anos 2000.
A nação testemunhou a saída de 30 milhões de habitantes da faixa da pobreza, ao mesmo tempo em que viu sua classe média se fortalecer cada vez mais. Esses dois fenômenos contribuíram para ampliar as percepções de que os impostos não ofereciam uma contrapartida justa aos contribuintes, sobretudo à nova classe média. O resultado foram as manifestações de 2013, nas quais cidadãos exigiram educação, saúde e transporte com padrão “FIFA” de qualidade.
“À medida que a demanda de prestação de serviços eficazes, boa infraestrutura e instituições justas continua a aumentar, é vital que os governos utilizem recursos escassos da forma mais eficiente e transparente possível,” afirmou o presidente do Banco Mundial, Jim Yong Kim, por ocasião do lançamento do relatório.
Segundo o dirigente do organismo financeiro, desafios exigem “aproveitar o conhecimento especializado do setor privado, trabalhar em estreita colaboração com a sociedade civil e redobrar nossos esforços no combate à corrupção”.
“Sem uma melhor governança nossas metas de erradicar a pobreza extrema e impulsionar a prosperidade compartilhada estarão fora de nosso alcance”, alertou Yong Kim.
O relatório aponta que a insatisfação com políticas de governo não é exclusividade do Brasil e pode ser identificada na China, na Índia, na Inglaterra e em outros países, onde as concepções e soluções de crescimento inclusivo nem sempre são consenso entre a sociedade civil, elites e políticos.
“As autoridades públicas não atuam no vácuo. Suas decisões refletem o poder de negociação dos cidadãos que concorrem entre si para avançar seus interesses competitivos,” explicou o economista chefe do Banco Mundial, Paul Romer.
Uma das recomendações do relatório é coibir o que o Banco Mundial descreve como um comportamento oportunista — um tipo de postura incentivado pela fragilidade dos serviços públicos, cuja baixa qualidade produz o sentimento de estar sendo lesado. Uma das formas de oportunismo é a evasão fiscal. Políticas de recompensas ou de penalidades podem ajudar a reverter o problema, segundo o organismo financeiro.
De acordo com o documento, a distribuição desigual de poder pode excluir grupos e pessoas dos benefícios da participação política. No entanto, uma mudança significativa é possível por meio da interação dos cidadãos, que podem se organizar em coalizões e pressionar instâncias decisórias.
O Banco Mundial aponta ainda que as próprias elites podem implementar mecanismos para restringir sua influência política. Outro ator importante é a comunidade internacional, que pode exercer uma influência indireta sobre reformadores nacionais.