PL 320/2025
- O mundo está, ou não, sob o impacto de emergências climáticas?
Por
Alessandra Leles Rocha
Afinal, o mundo está, ou não, sob
o impacto de emergências climáticas? O motivo da pergunta é o Projeto de Lei
(PL) 320/2025, aprovado pela Comissão de
Agricultura (CRA) do Senado brasileiro, que “autoriza a renegociação de até
R$ 60 bilhões em dívidas de produtores rurais impactados por eventos climáticos
extremos desde 2021” 1.
Afinal de contas, entre os nobres legisladores da República, uma parcela bastante
significativa é enfaticamente negacionista em relação aos eventos extremos do
clima.
Assim, por uma coerência ética, é
fundamental que eles esclareçam os fatos. Especialmente, considerando que o
texto desse PL prevê a securitização dessas dívidas, convertendo-as em títulos
garantidos pelo Tesouro Nacional, com prazos de até 20 anos e carência de três
anos para o início dos pagamentos. A redução das taxas de juros, que poderão
variar entre 1% e 3% ao ano, além de bônus por adimplência e prorrogação
automática das prestações em caso de novos desastres naturais. A criação de uma
linha especial de crédito pelo BNDES, com juros de até 5% ao ano, voltada à
recuperação de solos e sistemas de irrigação.
Considerando o velho ranço
colonial brasileiro, não é de se espantar que esse PL se mostre visivelmente uma
homogeneização da questão, abstendo-se de uma análise criteriosa, dentro do
espectro do agronegócio nacional, a fim de estabelecer aqueles produtores verdadeiramente
impossibilitados de enfrentarem autonomamente os impactos causados por eventos climáticos.
O que significa abranger a todos, sem distinção;
mas, beneficiando direta e prioritariamente a elite representada pelos grandes
proprietários de terras, no país. Sem contar, que não há quaisquer menções no
sentido de estabelecer uma contrapartida, em termos de ações
socioambientalmente responsáveis e capazes de uma mitigação sistemática às emergências
climáticas.
Queiram ou não admitir, tal ideia
representa um poço sem fundo. Haja vista que a manutenção do descompromisso em
relação às políticas de desenvolvimento sustentável, as quais se alicerçam pelo
tripé do crescimento econômico, da inclusão social e da proteção ambiental, fará
desse PL um veio de desperdício orçamentário, sem precedentes. É preciso
entender que toda atividade econômica tem os seus riscos inerentes. No caso do
agronegócio, independentemente do recrudescimento das mudanças climáticas, as
condições naturais em si, já representam um risco. Obter benefícios governamentais
sem assumir compromissos e responsabilidades para o enfrentamento da nova
realidade climática global é simplesmente imoral.
Sobretudo, porque quaisquer que
sejam os montantes de recursos capitais empenhados, por si só eles não têm
quaisquer capacidades de reversão dos agravos no quadro ambiental vigente. A máquina
do agronegócio depende, necessariamente, da manutenção do equilíbrio ecossistêmico.
De modo que a superexploração de recursos naturais, como irrigação excessiva, desmatamento,
utilização de queimadas e contaminação do solo por agentes poluidores, gera
impactos negativos, comprometendo a sustentabilidade e a viabilidade das
atividades do setor. No caso específico das temperaturas extremas e dos eventos
climáticos, cada vez mais frequentes, eles tensionam diretamente a capacidade
produtiva, gerando oscilações de mercado, ou seja, variações de preços, lei da
oferta e da procura e mudanças nas políticas de comércio exterior 2.
Ao que tudo indica, então, o PL 320/2025
não só se abstém do apoio e do engajamento às políticas de desenvolvimento
sustentável, para o setor do agronegócio; mas, também, da preocupação com a suficiência
da produção nacional e, por consequência, com a segurança alimentar da
população. Aliados e simpatizantes ao setor do agronegócio, no legislativo
federal brasileiro, estão sim, preocupados com a manutenção das suas regalias e
privilégios históricos ainda que isso signifique se beneficiar de recursos
governamentais apesar do cenário improdutivo, ou de baixa produção, decorrente
do seu arraigamento ideológico negacionista.