domingo, 25 de setembro de 2022

Era para ser um debate...


Era para ser um debate...

 

Por Alessandra Leles Rocha

 

Sem oferecer quaisquer novidades; mas, reafirmando o óbvio, o segundo debate entre os presidenciáveis não passou de um encontro entre membros da direita (e seus matizes). A ausência do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva não foi o fator determinante do que foi dito e manifesto ali.

Aliás, todos os ataques direcionados a ele aconteceriam na sua presença ou não. Como já considerei em outros textos, a questão não é o Lula; mas, o que ele personifica para a direita brasileira. Tanto que quaisquer discursos e narrativas, mesmo que não sejam proferidos por ele, mas que destoem do que é estabelecido por ela, são automaticamente rotulados e estereotipados pejorativamente.   

De modo que não importa para a direita (e seus matizes) ter um apoio majoritário da elite, ou deter os poderes sociais e econômicos nas mãos, como vem acontecendo nesses pouco mais de 500 anos de história. Ela não quer ser surpreendida novamente pela ascensão popular. Ela não quer ter que se preocupar com a mobilidade social, com a reafirmação da diversidade e da pluralidade humana no país, com a participação popular nas decisões.

Por isso ela chega a um debate sem propostas. Munida apenas de raiva, de ódio, de desprezo, fundamentados por discussões rasas e enviesadas. Sim, porque recortar a corrupção nacional a fim de fazê-la caber ajustadinha aos governos de esquerda, beira o ridículo. Ora, corrupção é um mal condenável, sim. Traz prejuízos de ordens diversas para o país, sim. Mas, trata-se de uma chaga perene na história nacional. Não há governo nesse país que não tenha convivido com a corrupção.

Considerando, então, que a direita esteve à frente dos poderes na maior parte da história brasileira, ela tem um imenso telhado de vidro para se colocar em ataque dessa maneira. Como sempre digo, a negação, a invisibilização, a distorção, não muda os fatos. O dedo indicador que aponta para o outro tem sempre outros três voltados para si. A direita deveria pensar a respeito! Ainda mais, colocando reparo nas manchetes recentes dos veículos de comunicação e de informação em que figura como protagonista de escândalos horrorosos. Entrar nessa de “mocinho” e “bandido” é muito sem noção!

Sobretudo, quando nesse viés atual da contemporaneidade brasileira, a direita resolveu impor sigilo a tudo que lhe causa desconforto e dificuldade de explicação. Pois é, já entendemos que a dialogia não faz parte das suas habilidades e competências! Haja vista o próprio debate! Ter munição argumentativa consistente, de fato, não é tarefa para qualquer um. Requer conhecimento, prática, desenvoltura, capacidade de comunicação, elementos que não são inerentes a todas as personalidades. Mas, acima de tudo, requer disposição de agir com transparência.

Erros e acertos fazem parte do ser humano. A forma com a qual se lida é que é o pulo do gato e faz total diferença. Já que estamos falando sobre corrupção, que tem sido a bola da vez para os ataques da direita, ela não foi, não é e nem nunca será privilégio nacional. Simplesmente, porque é algo que faz parte do desvirtuamento comportamental do ser humano. Portanto, tem corrupção em todo canto do mundo.

A diferença é que no Brasil ela foi naturalizada no inconsciente coletivo, transformada em uma característica da sua população e, por isso, indevidamente tratada e corrigida para que não viesse a se repetir. Aliás, chegou-se a tal ponto que ela adquiriu gradação, ou seja, pequenas corrupções, grandes corrupções. Como se corrupção não fosse simplesmente corrupção. Tudo para banalizar e trivializar o processo, subtraindo-lhe o peso das responsabilidades, dos prejuízos, dos constrangimentos. Inclusive, com o aval, em muitos momentos, do próprio judiciário nacional, por meio da sua lentidão, dos seus silêncios, das suas contemporizações, enfim.

Portanto, se em algum momento a ideia era promover um debate, ela falhou. Não havia por parte da maioria participante o interesse propositivo, a disposição ao contraditório, o preparo argumentativo suficiente. Todos estavam alicerçados sob um mesmo denominador comum antes de começar a falar, ou seja, o velho ideário da direita (e seus matizes). Daí a irrelevância da presença ou não do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva; pois, ainda que ele quisesse dialogar, seus interlocutores não.

Assim, o espetáculo promovido pela direita, na noite de ontem, coaduna exatamente com o que escreveu Eric Hobsbawm, ou seja, “Mito e invenção são essenciais à política de identidade pela qual grupos de pessoas, ao se definirem hoje por etnia, religião ou fronteiras nacionais passadas ou presentes, tentam encontrar alguma certeza em um mundo incerto e instável, dizendo: ‘Somos diferentes e melhores do que os Outros’”. Por essa razão, eles não se preocupam em estabelecer um diálogo que pressuponha uma troca equilibrada e civilizada de argumentos. Para eles bastam meros ataques ofensivos e desqualificantes, como se viu acontecer.


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