Quem
será por nós?
Por
Alessandra Leles Rocha
Enquanto a Câmara dos
Deputados legisla em causa própria, em nome da sobrevivência de seus membros no
próximo pleito eleitoral, a pergunta que não quer calar é: quem legisla pelos
eleitores, os cidadãos brasileiros? A votação de um novo velho sistema
eleitoral, o de coligações, escancarou de vez o total desprezo que os
parlamentares brasileiros nutrem pelo povo.
Extintas em 2017, as
coligações retornam para fazer a alegria da pulverização partidária, a qual
beneficia partidos pequenos, com baixa representatividade e autonomia política.
Mas, também, para dar-lhes mais tempo nos veículos de comunicação e informação;
bem como, driblar a vontade popular, na medida em que ao votar em um candidato
de uma determinada sigla, o eleitor acaba elegendo candidatos de outros da
coligação.
Assim, enquanto eles
se distraem com questões distantes de qualquer relevância prática para a vida da
população, a Petrobrás, por exemplo, acaba de anunciar um novo aumento da
gasolina nas refinarias para essa quinta-feira. Até parece que o país não
enfrenta inúmeros desafios. Basta aguardar, agora, por uma série de aumentos
expressivos, que chegam pela esteira da gasolina, para compor a ciranda da
inflação.
Apenas 22,47% dos
cidadãos imunizáveis já completaram o protocolo de vacinação para a COVID-19, o
que significa não estarmos distantes nem do fim da Pandemia; mas,
particularmente, das ameaças da variante Delta que se dissemina com grande
facilidade e impõe riscos a quem não está completamente imune.
Questões que, ainda,
repercutem diretamente sobre a economia do país e, cujos prejuízos sociais
desencadeados se acirram cada vez mais, estabelecendo um cenário crítico,
especialmente, para as camadas mais vulneráveis.
Mas, quem se
preocupa? Quem ergue a voz em defesa do povo? A sensação que se tem é de “cada um por si e Deus por todos”. Sobram
discursos retóricos vazios, inócuos, em um contexto de desfaçatez que faria a
mais cínica criatura corar de vergonha.
Lamentavelmente, a
representatividade política, no Brasil, vem sendo, cada vez mais, exercida fora
do contexto, por vias tortas e tendenciosas, que não têm qualquer pudor em
subtrair ou desfavorecer os interesses dos eleitores.
Nunca se votou tanto,
a toque de caixa, medidas que visivelmente prejudicam a população brasileira.
Leis que fomentam e aprofundam as desigualdades, interferindo diretamente em
direitos que outrora haviam sido consagrados.
De modo que o rumo
das prosas leva a crer que pretendem instituir, mesmo, um caminho de esmolas e
quireras, oportunizando muito pouco a sobrevivência e a dignidade do cidadão. Se
é que esta condição social, a dignidade, ainda, existe além dos registros
constitucionais; porque, na prática, a divergência da teoria já se encontra
explícita.
Apesar de todos os
pesares, a verdade é que entra legislatura sai legislatura, o modus operandi é sempre o mesmo.
Resultado de condutas displicentes, intempestivas, interesseiras por parte dos
eleitores, que acabam por contribuir com a perpetuação do fisiologismo político
nacional, o velho e roto “toma-lá-dá-cá”.
É ele o responsável
por fomentar o ciclo de choramingos e desesperanças da população, que roda,
roda, roda e não sai do seu lugar já cativo. E assim, o brasileiro vai vivendo
as infinitas perdas da sua dignidade social. Perde o emprego. Perde o salário.
Perde o poder de compra. Perde o acesso aos direitos fundamentais. ...
Enquanto isso, seus
representantes desfrutam de nababescas mordomias e regalos, como se vivessem,
não em um outro país, mas em um outro mundo. Os tsunamis que varrem a vida dos
pobres mortais lhes chegam suaves, quase imperceptíveis, porque já foram pagos
pelo erário público. Sim, os tributos e impostos que cada cidadão gasta meses
para conseguir pagar é o que faz a despreocupação e a paz de espírito dos
políticos brasileiros.
É assim que o jogo
está posto no tabuleiro, porque o brasileiro não aprendeu a jogar. Desconfio
que seja consequência de total despreparo na transição de Colônia para
República, porque, até então, não precisávamos nos preocupar com grandes
decisões e escolhas. A vida fluía de cima para baixo, sob os comandos do rei,
do imperador.
De repente, e bem
mais tardiamente, é que o povo alcançou o seu direito ao sufrágio, a escolha
maior para o país, a sua representação no quadro político nacional, sem, no
entanto, ter a devida noção do que isso representava. Inclusive, viveu momentos
de uma liberdade cerceada, popularmente conhecida por voto de cabresto.
Ora, mas já é o
século XXI! São mais de 500 anos para se ter aprendido com os tropeços e os erros,
a partir de uma boa reflexão. Principalmente, quando a realidade exibe toda a
sua rudeza e se coloca desafiadora demais para a sobrevivência humana diariamente.
Afinal, que escolhas
são essas que nos tornam escolhidos pelas fatalidades, hein?! Que nos permitem
permanecer submissos aos infortúnios cotidianos, como quem paga o peso de
promessas feitas à revelia. Um dia esse país se fartou do açúcar da cana moída
nos engenhos, hoje ele se farta das lágrimas e do suor extraídos de quem vive a
sina de um dia de cada vez, sem direito de vislumbrar o amanhã. Pensemos a
respeito e não nos esqueçamos jamais.