quinta-feira, 12 de agosto de 2021

Quem será por nós?


Quem será por nós?

 

Por Alessandra Leles Rocha

 

Enquanto a Câmara dos Deputados legisla em causa própria, em nome da sobrevivência de seus membros no próximo pleito eleitoral, a pergunta que não quer calar é: quem legisla pelos eleitores, os cidadãos brasileiros? A votação de um novo velho sistema eleitoral, o de coligações, escancarou de vez o total desprezo que os parlamentares brasileiros nutrem pelo povo.

Extintas em 2017, as coligações retornam para fazer a alegria da pulverização partidária, a qual beneficia partidos pequenos, com baixa representatividade e autonomia política. Mas, também, para dar-lhes mais tempo nos veículos de comunicação e informação; bem como, driblar a vontade popular, na medida em que ao votar em um candidato de uma determinada sigla, o eleitor acaba elegendo candidatos de outros da coligação.

Assim, enquanto eles se distraem com questões distantes de qualquer relevância prática para a vida da população, a Petrobrás, por exemplo, acaba de anunciar um novo aumento da gasolina nas refinarias para essa quinta-feira. Até parece que o país não enfrenta inúmeros desafios. Basta aguardar, agora, por uma série de aumentos expressivos, que chegam pela esteira da gasolina, para compor a ciranda da inflação.

Apenas 22,47% dos cidadãos imunizáveis já completaram o protocolo de vacinação para a COVID-19, o que significa não estarmos distantes nem do fim da Pandemia; mas, particularmente, das ameaças da variante Delta que se dissemina com grande facilidade e impõe riscos a quem não está completamente imune.

Questões que, ainda, repercutem diretamente sobre a economia do país e, cujos prejuízos sociais desencadeados se acirram cada vez mais, estabelecendo um cenário crítico, especialmente, para as camadas mais vulneráveis.

Mas, quem se preocupa? Quem ergue a voz em defesa do povo? A sensação que se tem é de “cada um por si e Deus por todos”. Sobram discursos retóricos vazios, inócuos, em um contexto de desfaçatez que faria a mais cínica criatura corar de vergonha.

Lamentavelmente, a representatividade política, no Brasil, vem sendo, cada vez mais, exercida fora do contexto, por vias tortas e tendenciosas, que não têm qualquer pudor em subtrair ou desfavorecer os interesses dos eleitores.

Nunca se votou tanto, a toque de caixa, medidas que visivelmente prejudicam a população brasileira. Leis que fomentam e aprofundam as desigualdades, interferindo diretamente em direitos que outrora haviam sido consagrados.

De modo que o rumo das prosas leva a crer que pretendem instituir, mesmo, um caminho de esmolas e quireras, oportunizando muito pouco a sobrevivência e a dignidade do cidadão. Se é que esta condição social, a dignidade, ainda, existe além dos registros constitucionais; porque, na prática, a divergência da teoria já se encontra explícita.

Apesar de todos os pesares, a verdade é que entra legislatura sai legislatura, o modus operandi é sempre o mesmo. Resultado de condutas displicentes, intempestivas, interesseiras por parte dos eleitores, que acabam por contribuir com a perpetuação do fisiologismo político nacional, o velho e roto “toma-lá-dá-cá”.

É ele o responsável por fomentar o ciclo de choramingos e desesperanças da população, que roda, roda, roda e não sai do seu lugar já cativo. E assim, o brasileiro vai vivendo as infinitas perdas da sua dignidade social. Perde o emprego. Perde o salário. Perde o poder de compra. Perde o acesso aos direitos fundamentais. ...

Enquanto isso, seus representantes desfrutam de nababescas mordomias e regalos, como se vivessem, não em um outro país, mas em um outro mundo. Os tsunamis que varrem a vida dos pobres mortais lhes chegam suaves, quase imperceptíveis, porque já foram pagos pelo erário público. Sim, os tributos e impostos que cada cidadão gasta meses para conseguir pagar é o que faz a despreocupação e a paz de espírito dos políticos brasileiros.

É assim que o jogo está posto no tabuleiro, porque o brasileiro não aprendeu a jogar. Desconfio que seja consequência de total despreparo na transição de Colônia para República, porque, até então, não precisávamos nos preocupar com grandes decisões e escolhas. A vida fluía de cima para baixo, sob os comandos do rei, do imperador.

De repente, e bem mais tardiamente, é que o povo alcançou o seu direito ao sufrágio, a escolha maior para o país, a sua representação no quadro político nacional, sem, no entanto, ter a devida noção do que isso representava. Inclusive, viveu momentos de uma liberdade cerceada, popularmente conhecida por voto de cabresto.

Ora, mas já é o século XXI! São mais de 500 anos para se ter aprendido com os tropeços e os erros, a partir de uma boa reflexão. Principalmente, quando a realidade exibe toda a sua rudeza e se coloca desafiadora demais para a sobrevivência humana diariamente.

Afinal, que escolhas são essas que nos tornam escolhidos pelas fatalidades, hein?! Que nos permitem permanecer submissos aos infortúnios cotidianos, como quem paga o peso de promessas feitas à revelia. Um dia esse país se fartou do açúcar da cana moída nos engenhos, hoje ele se farta das lágrimas e do suor extraídos de quem vive a sina de um dia de cada vez, sem direito de vislumbrar o amanhã. Pensemos a respeito e não nos esqueçamos jamais.